Nos bastidores do “Fantas” respira-se familiaridade. Os directores caminham pelos corredores, desdobrando-se em conversas com realizadores, produtores e espectadores.

Como é um dia no festival? Beatriz Pacheco Pereira, membro da direcção do Fantasporto ao lado de Mário Dorminsky e António Reis, fala do ambiente: “Quando chegamos aqui está tudo preparado. De repente aparece a troca de um filme, o que implica informar as bilheteiras, as cabines, a imprensa, o secretariado, o sector de luz, a direcção do Rivoli, etc. Depois aparecem os jornalistas que querem entrevistas. No meio da entrevista aparece um convidado. E há sempre alguém que quer os bilhetes para a sessão da noite e não sabe a quem pedir. Tratamos todas as pessoas com muito respeito e simpatia porque estamos aqui num serviço público e para o público”, afirma a directora do festival.

No “Fantas”, os convidados são tratados como pessoas “normais”. Enquanto uns escrevem no “Painel das Bocas” as suas opiniões sobre o festival, outros conversam com o “staff”. “Normalmente, o mundo do cinema é um mundo de luxo, um mundo em que as pessoas querem uma carpete vermelha, uma limousine à porta e muitos fotógrafos. Uma feira de vaidades. Quando convidamos as pessoas avisamos logo que vestimos à vontade, cada um faz como quer, não há ‘papparazzi’. Por exemplo, o John Hurt, em Cannes, não podia andar sem seguranças atrás. Isso cá não acontece.”

No entanto, há pessoas que pretendem um tratamento especial. “Por exemplo, a Karen Black é uma mulher que sempre viveu em Hollywood e tem uma mentalidade do ‘star-system’. Gosta de ser fotografada, faz pose e só faz aparições depois de estar muito bem penteada e maquilhada. O vedetismo dela não foi desagradável, mas rapidamente se podia tornar um pesadelo para o festival. Já tivemos um realizador inglês que se queixou do hotel porque não tinha espaço para meter os fatos no guarda-roupa e foi-se embora”, conta.

Um dos factores que contribuiu para “desengravatar” o Fantasporto foi a participação de voluntários, pela primeira vez. A sua tarefa era acompanhar os convidados e levá-los a conhecer a cidade. Por isso, a directora do festival afirma: “Os convidados chegam cá, pensam que isto vai ser muito impessoal e, de repente, encontram um ambiente familiar. Para eles é agradável porque são tratados como pessoas normais”. Quanto ao perfil dos voluntários, eram pessoas muito qualificadas, na sua maioria estudantes universitários e que reuniam disponibilidade, generosidade, trabalho e responsabilidade, acrescenta Beatriz Pacheco Pereira.

Por detrás do glamour da Sétima Arte, há histórias que desmistificam as extravagâncias das “estrelas”. Apesar da simplicidade da maioria dos convidados desta edição do Fantas, outros se revelaram muito complicados. “O agente da Jennifer Tilly começou a fazer exigências ridículas: um maquilhado, uma lista das aparições públicas da senhora, cabeleireiro e um carro, que não fosse táxi, preto, do tipo Mercedes, para se transportar do Hotel Infante Sagres para o Rivoli. A certa altura, chegou à conclusão que o bilhete não era de primeira classe. Depois, como tinha de fazer escala em Frankfurt queria que lá lhe garantíssemos tratamento VIP. Entretanto, afirmava que a companhia não era de confiança, queria saber o nome das pessoas que a iam buscar, os contactos. Até que a meio do festival nos fartámos e dissemos ‘Acabou’”, descreve a directora.

Uma das dificuldades que Beatriz Pacheco Pereira enumera ao longo dos últimos 25 anos, é a falta de reconhecimento do festival, quer pela comunicação social quer pelos políticos. “Na cerimónia de encerramento passou-se uma cena que para mim foi sintomática. Os GNR levaram três medalhas da Secretária de Estado das Artes e Espectáculos, Teresa Caeiro. É um grupo de rock, têm a sua importância cultural, mas nada que se compare com o Fantasporto pois não têm renome internacional. Já o Fantasporto, que tem três directores, só teve direito a uma medalha porque nem sequer sabiam que havia três directores. Portugal porta-se mal connosco”, lamenta.

Curiosamente, Mário Dorminsky é quem tem uma projecção mais mediática dentro da direcção, ficando na sombra António Reis e Beatriz Pacheco Pereira. “Fico profundamente ofendida quando pessoas com cargo de decisão, pessoas do Ministério da Cultura, pessoas que nos dão o subsídio para fazer o festival ignoram determinadas pessoas aqui dentro. Eu sou uma mulher de cinema, ponto final”, conclui a directora do Fantasporto.

Carina Branco
João Pedro Barros