“O cinema é uma brincadeira de crianças que dura a vida inteira”. A frase é do brasileiro Jorge Kuraiem Filho, que nunca fez nada na vida que “não estivesse relacionado com o cinema”. Quem também tem uma história semelhante é Pedro Bandeira-Freire: nasceu numa família ligada à Sétima Arte. Foi actor e é proprietário do “Cinema Quarteto”, em Lisboa.

O “Fantas”

A relação de Jorge Kuraiem com o “Fantas” remonta à pré-história do festival. “Quando fui júri num festival em Santarém, encontrei a Beatriz Pacheco Pereira e o Mário Dorminsky, que me falaram da hipótese de fazer um festival de cinema fantástico no Porto”, refere o crítico brasileiro. Só por volta da “quarta ou quinta edição” é que Kuraiem passou a frequentar o “Fantas”. Daí para a frente são vinte anos como frequentador do festival, nas mais variadas funções: expositor, crítico, ou simples convidado.

Já Pedro Bandeira-Freire vem ao “Fantas” desde meados da década de 80. Começou por ser convidado como proprietário do Cinema Quarteto e depois como júri. Conheceu assim os tempos em que o festival portuense habitava o espaço do Teatro Carlos Alberto. “O ‘Fantas’ ganhou muito em vir para o Rivoli e deixar o Carlos Alberto”, diz, lembrando que os porteiros da sala eram “um homem com um quisto na cabeça e outro que coxeava e umas senhoras muito gordas”. Situação essa que levou um amigo de Bandeira Freire a comentar que o terror começava “logo nos empregados”.

Para Jorge Kuraiem a 25ª edição do festival fantástico do Porto “foi a melhor de todas em termos de ambiente”, dada a presença de figuras como Dario Argento ou John Hurt. “O Fantasporto é o melhor festival de cinema fantástico, por causa do tamanho e da maneira como é feito”, elogia o brasileiro. “A comemoração dos 25 anos foi maravilhosa”, acrescenta, lembrando que levar “um festival de cinema fantástico ao maior acontecimento cinematográfico do país é fantástico”. Mas o melhor do “Fantas” é mesmo “o ambiente, o calor humano, o encontrar pessoas conhecidas”.

O amor pelo cinema

Jorge Kuraiem já fez de tudo um pouco no que diz respeito à Sétima Arte : escreveu livros, foi actor, crítico e jornalista de cinema. Durante todo esse período foi coleccionando material, chegando aos números astronómicos de “dois biliões de fotografias de cinema” e “quatro mil discos em vinil de bandas sonoras”. “Tenho a maior colecção de cinema do Brasil, que eu saiba”, afirma Kuraiem. A colecção é composta por cartazes, livros, fotografias e discos. No currículo falta uma experiência na realização, que o brasileiro diz que nunca vai acontecer: “É preciso sentir para realizar, é algo que não se aprende na escola, sei que não tenho talento”.


No caso de Pedro Bandeira Freire, pode dizer-se que a paixão pelo grande ecrã tem raízes genealógicas. “Deve ser genético, porque o meu avô e o meu tio-avô fundaram a Sociedade Cinematográfica de Portugal em 1908”, refere, acrescentando depois que começou desde muito cedo a frequentar o cinema com o pai. Já adolescente, podia entrar gratuitamente em todos os cinemas de Lisboa, já que o seu avô, dono de uma sala, conhecia os outros proprietários da cidade. Para além disso, aos 15 anos começou a ir a Paris, “ver os filmes que não passavam cá”.

Bandeira Freire já foi trinta vezes ao Festival de Cannes. Mas diz que agora tem “menos graça” porque as estrelas se protegem sob uma redoma inacessível. “É raro haver filmes que me excitem”, confessa, sendo que as grandes obras são paixões que é preciso “deixar desvanecer”, actuando como uma espécie de “vacina”. As últimas duas “doses” foram Bergman e Clint Eastwood. “Mas eu até gosto de filmes maus, porque gosto de cinema”, confessa, visto que o cinema é feito “para emocionar”. Pelo que até considera positivo que se abram os festivais a novos realizadores, com filmes mais acessíveis. O que já o incomoda é chamar ao cinema “produto” ou classificá-lo de acordo com as receitas de bilheteira.

João Pedro Barros
Carina Branco