Luís Campos e Cunha, primeiro ministro das Finanças do Governo de Sócrates, é um dos nove membros do Conselho Coordenador da SEDES – Associação para o Desenvolvimento Económico e Social.

Em entrevista ao JPN, esclarece que a recente tomada de posição da associação cívica não “é dirigida contra os partidos”, apesar de todos, sem excepções, precisarem de uma “renovação em termos de pessoas e ideias”. E defende que o Estado é “em muitos aspectos mais asfixiante do que era há 30 anos atrás, quando metade da economia estava nas [suas] mãos”.

A quem atribui responsabilidades quanto ao mal-estar que é sentido no país e que a Sedes menciona na sua tomada de posição?

O nosso manifesto não é dirigido contra os partidos. Como os partidos são os pilares da nossa democracia representativa, a qualidade dos partidos é a qualidade da nossa democracia. Essa democracia está a atravessar um período crítico e os partidos necessitam de renovação em termos de pessoas e ideias – todos os partidos, não nos estamos sequer a dirigir ao Governo.

Estamos a dirigir-nos aos partidos que estão no poder e aos partidos que estão na oposição. É necessário que eles façam uma reflexão e uma renovação de ideias e pessoas. Além disso, chamamos também a atenção para dois outros problemas que não são problemas de hoje mas que têm vindo a agravar nos últimos, digamos, cinco anos: é o problema da justiça e o da segurança.

Mas quando a Sedes fala na degradação da confiança no sistema político está, de certa forma, a atribuir parte dessa responsabilidade aos próprios partidos.

Os partidos são os agentes fundamentais na democracia representativa. E, portanto, sem dúvida que uma parte importante dessa responsabilidade é dos partidos. A solução passa pelo reforço dos partidos e não pela simples crítica aos partidos.

O documento diz que “nalguma comunicação social prolifera um jornalismo de insinuação, onde prima o sensacionalismo”. Como é que classifica o jornalismo que se faz actualmente?

Como todas as várias actividades em Portugal (a universidade, os tribunais, o tecido empresarial), é muito diverso. Há áreas da comunicação social que são boas e há outras que não são. Há, de facto, alguma comunicação social que tem um jornalismo mais sensacionalista, que aliado a um mau funcionamento da justiça, permite que a todo o momento sejam lançadas culpas sobre pessoas – algumas delas culpadas, outras inocentes. Como a justiça não consegue separar o trigo do joio, acaba por se praticar um certo julgamento popular na imprensa, que é, certamente, injusto para os inocentes.

Referem que “o Estado tem uma presença asfixiante na sociedade”. Que medidas é que poderiam ser tomadas para emagrecer o peso do Estado de forma a que isso não traga fortes consequências sociais?

Não é uma questão de tamanho do Estado. O Estado hoje tem um peso na economia muito menor do que tinha no passado, infinitamente menor do que tinha no passado. Não deixa de ser, apesar de tudo, um Estado asfixiante e em muitos aspectos mais asfixiante do que era há 30 anos atrás, quando metade da economia estava nas mãos do Estado.

Tem a ver com a actuação do Estado – quando o Estado se pretende intrometer em esferas privadas, quando o problema das escutas é um problema premente, quando os problemas de corrupção não têm resolução nos tribunais, quando problemas de financiamento ilegal de partidos estão todos os dias a vir ao de cima na imprensa e depois nada acontece.

Aconteceu pela primeira vez um caso de financiamento ilegal [envolvendo a Somague e o PSD] e ainda bem. Independentemente do partido, é bom que se separe mais uma vez as águas e se faça justiça. É este tipo de actuação do Estado que estamos a falar.

Como deveria ser a actuação da ASAE, que é implicitamente referida na vossa tomada de posição?

Nós nem mencionamos explicitamente a ASAE. Estamos a dizer é que há uma desproporção de meios. Repare: durante vários meses vimos actuações de fiscalização da ASAE, que são importantes e são necessárias, com grupos de intervenção armados como nós não vemos, por exemplo, em zonas em que a segurança dos cidadãos está em risco de uma forma clara (por exemplo, nos subúrbios de Lisboa onde miúdos andam armados e as ruas estão tomadas por gangues). Aí vemos uma actuação muito mais discreta, o que é uma desproporção de meios.

Entre umas cassetes falsificadas e um miúdo que morre baleado por outro é evidente que estamos a falar de problemas de dimensão muito diferente e não vemos o Estado a actuar de uma forma tão visível e tão forte nessas áreas quanto nós gostaríamos.

Que meios práticos é que o Estado poderia usar para combater essa insegurança e violência?

Há uma parte que passa pela repressão do crime pura e simplesmente. Estamos viver em certas zonas da sociedade em que as pessoas honestas e pacíficas se trancam dentro de casa, ficam prisioneiras dentro de sua própria casa e depois os gangues andam à solta. A rua é dos criminosos e as pessoas honestas ficam em casa. Isso é que não tem sentido.