Três razões para o encerramento

No relatório da inspecção, são denunciados o “mau estado de conservação e de higiene das estruturas edificadas na zona de venda do pescado”, a proximidade entre esta área, zonas desactivadas e a “zona destinada ao acondicionamento e encaminhamento de resíduos, estes últimos em péssimo estado de conservação e higiene” e “a própria natureza dos produtos, ou seja, maioritariamente pescado fresco não-embalado, particularmente susceptível à contaminação física e microbiológica”.

Os comerciantes de peixe do mercado do Bom Sucesso ficaram hoje, segunda-feira, a saber que zonas vão ocupar provisoriamente no piso das frutas e legumes, depois de a zona que ocupavam, no piso inferior, ter sido encerrado por ordem da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE).

Na próxima reunião do executivo camarário será votada uma proposta para isentar as peixeiras do pagamento de renda até ao final do ano, compensando, assim, a diminuição das condições de trabalho.

Hoje, quando o JPN visitou o mercado, ao fim da manhã e a meio da tarde, o ambiente era calmo. Preparavam-se as bancas de inox onde, já amanhã, será vendido o peixe fresco. Relativamente “contente” com as soluções encontradas pela câmara, Maria Novais da Silva, 64 anos, queixava-se sobretudo do menor espaço que terá. “Pagava duas bancas, só me querem dar uma aqui”, contou ao JPN. “As condições são piores que lá em baixo”.

Mais lenta deverá ser a acomodação das quatro comerciantes de peixe congelado, que também vão passar para o mesmo piso. “Como é que vamos trabalhar amanhã?”, questionava uma delas, Virgínia Fontinha, 43 anos, preocupada com a distância a que vai ficar da câmara frigorífica e com a “falta de condições” nas zonas que lhe estão destinadas, que foram alvo de obras durante a tarde. “Preferia estar lá em baixo e pagar a renda. Aqui temos muito menos condições”.

Algumas vendedoras especulavam-se sobre a altura em que a ASAE decidiu encerrar o piso do pescado, quando decorre o concurso público internacional para a concessão do mercado a privados (por um prazo de 50 anos com possibilidade de renovação por mais 20). Outras alegavam que a situação noutros locais, como no Mercado do Bolhão, é pior e criticavam a autarquia por não ter feito obras. “Isto foi uma vergonha para os da câmara”, disse Albano Diogo, marido de uma peixeira.

Armindo Cunha, comerciante de carnes, que tem representado de forma não oficial os vendedores do Bom Sucesso, defende que faz falta um advogado que defenda os interesses dos comerciantes. No entanto, lamenta, não tem sido fácil mobilizar os vendedores.

“Impacto negativo”

A Associação de Feirantes do Distrito do Porto (AFDP) manifestou hoje “total indignação e discordância” pelo modo como a ASAE e a câmara “actuaram no mercado, prejudicando os comerciantes, os utentes e a cidade”. A situação teve um “impacto negativo”, que “repercutir-se-á com perda de negócios e o esvaziamento do mercado”, acrescentou.

“Os comerciantes, ao paralisarem a sua actividade, abruptamente, têm prejuízos que devem ser imputados à câmara e à ASAE, pela má gestão de informação quando aquela autoridade deveria dar um prazo para a correcção das eventuais anomalias”, afirmou a AFDP.

Um processo atribulado

A decisão da ASAE foi alvo de muitas críticas por parte da autarquia portuense. O vereador das Actividades Económicas, Sampaio Pimentel, criticou a “ausência de bom senso” na conduta da entidade de fiscalização.

Segundo o vereador, a notificação que chegou à Câmara do Porto na passada quinta-feira exigia o encerramento imediato da totalidade do mercado. Já o relatório da inspecção da ASAE (feita a 18 de Julho) determinava que apenas a zona do pescado não reunia as “condições mínimas do ponto de vista higio-sanitário e funcional” para a sua função.

No entanto, António Nunes, inspector-geral da ASAE, disse à Agência Lusa que a notificação é que “realmente vale” e que nela é perceptível que seria a zona de peixe a única a encerrar. O CDS/PP pediu hoje esclarecimentos à ASAE sobre este processo.