Dois anos depois de “O Mercador de Veneza” e depois de ter deixado a direcção do Teatro Nacional de São João (TNSJ), Ricardo Pais volta ao teatro portuense com um novo espectáculo: “Sombras, a nossa tristeza é uma imensa alegria”. Trata-se de um espectáculo que reúne várias facetas, como a fala, o fado, a dança e o vídeo e que vai estar em palco a partir do dia 18 de Novembro. Neste trabalho, o encenador procura retratar as “sombras no sentido de assombramentos”. No entanto, “não são coisas que nos atormentam”, mas sim “coisas com que nos divertimos”, realça.

Para Ricardo Pais, este é um espectáculo “cheio de beleza”. O encenador admite que sempre teve “um fascínio pela singularidade absoluta das variedades que não têm nenhuma relação entre elas”, pois “uma pessoa que vai a um espectáculo procura um sentido, procura a síntese”. Mas, adianta, que sempre foi “fascinado por essa síntese não existir”. Esta visão explica a complexidade e a multidisciplinaridade deste novo trabalho, no qual o objectivo, mais do que distrair e divertir as pessoas, é “desresponsabilizar as pessoas e criar-lhes expectativas novas a todo o momento”, característica que o guionista entende sempre ter feito parte do seu trabalho.

Esta nova criação de Ricardo Pais procura retratar temáticas como a questão da identidade portuguesa e o problema de auto-identidade que lhe está subjacente, recorrendo, para tal, aos grandes textos portugueses. Deles fazem parte autores como Fernando Pessoa, Almeida Garrett ou Pedro Homem de Mello. Autores escolhidos a dedo porque chamam a atenção para “a passagem inexorável do tempo, o regresso de um rei encoberto ou a vertigem da culpa e do desejo”, refere.

A expressão de todas estas questões encontra no fado e no fandango dois veículos
opostos. A tristeza do fado conjugada com a alegria e explosão do fandango, o que explica, de resto, o subtema do espectáculo. Um espectáculo que mistura vários sentimentos, como o choro, o riso, o sexo, a traição ou o humor. “Ora rindo ora chorando” marca boa parte do espectáculo.

Espectáculo multidisciplinar

A complexidade deste novo espectáculo exigiu a Ricardo Pais um grande rigor na sua escrita. O encenador salienta que “não há ali nada que fosse feito de forma improvisada. E cada coisa pôs-se segundo uma lógica descrita”. Um aspecto que Mário Laginha, responsável pela música que acompanha o espectáculo, corrobora, já que “havia um guião com um grau de pormenor imenso”, o que facilitou a criação do tipo de música a adequar a cada acto.

Ainda assim, este “espectáculo de variedades” não resulta de um processo facilitado, uma vez que cruza várias artes como o teatro, a música, a dança e o vídeo. E o cruzamento de todas estas áreas preocupava o músico, na medida em que se “interrogava que respostas ia encontrar ao participar neste espectáculo” . Também Ricardo Pais considera que este trabalho teve “um procedimento difícil”, porque pretendia que o espectáculo fosse “uma coisa espontânea e natural” e que não fosse “traído por uma excessiva guionagem”.

Neste novo trabalho de Ricardo Pais fazem parte nomes das várias áreas culturais. No fado, destacam-se José Manuel Barreto e Raquel Tavares. Na dança, Carla Ribeiro, Francisco Rouseau e Mário Franco. Na representação, Emília Silvestre e Pedro Almendra. Na música Mário Laginha e no vídeo o italiano Fábio Iaquone. Uma equipa que, segundo o encenador, “procurou ter um factor de congregação muito grande”, porque “é muito difícil conseguir que o trabalho de todos seja completamente entroncado uns nos outros”, sublinha.

Toda esta abrangência do espectáculo, quer ao nível da sua diversidade de conteúdos, quer ao nível da vasta equipa que o compõe, leva o encenador a concluir que nunca teve “uma tarefa tão complicada como esta”.”Foi o espectáculo mais difícil de montar que eu tive até agora”, remata.