Os efeitos das imagens de Abu Ghraib aos olhos do jornalista Luís Santos: ter uma máquina a jeito “faz toda a diferença”.

Se os soldados não tivessem tido acesso a máquinas fotográficas, “agora não estávamos a falar disto”. É a opinião de Luís Santos, jornalista e professor na Universidade do Minho. O acesso alargado às tecnologias, nomeadamente às câmaras digitais trouxe “uma grande mobilidade e amadorismo à captura de imagens”, o que, na opinião deste jornalista, pode “subverter as restrições que os países e os exércitos impõem ao jornalismo tradicional e à forma hábil com que estes tentam conter a torrente de informação que sai deste tipo de cenários” de guerra.

“Moblogs+warblogs=warmoblogs (?)”

É um curioso e sugestivo jogo de palavras, e é também o título de um dos posts de Luís Santos no seu weblog. Para quem não esteja muito familiarizado com as designações, aqui ficam alguns esclarecimentos: os weblogs permitem a publicação pessoal na internet, como opiniões dos bloguers. Os moblogs são uma espécie de evolução dos weblogs, e permitem agregar fotografias tiradas com câmaras digitais ou telefones móveis com câmara fotográfica.

Para ilustrar a facilidade com que hoje é possível tirar fotografias e torna-las acessíveis a todos, Luís Santos recorre ao exemplo do yafro.com, uma espécie de comunidade online onde qualquer pessoa pode criar um “jornal” de imagens online a partir de fotografias tiradas com a câmara digital. “Neste yafro, há quem tenha feito uma lista especial só com os moblogs feitos a partir de telefone móvel de soldados americanos que estão no Iraque”.

Na opinião de Luís Santos, o “controlo da informação que é produzida” em cenários de guerra “sai completamente furado” quando os próprios soldados são os primeiros a contribuir para a divulgação de imagens da guerra.

“Isto dá um poder fantástico à imagem”

As novas tecnologias, como os telefones móveis com câmara digital, estão de tal forma acessíveis que fazem com que “a disponibilidade de imagens do conflito, nomeadamente do conflito visto sob diversas perspectivas, seja muitíssimo maior do que por comparação com a última guerra do Golfo”.
Luís Santos cita um jornalista do «New York Times», que afirmou que “as imagens de Abu Ghraib poderão vir a tornar-se naquelas que nós vamos lembrar desta guerra. E se isso acontecer, será a primeira vez na História que imagens icónicas foram tiradas por amadores”. Antes, explica Luís Santos, “as fotos que se transformaram em ícones da guerra e que passaram a ser identificadas com a própria guerra, foram fotos tiradas por grandes fotógrafos de grandes agências internacionais”.
“Estas ferramentas [como câmaras digitais], que até agora estavam nas mãos de profissionais com formação técnica e ética, passam a estar nas mãos de cada um”.

Relativamente à democratização no acesso às tecnologias, “há questões ligadas com a extensão do poder de controlo dos Estados sobre estes fenómenos”, mas há também “questões ligadas com a publicação pessoal. Ou seja, os telefones móveis e as câmaras fotográficas e as cada vez mais diminutas câmaras de filmar portáteis podem ser a revolução para a imagem que os weblogs foram para o texto”, criando assim um “boom” na publicação pessoal.

Qualquer pessoa que tenha acesso a um telemóvel com câmara digital e que, por acaso, seja testemunha de um acidente ou de uma catástrofe natural, pode fazer um registo fotográfico desse momento e, “se calhar, aquela fotografia é que vai parar à capa de um jornal no dia seguinte”. Em determinados momentos, ter uma máquina fotográfica ou de filmar “faz toda a diferença”. É que, “potencialmente, qualquer pessoa com uma máquina fotográfica digital ou até mesmo com um telemóvel é um repórter fotográfico”, sustenta Luís Santos.
Na opinião do jornalista, com o acesso generalizado às tecnologias de comunicação, os exércitos e os governos terão agora de se preocupar não tanto com os jornalistas mas também com a informação que os próprios soldados podem deixar passar.

Ana Correia Costa