“Eu tenho um sonho”. Não há, nem pode haver, maneira mais simples e menos original de se começar um texto sobre Martin Luther King. No dia em que passam 40 anos sobre a morte de um dos mais emblemáticos oradores da história, as palavras e as visões do líder negro contra a segregação racial nos Estados Unidos ainda ecoam nos nossos dias.

Foi em Agosto de 1963 que, perante uma multidão de 250 mil pessoas, na marcha em Washington, o pastor baptista perpetuou o seu nome e a sua causa. O célebre discurso “I have a dream” ficou como legado da luta por uma sociedade de integração completa, da qual a segreção social legalizada não fazia parte, que Luther King travou ao longo da sua vida. No ano seguinte, a sua luta pacífica pela igualdade de direitos, valeu-lhe o Prémio Nobel da Paz. Tinha 35 anos.

Isto mesmo conta Teresa Botelho, especialista em Relações Internacionais e conhecedora da realidade norte-americana. Ao JPN, explicou que “o sonho dele [Martin Luther King] está celebrizado no seu discurso mais famoso”. “Sonhava com uma sociedade de integração completa em que as diferenças racias e étnicas não tinham qualquer importância em relação à cidadania”, afirma.

O que hoje parece óbvio, na época foi encarado como uma atitude de mudança face aos tempos que se viviam. Teresa Botelho recorda a conjuntura social e política da época e afirma que “na altura em que o discurso foi feito, era tudo menos óbvio”. “Não só pela política de segregação racial que vigorava nos Estados Unidos, mas também porque dentro da comunidade afro-americana começavam a surgir ideias diferentes. Ideias separatistas traduzidas pelos pensamentos de Malcom X e da Irmandade Islâmica”, explica Teresa Botelho.

Luther King não tinha ideias revolucionárias. As suas ideias eram a crença na Constiuição americana. Foram os tempos e o contexto que o imortalizaram. “A mensagem de Luther King não é uma mensagem extraordinária. Só se tornou extraordinária pela localização e pela situação, porque era uma mensagem de cidadania para todos”, conta Teresa Botelho.

Morte prematura não evitou repercussões políticas

A ideia de uma sociedade igualitária, cimentada na premissa de que todos os homens são iguais, não morreu no dia em que um dos seus mais ferozes defensores foi assassinado. Teresa Botelho recorre a exemplos contemporâneos para, de certo modo, certificar o sucesso da luta travada por Luther King.

“Foram dados passos muito significativos. E não é só o que se passa neste momento com a candidatura do senador Barack Obama, mas também com o simples facto de os últimos governos americanos terem tido afro-americanos em posições de altíssimo poder, como são os casos da Condoleezza Rice e o General Colin Powell”.

Estas realidades são a prova de que, pelo menos, na esfera política, a luta de Martin Luther King não foi em vão. Teresa Botelho confirma esse facto acrescentando, no entanto, que “isso não significa que não haja discriminação”. “Não a há nas leis, obviamente, mas existe muita desigualdade económica e aqui ou ali vivem-se episódios de discriminação, que não podem ser resolvidos numa geração”.

Uma voz silenciada numa luta que não morreu

Aquilo que conheceu o seu auge histórico na marcha sobre Washington, em Agosto de 1963, começou alguns anos antes em Montgomery, no Alabama. Corria o dia 1 de Dezembro de 1955 quando Rosa Parks, uma costureira negra, decidiu quebrar as leis da discriminação e sentar-se nas primeiras filas do autocarro, reservadas aos brancos. O que se seguiu foi talvez uma mera coincidência que viria a alterar o rumo da história.

No dia 2 de Dezembro, Luther King tornava-se o porta-voz da comunidade negra de Montgomery e juntos iniciaram um boicote aos transportes públicos. Começava a luta de uma vida que seria abruptamente silenciada no dia 4 de Abril de 1968. Luther King foi alvejado a tiro, quando subia à varanda de um hotel em Memphis.