No oitavo debate presidencial, de ontem, sexta-feira, Cavaco Silva, apesar de ausente, esteve por muitas vezes presente na discussão, com os candidatos presidenciais, Mário Soares e Francisco Louçã, em conjunto a desfolhar críticas ao ex-líder do PSD.

A discussão foi amena. Contudo, Mário Soares, para se defender do à vontade de Louçã nas questões económicas, não se coibiu de aconselhar o “bloquista” a reservar as críticas ao governo para o hemiciclo. O tom paternalista de Soares fez-se de novo notar quando emergiram as diferenças de posição em relação à Europa, ao papel do Presidente da República nas relações internacionais, no fórum social e mesmo em relação às figuras da Igreja e da monarquia.

Os apelos à desistência dos candidatos de esquerda a favor do candidato apoiado pelo PS não azedaram o debate. Sobre as declarações dos dirigentes socialistas Jorge Coelho, António Vitorino e António Costa, Soares considerou que estes “têm direito à opinião”, mas que o fizeram “em nome individual” e que as outras candidaturas de esquerda “podem ser interessantes porque seguram os respectivos eleitorados”. O candidato apoiado pelo PS lembrou ainda que já “não participa em nenhum órgão do PS há 20 anos”.

Por seu lado, Louçã criticou a segurança de Soares e aludindo a Manuel Alegre, acusou os dirigentes socialistas de estarem a encetar um “ajuste de contas interno no PS”.

Cavaco silencioso

O anterior Presidente da República, que voltou a salientar o seu “desinteresse pelas sondagens”, mostrou-se “seguro” de que passará na segunda volta. “O melhor classificado está silencioso, mas o povo vai perceber isso bem”, frisou Soares, referindo-se a Cavaco.

“Quem não diz o que pensa é porque não pensa ou não quer dizer”, criticou por seu turno Louçã, sem no entanto nomear o candidato da direita e acrescentando que “ninguém se sente assim tão próximo da vitória, a não ser o candidato que se sente à vontade para estar calado na campanha”.

“Cavaco só fala do passado”, apontou Soares, que não resistiu também a recordar os anos em que esteve em Belém, de onde saiu “com um coro de louvores”.

Europa divide candidatos

Na discussão sobre a Europa, ambos concordaram nos benefícios de um modelo social europeu, mas o tema acabou por dividir os candidatos. O histórico socialista afirmou-se como “europeísta convicto” e acusou Louçã de defender uma política de “quanto pior, melhor” por estar contra a Constituição Europeia. Louçã rejeitou a acusação e considerou que a “Europa está a fracassar por causa dos seus dirigentes”.

Louçã aproveitou também para acusar o Governo de “demagogia” em relação à suposta criação de 30 mil postos de trabalho com o TGV. Soares não quis comentar a questão porque poderá ter de se “pronunciar sobre ela se for eleito”, levando Louçã a acusá-lo de duplo critério e de só querer falar em questões favoráveis ao Governo. Soares relembrou que não é “apoiado pelo Governo” e que não se inibe nas críticas.

Dissolução da Assembleia da Madeira

João Jardim foi também chamado à discussão, com Francisco Louçã a lembrar que o Presidente da República tem o poder de dissolver a Assembleia Regional, e salientou que “as regras não podem ser diferentes no Continente e na Madeira”. Soares considerou que a medida agora seria “excessiva”.

Igreja e Estado

Ambos os candidatos consideraram que a discussão em torno da presença de símbolos religiosos tem sido exagerada, pelo que Soares recomendou “bom senso” nas relações entre o Estado e a Igreja Católica e afirmou respeitar todas as crenças. O socialista criticou ainda o alegado extremismo de Louçã em relação à Igreja. O “bloquista” defendeu a retirada dos crucifixos e lembrou a Soares que “a campanha não se faz nas igrejas”.

Francisco Louçã trouxe ainda ao debate a questão da legalização da prostituição. “Se o Estado quiser pôr alguma ordem nisso, não vejo mal, mas é preciso debater”, disse. Ambos os candidatos consideraram urgente a regulamentação da actividade em nome da saúde pública.

Pedro Sales Dias