O FC Porto tem de marcar na Corunha para chegar à final da Liga dos Campeões. José Mourinho acertou quando disse que tudo se decidiria na segunda mão, na Galiza. Não pensaria o treinador do Porto que o jogo fosse tão “fraquinho” como foi, sobretudo na primeira parte.

O Corunha veio ao Dragão com o claro intuito de não perder. Uma defesa organizada e um meio campo solidário foram suficientes para travar um Porto que nunca encontrou criatividade para chegar à baliza de Molina em posição privilegiada para fazer o golo. Os dragões confirmaram que andam com problemas nesse capítulo. Depois de 40 jogos sempre a marcar, nos últimos seis o Porto ficou em branco em quatro. E ontem o problema nem esteve tanto na finalização, mas antes na falta de situações para poder finalizar. Apenas dois lances perigosos, um remate de fora da área de Maniche, que beijou a trave, e um cabeceamento de Jankauskas que rasou o poste. Muito pouco para quem quer vencer um jogo.

Apesar disso, o Porto justificaria mais a vitória do que os galegos. Se os azuis e brancos tiveram poucas oportunidades, o Corunha teve ainda menos. Tacticamente perfeita, a equipa espanhola abdicou de atacar e mesmo as saídas para o contra-ataque só eram feitas com as “costas quentes”. Além disso, os jogadores espanhóis interpretaram muito bem aquilo que na gíria se chama “anti-jogo”, como referiu José Mourinho. Várias lesões simuladas, muito tempo perdido e muito jogo destruído. Markus Merk, o árbitro do encontro, foi muito apupado pelos adeptos portugueses. Para além de não compensar o tempo perdido nem castigar os prevaricadores, o árbitro alemão teve algumas decisões infelizes como, por exemplo, um penalty sobre Marco Ferreira não assinalado, já nos descontos.

Esperança para o jogo da segunda mão

O FC Porto não se deve queixar, no entanto, de qualquer um desses pormenores. Estes não escondem um mau jogo e o claro sinal de que o FC Porto não está a atravessar uma boa fase.

A segunda parte do jogo mostrou um Porto um pouco diferente. Mais atitude, mais garra, outro ímpeto, mas a mesma imaginação. Pouca. Os adeptos desesperavam e o jogo foi-se arrastando, apimentado aqui e ali por alguns lances como a expulsão (injusta) de Jorge Andrade ou a bola à trave de Maniche, terminando com um misto de desilusão e esperança de que daqui por duas semanas, em Espanha, as coisas corram melhor para o Porto.

Na segunda mão, e a pouco mais de 300 Km do Porto, se decidirá qual a equipa ibérica que, no dia 26 de Maio, estará em Gelksenkirchen. O Corunha tem a vantagem de jogar em casa e o estímulo de saber que, nesta edição da Liga dos Campeões, ninguém conseguiu marcar no Riazor. Mas os “homens” de Irureta sabem que não vão ter vida fácil. O FC Porto ainda não perdeu fora e marcou sempre. Coincidência que, a repetir-se, colocaria os portugueses na final da Alemanha.

O FC Porto

Num jogo marcado pela fraca capacidade empreendedora de qualquer uma das equipas, é natural que os destaques positivos fiquem para os defesas. E assim aconteceu. Não porque ninguém tenha feito um jogo extraordinário, mas antes porque os criativos da equipa foram medíocres. Ricardo Carvalho foi mais uma vez o líder deste sector. Notou-se alguma retracção de Paulo Ferreira, parecendo acusar alguma fadiga. Do meio campo para a frente foi um autêntico deserto de ideias. Costinha, McCarthy e Alenitchev estiveram irreconhecíveis. Maniche e Carlos Alberto só a espaços mostraram alguma inspiração. Apenas Deco esteve perto do nível a que nos fomos habituando. Mais descaído sobre a direita, queixou-se muito da falta de apoio que teve. Procurou assumir o jogo e, tivesse alguma ajuda, teria conseguido. Foi sempre uma dor de cabeça para os galegos e raras vezes não teve dois homens a vigiá-lo.

O D.Corunha

À semelhança do que aconteceu com o F.C.Porto, os seus jogadores mais adiantados pouco se viram. Mas com uma diferença. Os portugueses não estiveram inspirados, os galegos não tiveram oportunidade para mostrar se o estavam ou não. O Corunha preocupou-se essencialmente em defender e conseguiu o que se propôs. Belas exibições de todo o quarteto defensivo, com particular destaque para Jorge Andrade e Manuel Pablo. Destaque ainda para Mauro Silva. Quem não sabe a idade do brasileiro nem desconfiará, tal o à-vontade com que o brasileiro percorre todo o meio campo defensivo durante todo o jogo. Jogador de pouca velocidade, Mauro Silva mostrou um pulmão enorme na ajuda defensiva e nas compensações laterais.

O árbitro

Um árbitro que “apita” a final da Liga dos Campeões não pode fazer um trabalho tão fraquinho. O penalty, sobre Marco Ferreira, perdoado ao Corunha mesmo no fim do encontro foi o lance que marcou mais negativamente a actuação do alemão Markus Merk. O jogador português foi mesmo derrubado dentro da grande área e o árbitro, bem colocado…mostrou o cartão amarelo ao dianteiro portista.

O árbitro foi sempre um “incentivo” ao “anti-jogo” do D.Corunha. Muitas paragens, falta de autoridade nas entradas e saídas das macas em campo, pouco rigor para com os “teatros” dos jogadores espanhóis. Disciplinarmente também falhou. Na primeira parte, Naybet “ceifou” Deco quando este se dirigia isolado para a baliza. Faltou a sanção disciplinar que afastaria o central marroquino do jogo da segunda mão. Na expulsão de Jorge Andrade teve excesso de zelo. O jogador português do Corunha, deu um “pontapezinho”, em forma de brincadeira, a Deco, num gesto que não foi violento. Não foi essa a interpretação do árbitro. Decisão que acaba por ser compreensível até porque Markus Merk não é obrigado a saber quem é amigo de quem…
Uma actuação medíocre.

Reacções

José Mourinho mostrou-se confiante para o jogo da Corunha, tanto mais que tem “a certeza que Markus Merk não estará lá”. O treinador do Porto não tem dúvidas: “o árbitro actuou de forma premeditada e teve uma filosofia muito clara do primeiro ao último minuto”. Mourinho explica: “quem percebe de futebol sabe que uma arbitragem premeditada não é aquela que anula um golo, que deixa passar um fora-de-jogo, que não marca um pénalti. São as pequenas acções do primeiro ao último minuto” O desagrado com o árbitro foi a nota dominante do discurso após um jogo que, para o treinador portista, nem teve um mau resultado. Um pouco à semelhança da confiança que na época passada galvanizou os “dragões” depois da derrota com o Panathinaikos, José Mourinho fez um discurso claramente virado para dentro do balneário: “Acredito que vamos estar em Gelsenkirchen! O Corunha até pode fazer um grande jogo, mas acredito mais que seremos nós a fazê-lo e a passar à final.”
Os jogadores da equipa portistas foram unânimes nas suas opiniões. O árbitro foi complacente com o anti-jogo do Corunha e prejudicou o F.C.Porto. Vítor Baía acredita que as possibilidades do F.C.Porto se apurar não diminuíram e afirma que os portistas vão à Corunha “para ganhar.” Ricardo Carvalho considera que “foi importante não sofrer golos” e “é possível que o Porto seja o primeiro a desfeitear o Corunha no Riazor.

Javier Irureta considerou o resultado perigoso e aconselhou cuidado para o jogo da segunda mão: “o F.C.Porto é uma equipa perigosa a jogar fora de casa e o exemplo de Manchester é disso prova cabal.” O treinador espanhol também se pronunciou sobre o trabalho do árbitro alemão. “Com cinco jogadores do Porto em risco de serem suspensos foi pura sorte nenhum deles ter visto um cartão amarelo” referiu em tom irónico Irureta que não deixa, todavia, de reconhecer que “é possível que tenha havido falta” no lance em que os portistas reclamaram grande penalidade.

Foi com um misto de perplexão e graça que Jorge Andrade comentou a sua expulsão: “Quando entrei à bola, O Deco gritou e eu disse-lhe: levanta-te! Quase ao mesmo tempo toquei-lhe com o pé nas costas, mas sem qualquer agressividade.” Mesmo sendo expulso, o ex-jogador do Porto recebeu uma forte ovação enquanto dava a volta ao estádio: “fiquei muito feliz com o gesto dos adeptos do Porto”, concluiu Andrade.

Ficha do Jogo

F.C.Porto 0 – 0 D.Corunha

Estádio do Dragão – 50818 espectadores
Árbitro: Markus Merk (Alemanha)
Auxiliares: Christian Schraer e Jan Hendrik Salver
4º árbitro: Helmut Fleischer

F.C.Porto – Vitor Baía, Paulo Ferreira, Jorge Costa, Ricardo Carvalho e Nuno Valente, Costinha (Pedro Mendes ao int.), Maniche, Alenitchev (Jankuaskas ao int.), Deco e Carlos Alberto, McCarthy (Marco Ferreira aos 70’)
D.Corunha – Molina, Manuel Pablo, Naybet, Jorge Andrade e Romero, Sérgio (Duscher aos 79’), Mauro Silva, Victor (César aos 86’), Valerón e Luque (Fran aos 44’), Pandiani

Disciplina: Amarelos a Carlos Alberto (23’), Ricardo Carvalho (30’), Marco Ferreira (90+3’) e Mauro Silva (30’). Vermelho a Jorge Andrade (86’)