Stewart Mader é especialista em wikis, as ferramentas da Internet que permitem a edição fácil de páginas por um determinado grupo de pessoas (pode ser qualquer pessoa ou um grupo restrito de pessoas). O wiki mais conhecido do mundo é a Wikipédia, enciclopédia que qualquer utilizador pode melhorar, mas há vários exemplos de empresas, instituições de ensino e organizações que as utilizam internamente para melhorar os seus resultados.

Mader é um incansável apaixonado defensor do poder dos wikis, que conhece há mais de uma década: escreveu os livros “Wikipatterns” (ele mesmo resultado de um wiki) e “Using Wiki in Education“, mantém o blogue “Grow Your Wiki” e presta serviços de consultoria a várias organizações.

Veio à Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP) como orador do WikiSym, que juntou cerca de 130 pessoas interessadas nas potencialidades destas ferramentas. O encontro começou esta segunda-feira e termina quarta.

Veio à FEUP dar um tutorial sobre como usar os wikis para publicações. De que forma é que eles podem ser úteis neste domínio?

Contei a história de como escrevi o meu último livro, “Wikipatterns”. Usei um wiki para gerir o projecto – da proposta ao conteúdo final, passando pelas revisões dos editores. Mostrei como é que podemos organizar melhor a colaboração, como é que os wikis permitem manter os colaboradores actualizados – eles sabem que é o wiki é o local onde estará toda a informação [de um dado projecto] -, como é que eles envolvem as pessoas porque é fácil obter feedback, dar sugestões…

Para redigir “Wikipatterns”, criou um wiki reservado a um grupo restrito de pessoas ou abriu-o à participação dos potenciais futuros leitores?

Não o abri a toda a gente. O enfoque do meu trabalho com os wikis é como é que se podem usar dentro de organizações e em contextos profissionais. Há duas formas diferentes da utilidade dos wikis. Podem ser abertos a todos (o exemplo mais conhecido é a Wikipédia). No trabalho, a forma como se usa um wiki é muito diferente da Wikipédia, onde é importante criar uma audiência. Quando se usa em contexto profissional sabe-se perfeitamente qual é a audiência, a wiki precisa de ser útil para esse grupo de pessoas.

Quando é que nasceu a sua paixão por estas ferramentas?

Comecei a usar wikis há cerca de 15 anos, quando ensinava Química. Construi um site com conteúdos – chama-se “The Science of Spectroscopy“. Originalmente era um site estático, mas havia pessoas que queriam contribuir, o que me fez querer ter uma boa ferramenta para que eles o pudessem fazer sem que cada contribuição tivesse que passar por mim. A resposta foi boa e decidi pôr o conteúdo todo no site. Desde então a quantidade de conteúdos aumentou imenso. Isso excitou-me bastante: pode-se produzir mais e melhor conteúdo usando wikis.

Em Portugal, pelo que se sabe, ainda não poucas as empresas que utilizam estas ferramentas. Os receios de adopção são compreensíveis ou a situação está a mudar?

Fiquei tão excitado com os wikis que deixei o ensino para me dedicar completamente à consultoria. Trabalhei com universidades e agora trabalho com elas e com empresas, grandes ou pequenas. Vejo razões para o crescimento. Há uma visão errada dos wikis. As pessoas ouvem falar da Wikipédia e têm receio de usar wikis no trabalho porque pensam que toda a gente vai poder contribuir. É compreensível que isso aconteça, mas o que as organizações devem perceber é que, seja para gerir agendas, guardar documentação ou criar uma base de conhecimento, a utilização de um wiki torna a sua vida mais fácil.

Algo que é comum a outras ferramentas da Internet, mas que nos wikis se sente de forma bastante evidente, é que temas que anteriormente seriam para pequenas minorias passam a ter uma comunidade global.

A distância deixou de interessar. Encontram-se as pessoas que partilham os nossos interesses e trabalhamos com elas. Pode-se fazer isto com qualquer assunto. O que motiva os alunos é que o que produzem aparece num site que pode ser lido outras pessoas e que as pode ajudar, em vez de escreverem algo que é meramente avaliado pelos professores. Isto muda o enfoque principal dos alunos: deixa de ser “Preciso de uma boa nota” e passa a ser “Tenho que fazer algo com muita qualidade porque vai estar disponível para todo o mundo”.

No conhecido livro “Wikinomics“, Don Tapscott e Anthony D. Williams defendem que o espírito de colaboração entre os pares, presente nos wikis, está a mudar a economia. É optimista, tal como eles?

Sou optimista quanto ao potencial dos wikis nas organizações. Gosto do livro. Quando faço consultoria para empresas não dou sempre os exemplos com mais impacto de como os wikis podem mudar – não quero assustar as pessoas. Tento mostrar coisas muito específicas em que os wikis podem mudar o trabalho. Ver a alegria das pessoas nas empresas com quem falo, que percebem que o wiki as vai ajudar, é a melhor forma de optimismo.

Alguém mais céptico poderia argumentar que as empresas já dispõem de e-mails, calendários, blogues…

Mas o wiki não substitui as outras ferramentas – aliás, para ter sucesso deve complementar as outras ferramentas. Não se deve ter todo um projecto em e-mails. As reuniões podem estar marcadas num calendário, mas o material, documentação, etc. deve estar no wiki.

O logótipo do “Grow Your Wiki” é um tronco feito de pessoas e no site “Wikipatterns” usa a imagem da relva. Porquê a comparação com as plantas?

Usar um wiki deve levar tempo – para que as pessoas mudem os hábitos, as mentalidades. Mudanças muito rápidas, da noite para o dia, não dão sucesso. Demora tempo até que as pessoas se sintam confortáveis e encontrem as melhores formas de usar um wiki. Tal como as plantas, um wiki deve levar tempo a crescer.

A estruturação da informação num wiki exige muita organização?

Os wikis podem reduzir o caos da nossa conta de e-mail. O que é bom é que não são muito formais, não forçam uma estrutura única e rígida. É uma ferramenta flexível para permitir usos diferentes para equipas diferentes. E essa flexibilidade torna-a poderosa e atractiva a muitas pessoas diferentes.

Tem um perfil na rede social criada pela campanha de Barack Obama. Qual é a importância das novas tecnologias para a política?

Quando se tem um objectivo particular, estas ferramentas podem ajudar. No caso da campanha de Obama, o objectivo é ganhar a eleição. Ele está a usar estas ferramentas para ter uma base de apoiantes, mas, mais do que isso, está a utilizá-las para identificar as pessoas que podem passar a sua mensagem.

Cada pessoa tem um impacto limitado à sua volta, mas muitas pessoas podem amplificar o poder da mensagem. Por exemplo, há ainda muito racismo nos EUA. Se alguém é de uma área onde o racismo está mais presente, talvez se ouvirem algum vizinho a dizer “Este tipo [Obama] é bom” mudem de opinião em relação a ele.

Já disse que os wikis são o desenvolvimento mais importante da Net desde o navegador Web. Porquê?

Quando a World Wide Web foi criada a coisa principal que as pessoas conseguiam fazer era ler sites com o seu navegador. Agora que temos os wikis – e também os blogues e outras ferramentas sociais – podemos contribuir para a Internet. É isso que faz deles os passos mais importantes da Net desde o navegador Web: passámos de um fluxo de um só sentido para um de dois.