No autocarro número 40 do SPN (Sindicato de Professores do Norte) seguiam cerca de 50 professores do Agrupamento de Escolas de Valdevez, concelho de Viana do Castelo. Foi um dos 600 autocarros que rumaram a Lisboa no último sábado repletos de professores descontentes com a política educativa de Maria de Lurdes Rodrigues.

“Deixei tudo por ela, deixei, deixei, deixei as minhas filhas em casa por causa dela [Ministra da Educação], deixei, deixei…”, cantavam os professores no autocarro 40. Ainda havia cerca de seis horas de viagem pela frente – seis horas que não demoraram muito a passar. Logo pelas 9h00 da manhã, na primeira paragem, em Barcelos, faziam-se os primeiros preparativos para a “manif”: distribuíam-se bandeiras, cachecóis e t-shirts.

Tomavam-se os primeiros cafés, fumavam-se os primeiros cigarros da manhã. Nas conversas, poucos temas: a manifestação, a ministra da Educação…O recurso à ironia era uma constante: “A GNR vai à nossa frente, vai-nos fazer um inquérito”, “Vai estar cheio de ‘Socretinos’”, “Somos professores, somos uns tolos”.

O descontentamento era visível nas frases e cânticos que entoavam, mas não nas caras. “Espero que a ministra da Educação pare para pensar. Acho que ela não vai recuar – nem se trata sequer de recuar no processo de avaliação: é uma questão de parar e reformular alguns aspectos que estão menos bem e avançar a seguir. Nós não queremos que ela pare, nem que deixe de fazer avaliação”, diz Augusta Fernandes, professora do ensino básico.

Seguiu-se viagem. De volta ao autocarro, cantam-se mais umas canções para, depois, falar-se de coisas sérias: foram lidas as reivindicações sindicais e subscreveram-se abaixo-assinados sobre negociação de horários e legislação sobre educação especial.

Chegados ao Marquês

Pouco antes das 15h00, milhares de professores já estão no Marquês de Pombal, em Lisboa. “Hoje a inundação vai ser de professores”, dizia um dos manifestantes à saída do autocarro. O caminho até ao Terreiro do Paço faz-se a passo lento; milhares de professores ainda permaneciam dentro dos autocarros, enquanto outros milhares entupiam as ruas de Lisboa.

Muitos curiosos assistiam à marcha e misturavam-se com os manifestantes e as dezenas de jornalistas que os acompanhavam. Manuel Vieira, professor do ensino secundário, defende a demissão da ministra porque “todas as vias do diálogo estão esgotadas”.

“Oh titi, oh titi, quem te avalia a ti?”, “Oh ministra, oh ministra, estou aqui, estou aqui, só para dizer, sai daí!”, “Basta!”, gritavam os professores em uníssono. Entre bandeiras e cartazes, t-shirts com frases irónicas, cachecóis, cantava-se o desagrado com a reforma educativa. Ao longo da Avenida da Liberdade elevaram-se cravos, cantou-se o hino nacional e músicas que faziam lembrar a Revolução de 1974.

“Ministra vai embora”

O Terreiro do Paço era a meta da marcha. Unidos, os professores ouviam os discursos dos dirigentes sindicais, músicas de mudança e fortes críticas à ministra da Educação. Por momentos, esqueciam-se as reivindicações para uma melhor política educativa e apenas se pedia a demissão da ministra. “Fascista”,”A escola está na rua, ministra, a culpa é tua”, “Está na hora, está na hora, de a ministra ir embora”, gritavam.

O palco, frente à estátua do rei D. José I, concentrava os principais dirigentes sindicais. “Os grandes líderes arrastam multidões, os nossos líderes são arrasados pelas multidões”, proferiu Deolinda Martin, do Sindicato de Professores da Grande Lisboa.

100 mil professores

O primeiro grito de vitória deu-se aquando da confirmação dos números de adesão à “manif.” 85 mil professores estavam reunidos em Lisboa por volta das 16h00. Mas a alegria foi ainda maior quando a PSP confirmava a presença de 100 mil professores (mais de um terço da classe profissional, segundo a Fenprof), o que excedeu as expectativas dos próprios sindicatos.

SPN no fim

Quem veio de mais longe foi quem mais tarde se juntou no Terreiro do Paço. A cauda da manifestação, composta por professores do SPN, só chegou junto da praça quando os discursos já estavam a terminar. De qualquer forma, não houve desânimo, apenas cansaço que durou até às duas da madrugada, hora a que chegaram a casa.

Abel Macedo, secretário-geral do SPN, afirmou ao JPN que “a ofensiva do Governo está a apoucar a escola pública”, garantindo que os professores não vão parar de lutar.