Pelo fenómeno do futebol passam muito mais que jogadores, bolas e golos. Por entre o apoio à equipa que se desenha nas bancadas, resistem modos de vida. Ser membro de uma claque, muito mais que apoio, é construir uma nova identidade como adepto.

O antropólogo Daniel Seabra estuda o fenómeno. É, neste momento, membro de quatro claques portuenses: Superdragões (SD), Colectivo 95 (C95), Panteras Negras (PN) e Alma Salgueirista (AS). Apesar de serem realidades distintas, “não há muitas diferenças entre as quatro claques a nível organizativo”, afirma o antropólogo.

Contudo, como seria de esperar, a dimensão das claques acaba por marcar diferenças. Por isso, “os SD são um caso único na cidade”, refere o estudioso.

“Quanto maiores são os clubes, maior é a facilidade de congregar pessoas com experiências de vida diferentes. Muitas vezes acabam por levar a situações que muita gente reprova, mas que não são, apesar de tudo, as mais frequentes”, sustenta.

Ao mesmo tempo que demarca as claques da violência no futebol, Daniel Seabra explica o que leva alguém a aderir a uma claque. “A resposta que todos me dão é que é para apoiar o clube”, adianta. “A adesão à claque permite um apoio muito mais presente. Mas há factores que os próprios membros da claque parecem desconhecer. Muitos aderem às claques na adolescência, faz parte de um processo de socialização. A adesão à claque é também uma busca de identidade, passam a ser SD, panteras… Esse grupo passa a ditar as suas normas de comportameto dentro de um estádio de futebol”, diz.

Estilo de vida

O especialista conclui que a claque passa mesmo a ser “um estilo de vida”. Contudo, os membros da claque não deixam de influenciar o próprio grupo com as suas experiências.

“Certos comportamentos violentos de determinados membros da claque podem influenciar outros membros e levar a situações de violência que depois passam a ser sinónimo de todo o grupo”, afirma o antropólogo.

Daniel Seabra refere mesmo que “as claques não têm por objectivo fomentar a violência” e que essa realidade “é mais um efeito perverso”.

Extremos na bancada

Pelas claques e pela violência que as rodeiam, há, muitas vezes, questões políticas. Desde que em Itália surgiram os primeiros grupos de adeptos, por alturas do Maio de 68, que política e futebol nunca mais se separaram.

“Estávamos num contexto de grande agitação social e o lado extremista que se vivia nos partidos italianos, por essa altura, foi importado para os estádios de futebol”, comenta Daniel Seabra

Não é raro encarar-se a dedicação ao clube e as manifestações mais violentas no seio das claques a tendências políticas extremistas. A imagens de “cabeças rapadas” e suásticas não são estranhas a muitos estádios de futebol em todo o mundo. No entanto, Daniel Seabra não tem dúvidas ao afirmar que “há de facto extrema-direita, mas é uma percentagem muito reduzida. Tem é símbolos mais visíveis”.

O antropólogo adianta que na sua pesquisa nas claques portuenses, “são os SD que conseguem congregar mais membros conotados com a extrema-direita, até porque têm mais membros com diferentes origens”. Contudo, “essa percentagem não chega a 1%”.

Apesar dos símbolos que a extrema-direita ostenta nos estádios, a verdade é que “actualmente há uma prevalência de esquerda nas claques”, observa. Exemplo disso parece ser a Alma Salgueirista que “é maioritariamente ligada ao Bloco de Esquerda”.

Mariana Santos
Foto: Getty Images