Excêntricos, sexuais, interventivos… O duo brasileiro Tetine define-se como uma espécie de “grupo de risco”, com gosto em comunicar em português. Os problemas políticos e sexuais são ponto assente nos seus temas. O funk carioca do Rio do Janeiro é fonte de inspiração. Tetine celebra o povo da favela pelo mundo.

Como é que definem o vosso trabalho?

O nosso trabalho é uma mistura de funk carioca com “miami bass”, com “electro”, cantado em português de rua, o português falado no Brasil, nas favelas do Rio de Janeiro, porque o funk carioca é a música electrónica produzida nas favelas do Rio. Nós misturamos os elementos do funk carioca com o “sex politics”, a que chamamos “funk gay”.

Vocês também têm uma mensagem interventiva?

Sim. Desde que Tetine se formou em 1995, que nos definimos como uma espécie de grupo de risco quando estamos a fazer música. Há sempre um conceito por trás do nosso trabalho, há sempre alguma coisa que queremos comunicar no sentido político. Estamos a trabalhar com questões sexuais, com a imigração…
Ao mesmo tempo, usamos a nossa própria imagem e invertemo-la. Em alguns trabalhos trocamos os papéis e eu torno-me a Eliete e ela o Bruno. Em Serralves, por exemplo, apresentamo-nos como gémeas.

A vossa música tem outros objectivos para além dos interventivos?

Tem outros objectivos puramente musicais. Mas nós não nos limitamos apenas ao campo da música, também fazemos instalações …
No início preocupávamo-nos com as questões do corpo, víamos como era a ressonância do joelho quando a voz saía. O nosso primeiro disco, o “Alexander’s Grave”, era bastante experimental. Entretanto, fomos caminhando para um nível em que queríamos comunicar cada vez mais, a mais pessoas e este é a forma que temos encontrado.

Qual é o vosso público-alvo?

Eu penso que o nosso público-alvo é o mundo que gosta de música, é isso que esperamos.
Este é um trabalho que podemos apresentar tanto num clube – ele tem alguma coisa para as pessoas ficarem loucas, dançarem, interagirem completamente connosco – como pode ser apresentado num teatro. A música ao mesmo tempo é super dançante e melancólica.
Nós estamos interessados em celebrar cada vez mais o povo da favela, fazer a favela chegar aonde actuamos. É isso que é a coisa miraculosa da música, romper barreiras e unir as pessoas.

O que é que sentiram ao tocar recentemente para uma plateia portuguesa, em Serralves?

Há muito tempo que não tocávamos para uma audiência que entendia português. Trabalhamos em Inglaterra, estivemos há dias em Miami, depois em Nova Iorque e é bom ver que as pessoas curtem, mas sentimos falta que compreendam o que dizemos,. É outra questão política.
“Bonde do Tetão” é o nosso oitavo disco e o primeiro todo em português. Pôr na música a língua portuguesa também é uma questão política.
Em Miami não havia um único brasileiro na plateia. Havia muitos produtores, muita gente a jogar volei na praia e o mais impressionante é que as pessoas aproximavam-se e perguntavam “que língua é esta?”, “que som!”, “é maravilhoso!”.

Vocês pensam retornar a Portugal e ao Brasil?

Ao Brasil devemos ir ainda este ano. Fomos ao Sonar, que teve a primeira edição no passado Setembro, em S. Paulo, e agora devemos ir no final deste ano.

O que é “Bonde do Tetão”?

“Bonde” é um colectivo da favela. É quando duas, três ou quatro pessoas juntam-se para fazer “mcing” ou criar música. No Brasil há o Bonde do Tigrão, o Bonde Faz Gostoso, o Bonde das Bad Girls, o Bonde do Vinho…
Como estávamos a fazer este tipo de música agora, com influência do funk carioca, pensámos que o albúm devia ter alguma coisa a ver com Bonde. Como éramos apaixonados pelo Bonde do Tigrão, resolvemos dar o nome Bonde do Tetão.

Milene Marques