“Tudo se passou muito rapidamente nas últimas décadas”. Foi assim que Hélder Bastos, diretor da licenciatura em Ciências da Comunicação da Universidade do Porto (UP), abriu as III Jornadas do Observatório de Ciberjornalismo (ObCiber), que se realizaram esta sexta-feira no pólo de Ciências da Comunicação.

Num dia em que o aniversário do ciberjornalismo – que “já” conta com 20 anos – foi assinalado, foi tempo de olhar para trás mas, também, de “prever o futuro”. Assim, a primeira conferência deu a palavra a Hélder Bastos, antigo jornalista, que viajou ao passado para falar do que na altura se pensava deste novo mundo.

“Alguém ligou o turbo às tecnologias” e, sem se dar conta, a evolução aconteceu. De acordo com o investigador, há 20 anos atrás acreditava-se que a “Internet seria uma boa técnica para todas as áreas da sociedade” e que “iria trazer possibilidades infinitas ao jornalismo”. Depois de relembrar as utopias, Hélder Bastos mencionou as conquistas realizadas na área, enfatizando o facto de que a Internet ter possibilitado “novas formas de trabalhos que, até aqui, não eram possíveis”.

Ainda que o aparecimento do ciberjornalismo tenha trazido ao público novos conteúdos, com formatos inovadores e ferramentas únicas, nem tudo foi positivo. “As conquistas não foram para todos, nem da mesma maneira”, indicou Hélder Bastos, referindo que, após o entusiasmo e euforia inicial, alguns projetos enfrentaram sérios problemas. O professor da Universidade do Porto referiu o pouco investimento nos meios online, bem como o problema dos “modelos sem negócio”, uma vez que o investimento publicitário está a cair nos meios tradicionais e “não descola” no online.

Prémios Ciberjornalismo ObCiber 2015

Ciberjornalismo Académico: “Por onde já não navegamos” do ComUM

Infografia Digital: “VIH: O vírus que apareceu em Kinshasa em 1920 e alastrou para o mundo inteiro” do jornal Público

Videojornalismo Online:  “O extraordinário mundo de Irina” da Rádio Renascença

Reportagem Multimédia: “Matar e Morrer por Alá” do jornal Expresso

Última Hora: “Atendados em França fazem pelo menos 12 mortos” da Rádio Renascença

Excelência Geral em Ciberjornalismo: Rádio Renascença

Foram ainda referidos os vencedores da votação online, onde apenas houve três alterações. O JPN venceu o prémio de Cibejornalismo Académico com  “A última memória de África” pelo público, a reportagem  “Vida de Faroleiro” da RR foi escolhida como melhor na categoria Videojornalismo Online e os participantes da votação elegeram o jornal Observador como Excelência Geral em Ciberjornalismo.

“As tecnologias digitais tornaram o jornalismo melhor?”, questionou. De acordo com o próprio, as expetativas foram altas e as dificuldades começaram a surgir, tanto no que diz respeito o trabalho do jornalistas, que optam, cada vez mais, por fazer notícias rápidas e com pouco conteúdo, como em relação à audiência, cada vez mais fragmentada. “O perigo é os editores irem atrás do que a massa procura em termos de cliques”, sublinhou Hélder Bastos, revelando o receio de que se perca “a essência e ideologia do jornalismo”. Apesar dos problemas atuais e do “efeito dominó” que acontece, o professor relembrou que “ainda só se passaram 20 anos” e que, por isso, é preciso refletir sobre esta questão.

Uma viagem ao futuro

Após um reflexão sobre o passado, João Canavilhas, professor e investigador da Universidade da Beira Interior (UBI) permitiu à audiência uma nova viagem, desta vez ao futuro. A frase do filósofo espanhol Ortega y Gasset “O homem é…. O homem e as suas circunstâncias” lançou o mote deste “exercício arriscado”, onde Canavilhas começou por lembrar que “o bom jornalismo não acontece onde não está ninguém”.

O professor da Beira Interior enfatizou o papel dos dispositivos móveis como essencial no futuro do ciberjornalismo, indicando que, no futuro, prevê que a informação passe a ser “algo muito próximo do corpo, como um acessório”. De forma simples traçou uma linha de pensamento entre o passado, o presente e o futuro, no que diz respeito a algumas vertentes, como o consumo, a distribuição ou os conteúdos.

João Canavilhas destacou que a tendência no futuro será a de cada vez mais o consumidor escolher aquilo que verdadeiramente lhe interessa e que, para isso, é necessária uma adaptação ao consumidor por parte do jornalista. O investigador indicou também que a periodicidade tenderá a desaparecer, uma vez que “o que se quer é o imediato”, mas que esse imediato pode, ainda assim, ter riscos. “O trabalho jornalístico continua a ser o mesmo”, relembrou.

O convidado da segunda conferência destacou ainda os conteúdos imersivos, cada vez mais possíveis e capazes de “transportar as pessoas para um determinado ambiente” para que fiquem mais informados e sublinhou que a colaboração do público pode e deve ser importante, desde que seja sempre trabalhada pelo jornalista. “A relação entre jornalista e colaborador é algo que tem de evoluir”, considerou. No final da apresentação, Canavilhas voltou à frase de Ortega y Gasset e terminou dizendo que a informação em 2025 “deverá ser adaptada ao utilizador e às suas circunstâncias” e que isso pode gerar “uma solução para o problema de pagamento no ciberjornalismo”.

Ciberjornalismo como palavra chave

A manhã contou ainda com uma discussão sobre o “Futuro do Ciberjornalismo”, onde Luís Santos da Universidade do Minho (UM), Miguel Conde Coutinho, editor adjunto do JN Online e Tiago Dias, da Lusa conduziram um debate sobre a situação atual e futura da área, com alguns receios futuros. Em declarações ao JPN, Miguel Conde Coutinho afirmou que “o jornalismo está a ter dificuldades em cumprir as suas funções básicas e corre o risco de ser substituído. Pelo quê, não sei, mas pode acontecer”.

A tarde arrancou com o segundo painel, moderado por Pedro Jerónimo da do Instituto Superior Miguel Torga (ISMT) onde o ciberjornalismo académico foi destaque. Anabela Gradim, da Urbi & Orbi, Rui Barros, diretor do ComUM e Afonso Ré Lau, antigo colaborador do Jornalismo Porto Net (JPN) deram o seu testemunho sobre o que se faz em cada universidade, como e porquê.

Após a última conferência do dia, “Do ObCiber à RIIC: Investigar em Rede”, do professor da UP Fernando Zamith, chegou o momento mais aguardado das jornadas: a distinção do que de melhor se faz, em termos de ciberjornalismo, no país. Hélder Bastos, presidente do júri dos Prémios do Observatório de Ciberjornalismo notou que foram validados mais de 60 trabalhos para avaliação, ainda que tenham sido mais a concorrer. Na 8.ª edição dos Prémios, a grande vencedora foi a Rádio Renascença (RR) que viu o seu trabalho distinguido em várias categorias: Videojornalismo Online, Última Hora e Excelência Geral em Ciberjornalismo. (ver caixa)

As III Jornadas ObCiber terminaram com duas apresentações de livros. A primeira, de Pedro Jerónimo, com o livro “Ciberjornalismo de proximidade” e a segunda, de Hélder Bastos, “Origens e evolução do ciberjornalismo em Portugal: Os primeiros vinte anos (1995 – 2005), que voltou ao tema do início das jornadas: as duas décadas de ciberjornalismo.

Notícia atualizada às 11h40 de dia 5 de dezembro de 2015