Garrett não está para os portugueses como Camões ou Pessoa. Mas sem ele talvez nem o Português de hoje existisse.

Como lembra Fátima Marinho ao JPN, “Almeida Garrett foi um marco na literatura portuguesa”e a língua que hoje falamos deriva directamente da escrita garrettiana.
“Garrett inovou sobretudo a expressão da língua portuguesa”, tornando-a mais acessível e directa, explica. Um dos melhores exemplos desta “nova literatura”está em Viagens na Minha Terra, obra em que Garrett se desvincula das normas do classicismo e cria um estilo fluído e vivo, que não existia até à data.

Porém, Fátima Marinho, catedrática na área da literatura portuguesa e convidada, mais do que uma vez, para animar palestras em homenagem ao escritor, sublinha que “apesar de considerado o introdutor do romantismo português, Almeida Garrett nunca conseguiu abandonar por completo alguns traços da sua formação clássica”, o que se reflecte sobretudo nas suas peças de teatro.

De acordo com a professora, “Garrett não separa claramente o clássico do romântico nem nas suas obras marcadamente mais românticas”e recorda que no prefácio de Camões [texto que inaugura o romantismo português] é o próprio a dizer: “Não sou clássico, nem romântico”.
“Embora politicamente fosse um liberal convicto, o Garrett literário situa-se na charneira entre duas épocas”, acrescenta Fátima Marinho, que considera que a obra garrettiana é também um reflexo do Portugal oitocentista, “um país dividido entre a tradição absolutista e a vontade de ruptura com o passado”.

Inquieto e interventivo, Almeida Garrett atravessou um século de contradições sociais e culturais, de impasse político e económico. Entre uma sociedade velha e outra nova, é sobretudo a dualidade de Garrett, ele próprio contraditório, que, na opinião de Fátima Marinho, faz do escritor “uma figura ímpar do Romantismo português”.

Andreia Fonseca