É a primeira vez que o Alkantara Festival, herança do pequeno Danças na Cidade, abre as portas e estende-se até ao Porto. De 21 de Maio a 9 de Junho, o evento, que este ano sofre de uma obsessão pela realidade (ver Caixa), também está presente na cidade, realizando quatro espectáculos nos teatros Carlos Alberto e S. João.

“vamos sentir falta de tudo aquilo de que não precisamos”, em estreia nacional, arranca a programação no Porto, no Teatro Nacional S. João (TNSJ), no mesmo dia que o festival se inicia em Lisboa (21 de Maio). Com este trabalho, que é um misto de teatro, dança e performance, Vera Mantero pretende “despejar muitas coisas da cabeça”, referiu a criadora, esta terça-feira, em conferência de imprensa. “Parece-me que há muita coisa na cabeça que está a mais e então decidi ver o que acontecia com este despejo incessante.”

O Alkantara e a realidade:

Apesar desta extensão, Thomas Walgrave evidencia que o Alkantara continua a ser um “festival ligado a Lisboa”. Com mais de cem espectáculos, a terceira edição tem um alto pendor internacional (só 25% dos espectáculos são portugueses) e, de alguma forma, está obcecada pela realidade, com várias actividades a apostar no documentário ou em variantes. “Também foi uma surpresa quando me apercebi disso”, refere Walgrave. A escolha pode reflectir, talvez, uma vontade de apostar na “compreensão do outro” ou de gerar o “diálogo de uma balança de fragmentos do estado do mundo”.

Pelo Porto passa, ainda, “como rebolar alegremente sobre um vazio Exterior”, de André Guedes & Miguel Loureiro, que, curiosamente, está intimamente ligado a Vera Mantero. A criação tem como base de trabalho os figurinos que André Guedes produziu para um trabalho da artista no Ballet Gulbenkian em 2001. Estes elementos foram devolvidos mais tarde e acabaram por servir de mote para uma parceria, há muito acordada, entre o artista plástico e o actor e encenador Miguel Loureiro.

Em cena no Teatro Carlos Alberto (TECA), a 22 e 23 de Maio, a peça resgata memórias da Comuna de Paris de 1871, um “momento de celebração e projecção de uma promessa”, considera André Guedes.

O “teatro-documentário” do Cairo

Radio Muezzin“, em cena a 26 e 27 de Maio no TECA, é um dos trabalhos que responde ao desafio de retratar realidade que a edição deste ano promulga. É um género de “teatro-documentário” que “convida pessoas a apresentar-se num palco”, considera Thomas Walgrave, responsável pela organização do Alkantara.

Vindos do Cairo, quatro muezins contam a sua experiência de pregadores do Corão, numa altura em que o Ministério dos Assuntos Religiosos está a pensar implementar um sistema de rádio para chamar os crentes para rezar. O Cairo tem cerca de trinta mil mesquitas e, cinco vezes por dia, cada uma delas lança o apelo aos fiéis. Com a nova medida, a cidade pode, pela primeira vez em séculos, mergulhar num novo silêncio.

Por fim, o coreógrafo Bruno Beltrão apresenta “H3“, a 24 e 25 de Maio, no TNSJ. Um trabalho em que o artista perpetua o seu própria vocabulário, em que não perde a sua “linha original” de “dança na rua”, diz