“Lisboetas” é um documentário com “tiques” jornalísticos, demorado, analítico e descritivo. Mas é, antes de mais, um épico à diáspora de brasileiros, russos, ucranianos, chineses e africanos, entre tantos outros que chegam a Lisboa à procura de melhor sorte.

O realizador Sérgio Tréfaut filma a Lisboa estrangeira, clandestina, que todos os dias recebe milhares de imigrantes de países pobres em busca de trabalho, e procura dar voz aos casos reais de quem mal fala português, de quem é enganado por empreiteiros e patrões, de quem passa horas nas filas do SEF e se vê desorientado e atulhado na burocracia que a legalização exige.

Em “Lisboetas”, a paisagem não é a da cidade, mas antes as dos rostos assustados de quem chega a um país estranho. Os silêncios, a parcimónia com que a música é utilizada, os grandes e dolorosos planos das caras do moçambicano Luciano ou do russo Alexandre, a exaustão com que cada situação é mostrada funcionam como arma de denúncia das más condições que Portugal oferece aos seus imigrantes.

E essa denúncia tocante, feita de imagens e personagens de uma sóbria poética, é bem conseguida. Mas, em quase duas horas de documentário, Tréfaut falha em mostrar a outra face da imigração: a da esperança, a da solidariedade, a da adaptação, a do sucesso.

Os portugueses são um povo de “aldrabões”, indiferentes à miséria dos outros, como Tréfaut sempre os caracteriza ao longo do filme? De certeza que há casos bem diversos, e fica a faltar o seu testemunho para que o documentário seja perfeito. Assim, chega-se ao fim com uma forte sensação de injustiça e com a suspeita de que o realizador optou pelo facilitismo.

“Lisboetas”, documentário de Sérgio Trefaut, patrocinado pelo ICAM, chega hoje, quinta-feira, ao circuito comercial. O filme arrecadou o galardão para Melhor Filme Português no IndieLisboa 2004 e competiu em vários festivais internacionais.

Sérgio Tréfaut, filho de pai português e de mãe francesa, nasceu no Brasil, em 1965. Entre os seus trabalhos como realizador contam-se os documentários “Outro País” (1999), “Fleurette” (2002) e “Lisboetas” (2004-2005). Actualmente, Tréfaut está a rodar a longa metragem “Business Class”.

Andreia C. Faria
Foto: DR