“Se o atentado fosse da responsabilidade da ETA sustentaria toda a prática do governo Aznar e reforçaria a posição eleitoral em véspera de eleições. Se fossem os árabes podia revoltar os espanhóis porque se a Espanha não tivesse militares no Iraque aquilo não aconteceria”. Quem o diz é Rui Pereira, jornalista e estudioso do movimento independentista basco, ETA, no debate de ontem, organizado pelo Centro de Média Independente, nos Espaços JUP.

A 11 de Março de 2004, o ministro do Interior espanhol, Ángel Acebes, atribuía a autoria do atentado de Madrid à ETA. Porque é que o governo espanhol associou o atentado ao grupo independentista? A resposta é dada pelo jornalista: “Toda a política dos oito anos de governo do PP tinha sido baseada naquilo a que chamou de anti-terrorismo. Nas contas do Partido Popular, o atentado funcionaria a seu favor”.

Um ano depois do 11 de Março, a margem de liberdade das pessoas diminuiu devido à perseguição anti-terrorista, pensa Rui Pereira. “Agravaram-se as condições de liberdade em que as pessoas vivem. Está espelhado em inúmeros relatórios. Por exemplo, houve imensos sites que foram encerrados por causa do argumento da luta anti-terrorismo”, comenta o jornalista.

No entanto, Rui Pereira considera que não se deram passos na desmilitarização do conflito basco no sentido de encontrar caminhos políticos que levem à paz. “Depois do 11 de Março, aquilo que continuou foi uma cadência muito viva de detenções e de prisões, algumas do aparelho da ETA, nomeadamente a captura daqueles que seriam supostamente os dirigentes máximos da cúpula militar da organização em Outubro do ano passado”, afirma.

Nesse sentido, o jornalista contraria a possibilidade do atentado ter despoletado negociações entre o governo espanhol e a organização separatista basca. “Não creio que se tenha dado algum passo, um ano depois do 11 de Março, um ano depois da tomada do poder pelo Partido Socialista Operário Espanhol, no sentido da paz. A ETA provou que está operativa através, por exemplo, dos petardos colocados nas bombas de gasolina em Madrid”.

De relembrar que Rui Pereira é o autor do livro “Euskadi – A Guerra Esquecida dos Bascos”, cuja primeira e única edição foi comprada quase na totalidade pelo Estado espanhol com vista a impedir a sua circulação. É também autor do livro “O Novo Jornalismo Fardado – ‘El Pais’ e o Nacionalismo Basco” , em conjunto com Angel Rekalde, onde denunciam a alegada operação de propaganda contra os bascos feita pelo jornal espanhol.

Carina Branco
Fotografia: Pedro Ferreira