Aos 26 anos, Tiago Barbosa Ribeiro é, desde Dezembro de 2009, presidente da Juventude Socialista (JS) do Porto. Numa conversa centrada nos problemas da cidade, o Secretário Distrital da JS não poupa nas críticas aos mandatos de Rui Rio.

Para Tiago Barbosa Ribeiro, o Diagnóstico Social do Porto é uma prova “catastrófica” do trabalho que “não tem vindo a ser desenvolvido” pela autarquia. Promover uma melhor articulação com a Universidade do Porto (UP) e fomentar políticas de habitação são, para o líder socialista, medidas que devolveriam “ambição” à cidade.

Com esta entrevista, o JPN inicia uma parceria com o blogue “O Porto em Conversa“, da autoria de Vitor Silva. Todos os meses vão ser entrevistados líderes das juventudes partidárias do Porto.

Ouça a entrevista completa aqui.

Como é que vê o Diagnóstico Social do Porto [em PDF] que foi recentemente apresentado?

Parece-me que é claramente uma sentença sobre o trabalho que tem vindo a ser desenvolvido pela Câmara Municipal do Porto [CMP] ou até aquele que não tem vindo a ser desenvolvido. O diagnóstico é absolutamente catastrófico em vários indicadores. Ao nível da população residente, o Porto tem sofrido uma autêntica sangria populacional e todos nós sentimos isso no nosso dia-a-dia. Todos nós temos familiares e amigos que querem viver no Porto e não podem porque não existem políticas autárquicas ao nível da habitação, quando temos milhares e milhares de casas devolutas. A taxa de natalidade é inferior à média do país e a taxa de mortalidade é superior à média do país. Cerca de 21% da população tem uma idade igual ou superior a 65 anos. Temos gravíssimos problemas de sem-abrigo e desemprego. Temos uma redução dos imigrantes nos últimos anos na cidade.

Tudo isso é um diagnóstico do trabalho falhado de uma autarquia, não há volta a dar. Deve suscitar um profundo alarme social na cidade e deve suscitar um sobressalto por parte da CMP, que não pode, ao contrário daquilo que fez quando recebemos estes dados, tentar arranjar mil e uma justificações para a realidade factual que o diagnóstico trouxe. [A autarquia] deve desenvolver um plano social para o Porto, que procure salvaguardar os interesses da população e inverter os problemas que temos, nomeadamente ao nível de perda da população; que consiga intervir, por exemplo, nos bairros sociais, onde temos cerca de 20% da população a viver, com uma elevadíssima taxa de desemprego e com problemas gravíssimos que obras de cosmética não resolvem.

Na apresentação do trabalho, na Assembleia Municipal, a vereadora Guilhermina Rego deixou um conjunto bastante exaustivo de acções e propostas…

… Protocolos. Também qualquer cidadão do Porto consegue consultá-los no site. Existem mil e um protocolos.

O que quer dizer que afinal até há coisas a acontecer…

Ou eventualmente estão a acontecer as coisas erradas porque se há coisas a acontecer e o diagnóstico é este… Este diagnóstico é empírico. Ou de facto as coisas que estão a acontecer são essencialmente propagandísticas e não correspondem a uma realidade de intervenção no terreno, o que me parece a conclusão mais óbvia. Este relatório conclui que, ao final de anos da actual gestão, vários problemas se agravaram e nenhum se resolveu.

“O Porto tem sofrido uma autêntica sangria populacional”

E para a JS qual é a prioridade? O combate à perda de emprego, o melhoramento da habitação, que é um dos grandes objectivos do mandato de Rui Rio?

A Juventude Socialista tem várias prioridades para a cidade. Em concreto, a nível da juventude, uma que nos parece absolutamente decisiva e que constitui uma preocupação central do actual mandato que estamos a desenvolver, prende-se com a habitação no Porto. Não com o carácter tradicional da habitação social, onde também se exige uma profunda intervenção. A JS tem de facto uma preocupação central que tem a ver com a perda da população jovem na cidade do Porto.

Desde que este executivo tomou posse, o Porto perdeu, grosso modo, cerca de 16 habitantes por dia. E vemos que desses 16 habitantes por dia, [valor] que corresponde a uma verdadeira sangria populacional, muitos deles são jovens que saem de casa dos pais e que não conseguem encontrar casa no Porto. São jovens que não conseguem, muitas vezes, encontrar até emprego na cidade e, por isso, criam economias de escala noutros concelhos.

Temos falado com muitos jovens e todos eles nos dizem que a principal preocupação que têm é voltar para a cidade do Porto. Ou seja, os jovens querem viver na cidade do Porto e simplesmente não conseguem viver na cidade do Porto. Isto é um paradoxo brutal porque existem milhares e milhares de casas devolutas na cidade. E aqui parece-nos que a CMP tem insistido num modelo completamente errado de revitalização e reconversão urbana. Tem feito intervenções no miolo histórico da cidade, mas o problema é que a perda de habitação e as casas devolutas não estão necessariamente na Baixa.

“Os jovens querem viver na cidade do Porto e não conseguem”

A perda de habitação vê-se em muitas mais zonas da cidade: na Avenida Fernão Magalhães, em Paranhos, em Ramalde. Existem centenas, milhares de casas abandonadas, devolutas, casas que não baixam o preço porque não existe uma política autárquica de habitação.

Consegue dar um exemplo de uma medida que alterasse esta situação?

Várias. Desde logo temos de conseguir perceber qual é a especialização funcional da cidade. Pode fazer-se, desde logo, com uma articulação com a UP, por exemplo, para a criação de residências estudantis em terrenos da Câmara, que permitam dinamizar o arrendamento na cidade. Temos centenas, milhares de casas devolutas, que poderão ser reconvertidas, guardando alguns fogos para habitação a custos controlados, para a classe média, para jovens casais que queiram habitar na cidade.

Aqui existe simplesmente uma coisa que é a intervenção pública – a capacidade de regulação daquilo que é o edificado na cidade, com uma penalização fortíssima sobre as casas devolutas, para que os proprietários que têm casas fechadas não continuem a pressionar o mercado de arrendamento. Que permita aumentar a oferta disponível na cidade para não termos o paradoxo que temos habitualmente – pessoas a sair da cidade quando temos milhares de casas à venda ou fechadas.

O Tiago é um claro defensor e fomentador do empreendedorismo. Actualmente, por exemplo, a noite do Porto está muito dinâmica, principalmente graças à iniciativa privada. Será que é esta a responsabilidade que cabe à Câmara e à UP ou será que é o cidadão comum que deve tentar fazer qualquer coisa?

Claro que cabe ao cidadão comum. Eu aí não entendo que a Câmara Municipal, tal como o Governo, deva substituir-se a qualquer empreendedorismo individual. O que eu entendo é que a Câmra e as instituições públicas têm um papel decisivo como catalisadores dessas mudanças que surgem na cidade. O que temos visto é que, desde há vários anos, desde que a coligação de direita está na CMP, todas as grandes mudanças e movimentos surgem no exterior da órbita da autarquia. As principais instituições de referência do Porto estão com uma oposição absurda ou com más relações da Câmara, seja do âmbito cultural, desportivo e económico.

A Baixa é um exemplo muito claro daquilo que é a iniciativa privada contra a incapacidade política da Câmara. Quando os primeiros bares surgiram, a CMP foi a primeira a manifestar a sua oposição, a dificultar os acessos, a dificultar regulamentos. É completamente impossível manter a actividade económica sustentável a longo prazo sem a vontade da autarquia de desenvolver essas actividades, de facilitar esse empreendedorismo, de criar vias-verdes para que as empresas se queiram instalar no Porto.

[A autarquia deve] permitir isenções para determinadas actividades de valor acrescentado, por exemplo, no caso da noite portuense, que tem tido um papel importante na actividade económica da cidade, na criação de emprego e também na recolha de impostos. Tudo isso só pode existir com boa vontade e com políticas concertadas.

“Temos de criar parcerias com a UP, temos de criar empresas”

Em jeito de conclusão, o que é que falta fazer no Porto?

Sem querer ser muito dramático, eu creio que falta fazer tudo ou quase tudo no Porto. Se nós formos a ver as várias áreas de intervenção política de uma Câmara Municipal, esta tem falhado em todas ou tem falhado no essencial daquilo que são as aspirações dos portuenses. Nesse sentido, o que importa recuperar é uma nova ambição para a cidade. É um reposicionamento do Porto, Porto-concelho, como líder da região Norte, do distrito. Como uma cidade capaz de captar emprego, captar investimento, captar residentes.

Temos de fixar os que temos e temos de ir agora tentar captar aqueles que saíram e querem voltar. Temos de criar parcerias com a UP, temos de criar empresas, temos de acarinhar as empresas que temos. Temos de criar condições de diálogo com as instituições da cidade – o Futebol Clube do Porto, a Fundação de Serralves, a Casa da Música – instituições claramente esquecidas pela CMP. Tudo isto vai concorrer para uma nova ambição para a cidade, para devolver ao Porto aquilo que tem faltado nos últimos anos – uma dimensão de cidade regional.