Os futuros profissionais de saúde em Portugal não sã odevidamente preparados para lidar com casos de eutanásia. O alerta foi dado, esta terça-feira, por especialistas no debate realizado no salão nobre da Secção Regional Norte da Ordem dos Médicos, no Porto. A iniciativa foi promovida pelas associações de estudantes da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP) e do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (ICBAS).

Aberta ao público em geral mas procurada sobretudo por estudantes de medicina, a sessão contou com a presença de profissionais directamente ligados ao tema : Rui Nunes, presidente da Associação Portuguesa de Bioética (APB), António Sarmento, do serviço de doenças infecciosas da FMUP e do Hospital S. João (HSJ), Filipe Almeida, pediatra do HSJ e Paulo Maia, do serviço de cuidados intensivos e comissão ética do hospital Santo António.

Filipe Almeida lançou um repto à audiência: “Eu pergunto a estes alunos de medicina como foi possível entrarem no curso: foi por terem uma boa formação cultural, ou por saberem os livros de bioquímica e física de trás para a frente? Alguém se preocupou com a vossa formação do ponto de vista humano?”

“Testamento Vital”: Respeitar a “liberdade ética dos cidadãos”

Ao longo da discussão na Ordem dos Médicos, Rui Nunes teve oportunidade de mencionar a proposta da APB relativamente ao “testamento vital”, já em vigor noutros países. “A ideia seria permitir à pessoa que está hoje consciente e amanhã inconsciente, hoje capaz e amanhã incapaz, fazer prevalecer a sua vontade previamente manifestada”, explica.

O silêncio dos alunos de medicina deu consistência à ideia de Filipe Almeida relativamente à lacuna que a formação académica apresenta a nível de preparação moral. O médico e especialista em bioética, Daniel Serrão, marcou presença na audiência e acabou por concordar com o pediatra do HSJ. “Os médicos muitas vezes não estão preparados para receber um pedido de eutanásia. E têm de ter uma questão fundamental resolvida: a sua própria morte”, defende.

“A distanásia abre caminho à eutanásia”

Já António Sarmento, director do Serviço de Doenças Infecciosas do Hospital de São João, acredita que a distanásia (prática pela qual se continua a vida de um doente através de meios artificiais) pode conduzir ao desejo de morrer.

“Se as pessoas começarem a ver aqueles que estavam à sua volta a sofrer e a morrer num ambiente estranho, cheios de máquinas, vão dizer logo que não querem continuar a viver”, defende o médico.

Uma das soluções apresentadas por Filipe Almeida passa por “uma boa prática médica”, por um melhor acompanhamento dos doentes. No entanto, segundo o pediatra, não é possível oferecer ao paciente o devido acompanhamento humano devido ao “peso da produção na carreira profissional.” “Não sei se a prioridade é o número ou o doente”, revela Filipe Almeida.