A edição deste ano do Fantasporto homenageou, com o Prémio Carreira, o cineasta José Fonseca e Costa, uma das grandes facetas do “Cinema Novo” português. Jorge Leitão Ramos não compareceu e aquilo que ia ser uma entrevista acabou por se tornar num discurso crítico de Fonseca e Costa. O realizador lamentou a ausência do crítico de cinema e a avaliação daqueles que descreve como “os das estrelinhas”. “É pena que ele não esteja aqui, para discutirmos o porquê das estrelinhas”, satirizou Fonseca e Costa.

JPN no Fantasporto

À semelhança de edições anteriores, o JPN marcou presença forte no Fantasporto. Toda a cobertura noticiosa do evento pode ser consultada aqui.

Houve ainda tempo para revisitar a carreira do antigo estudante de Direito que se apaixonou pela Sétima Arte enquanto assistia ao “O Terceiro Homem”, de Carol Reed. Começou, assim, a frequentar os cineclubes, bastante importantes em Portugal principalmente nos anos 50. Com uma grande admiração pelo cinema italiano, José Fonseca e Costa escreve a Michelangelo Antonioni. Fascinado por “Cronaca di un amore”, recebe resposta do realizador italiano e consegue participar nas filmagens de “L’Eclisse”, no início dos anos 60.

No entanto, o cineasta português considera que “não é a ver filmar que se aprende a fazer cinema, mas sim a ver filmes”. Amigo de José Cardoso Pires e de Alexandre O’Neill, Fonseca e Costa não se ficou pelo cinema: trabalhou em filmes de publicidade e desenvolveu a Editora Arcádia. Traduziu e preparou, ainda, a encenação de uma peça de Eric-Emmanuel Schmitt e desempenhou alguns papéis.

“Eu não faço os filmes que quero, mas os que me deixam”

Conhecido por filmes como “Kilas, O Mau da Fita”, “Balada da Praia dos Cães” e “Cinco Dias, Cinco Noites”, José Fonseca e Costa afirma que “são mais os projectos na gaveta”, do que aqueles que filmou. “Eu não faço os filmes que quero, mas os que me deixam”, acrescentou.

Seguiram-se as explicações. Questionado sobre se há esperança para o cinema português, Fonseca e Costa acredita que quando a burocracia impera, “a criatividade morre”. Por isso mesmo, “era preciso que as pessoas mais novas, que querem fazer cinema em Portugal, se rebelassem”, desafiou.

Mas este não foi a única “certidão de óbito” em pleno Rivoli. Sobre a indústria cinematográfica europeia, Fonseca e Costa sustenta que aquela “foi morrendo” perante a “invasão” do cinema americano. Para o cineasta, o problema começou quando “os distribuidores começaram a comprar salas de cinema e foram deixando de projectar os filmes que não fossem de sua propriedade”. “Hoje em dia, vocês estão todos condenados a ver só filmes americanos e normalmente muito maus”, atirou, dirigindo-se à audiência.

Pessoa inspira documentário

O novo projecto de José Fonseca e Costa consiste na adaptação cinematográfica de um texto de Fernando Pessoa, de 1925, intitulado “Lisbon, What The Tourist Should See”. Com este filme-documentário, Fonseca e Costa pretende ilustrar com imagens de hoje, as palavras de Pessoa. Para a narração, em inglês, o cineasta convidou o actor americano Peter Coyote, “que conhece muito bem a obra de Fernando Pessoa”.

A proposta não foi, contudo, apresentada ao Instituto do Cinema e do Audiovisual (ICA), tendo em conta que Fonseca e Costa considera “profundamente injusto” submeter projectos a pessoas em quem não reconhece “a capacidade de os apreciar, de olhar para eles profissionalmente”, rematou.