Breves momentos que invocam breves instantes são o ingrediente principal de um "cocktail" de emoções que sobe ao palco no Teatro Rivoli.

Quatro intérpretes expõem ao público as suas vivências íntimas, as suas experiências e memórias, momentos pessoais, numa fusão do tempo e do espaço que acompanha toda a peça. “Mapa” pode ser visto de 29 de Março a 3 de Abril no pequeno auditório do Rivoli Teatro Municipal.

“Mapa” parte da “ideia de duração”, realça o director da peça e um dos intérpretes João Pedro Vaz. “Uma medida de tempo, a permanência da memória, experiências que duram mais que outras, exposição das imagens do quotidiano” formam o “cocktail” sensorial que compõe um espectáculo sobre o tempo e sobre o modo como ele influencia a vida e as experiências das pessoas. Quatro intérpretes às voltas com o tempo, as memórias, os momentos, lugares, pessoas, imagens, intimidades, recordações de infância, gestos, intensidades, emoções puras. Uma “cartografia sensorial de tudo o que tem a qualidade de resistir ao tempo”. Um exercício afectivo onde o teatro, a dança e o vídeo se cruzam, numa experiência acima de tudo física e emotiva.

Fragmentos de “Mapa”

O espectáculo inicia-se de forma peculiar: um painel colocado atrás do palco mostra um excerto de Sophia de Mello Breyner, lido por uma velhinha. Um momento de ternura que espoleta um desenrolar de emoções ao longo da peça. Jogos de luz e sombra, contrastes de luz e escuridão e sons diversos são outros elementos que compõem o “Mapa”.

Apenas um elemento destoa do ambiente que se vive em palco: a presença constante do vídeo, que durante toda a peça exibe imagens, de locais exteriores, dos próprios actores em palco, de pormenores que vão surgindo. “O objectivo do vídeo era jogar com os intérpretes da cena”, sublinha João Vaz. Por um lado, interage com a interpretação das personagens no palco, mas por outro funciona também como ponto de fuga, fazendo por vezes com que o espectador se abstraia do que se está a passar em palco para se centrar sobre o que se está a passar na tela.

Esta peça foi construída ao longo dos últimos três meses, num processo muito intenso e colectivo, pois “baseia-se no contributo de cada um, no que cada um entende e em que se inspira” para construir o manto repleto de fragmentos que compõe o “Mapa”. “A fronteira entre teatro e dança é muito ténue em certos momentos da peça”, destaca Joana Providência, que se encarregou da coreografia. Um aspecto curioso a realçar é que Joana só viu o trabalho dos actores um mês depois de estes terem iniciado os ensaios, pelo que esse distanciamento “ajudou a ter uma percepção mais clara de como a peça funcionará no exterior”.

O resultado final “é um espectáculo assinado por todos”, em que existem “retalhos que se juntam ou não, que se roçam ou não”. O objectivo da peça “não será coser todos esses retalhos, pois o público é que tem de o fazer”, realça Sérgio Praia, um dos actores; no entanto, admite que “o mais difícil neste trabalho é estabelecer a ponte” entre os mundos tão diferentes e variados que cada actor nos apresenta.

Convém não esquecer que “o espectáculo depende sempre do espectador”, defende João Vaz; depende sobretudo da forma como o público reage aos momentos e como os interliga – ou não – num todo sensorial, que funciona como um regresso às raízes, uma viagem ao mundo interior de cada um dos espectadores presentes, pleno de vivências e de recordações que afloram num redemoinho de emoções que interagem com as que nos são apresentadas em palco. Um regresso ao passado que nos lembra que há momentos que ficam gravados na memória e que vale a pena mais tarde recordar.

Sofia Parente Ribeiro