Fernando recorda nitidamente que, na sua escola, “havia meninos ‘bem’, havia outros que não eram tão ‘bem’ e havia os que eram praticamente abandonados”.

No dia 25 de Abril de 1974, Fernando Reis estava na Guerra Colonial, em Angola, quando recebeu a notícia da Revolução com um dia de atraso. No dia 26 de manhã, quando se levantou, tinha colegas que tinham ouvido a notícia na rádio e foram-lhe dizer. Ficou “muito animado”: “houve logo grande movimentação a nível das tropas onde estava integrado e, passado um dia ou dois, fez-se a eleição de delegados do MFA”, de que veio a fazer parte.

Um delegado do MFA “com a cabeça a prémio”

Depois do 25 de Abril, Fernando permaneceu em Angola cerca de um ano. Nesse período, como delegado do MFA, realizou inúmeras sessões de esclarecimento para comerciantes, fazendeiros e para as populações. As sugestões do MFA nem sempre eram bem recebidas pelas povoações. Numa dessas acções de sensibilização, houve mesmo quem tivesse “colocado a cabeça de Fernando a prémio”.

A partir daí, não acreditava que o fossem matar, “mas passou a ter mais cuidado e, quando ia fazer sessões de esclarecimento às sanzalas, em vez de ir num jipe com um ou dois soldados, passou a ir com um pelotão armado”.

A queda da “toponímia” do Estado Novo em Ambrizete

Um outro momento marcante ocorreu quando o batalhão em que o entrevistado estava incluído se deslocou para Ambrizete, uma região onde a Revolução não tinha provocado nenhumas alterações. “A comissão do MFA de que fazia parte decidiu fazer algumas alterações que achara importantes, nomeadamente nas atitudes do governador, apelidado de ‘Administrador'”. Grande parte das ruas tinham então nomes alusivos ao fascismo e a comissão pediu-lhe para retirar as placas.

O governador recusou, dizendo que não sabia o que lá havia de pôr. “Nós fomos visitá-lo à administração e dissemos-lhe que ou os tirava ele ou tirávamos nós e depois punha-se lá o que calhasse”, refere Fernando.

Olhando para os tempos da Revolução com nostalgia, Fernando Reis não se identifica completamente com a democracia actual: “neste momento, passamos por uma fase em que a maior parte do povo português não quer nada desta democracia. Os políticos foram desacreditados e agora são poucos os que merecem um mínimo de crédito da população”.

Mesmo assim, o rescaldo que faz destes 30 anos de democracia é positivo: “houve muita coisa que correu mal, mas, sobretudo, houve muita coisa que correu bem. Neste momento, os jovens nem sequer põem a questão de não ter liberdade para dizer o que querem e isto é importantíssimo”.

Depoimentos dos Professores
Cristina Macedo – Uma perspectiva diferente da Revolução
Maria José Dias – A revolução vista por uma jovem mãe

Hugo Correia