Dentro da carrinha, os técnicos da Vamp vestem os coletes da Liga. Na rua já estão três mulheres juntas a rirem para os técnicos. Há uma outra mais afastada. São mulheres entre os 30 e os 50 anos, de fácil conotação como “donas do lar” ou “mães”. Passam o dia de trabalho na rua à espera dos clientes e à noite regressam a casa para cuidar dos filhos e do marido, quando os têm.

“Raquel”, de 35 anos, é a típica utente da Vamp das tardes de sexta-feira: vive com o marido, com quem está casada há 19 anos – não sabe da actividade da mulher – e com a filha, de 11. Apesar de estar mais interessada em falar de receitas, “Raquel” acabou por dizer que vem à carrinha para buscar preservativos, mas também “para ter o que não posso ter no centro de saúde”. “Já fiz aqui o teste do VIH, já tomei a vacina contra a hepatite. Felizmente, está tudo bem”, confessa.

Entre chá para o colesterol e bolachas integrais, as três mulheres conversam e ficam indignadas com o que Sara (outra utente) conta. No dia anterior, uma mulher polícia chamou Sara de prostituat e obrigou-a a sair do sítio onde estava na rua. A indignação de Sara contagiou as colegas. “Não estava a fazer nada de mal, nem estava de mini-saia, nem nada”, refere.

“Raquel” entrou para o mundo da prostituição por necessidade, como a maioria. “O meu marido estava internado por causa da cabeça e o meu filho precisava de comer. Mas queria ver se me arrumava disto. Psicologicamente fica-se muito perturbada”, confessa. “Há muita gente que está nisto por vício e não larga”, aponta Sara.

Enquanto conversavam, foram muitas as mulheres, senhoras, mães e avós que passaram pela carrinha sem entrar, sempre em busca de preservativos.

Sara tem uma filha que já é “doutora”. Sara, de 45 anos, já anda na rua há 10, apesar de já ter tido alguns interregnos. A utente da Vamp dá “muito valor a esta carrinha”. “[Já antes] Tinha os meus cuidados: ia ao meu médico, lembro-me de ir ali a cima comprar preservativos”, refere Sara, que exige sempre aos clientes o uso do preservativo.

A utente já frequentou um curso de integração social (o Integra Ajuda), mas acabou por desistir dele há dois meses por ter ficado com uma depressão. Sara diz estar em paz na sua casa, mas quando chega à rua é um “stress medonho”. “Isto é mesmo complicado. Eu quero deixar e ajudar as outras pessoas a deixarem”.

Próxima utente. É a nigeriana Yolanda, de 28 anos. Entra na carrinha a rir. Com um copo de plástico com café na mão e sempre sorridente, conta que está em Portugal há quatro meses e que vive com as amigas e com a filha de dois anos. Ao contrário das outras utentes, diz ter uma vida boa, sem dificuldades. Em Dezembro, vai voltar para a Nigéria, mas afirma com convicção que se não encontrar lá trabalho que volta para Portugal.