Antero Braga, da Livraria Lello, não queria acreditar quando um antigo cliente foi à livraria acompanhado por centenas de manuscritos que pertenciam ao seu bisavô. O cliente, que preferiu manter o anonimato, não sabia quem era o autor dos documentos, mas acreditava serem da autoria de algum escritor conceituado.

Assim que viu as folhas soltas, cartas e mais textos manuscritos, Antero Braga ficou convencido de que seriam de Guerra Junqueiro, quando os comparou com os textos do autor que foram editados pela Lello e pela sua antecessora, Chardron, a primeira editora do escritor. O livreiro verificou que existiam fortes semelhanças. “Vi a assinatura e a caligrafia de Guerra Junqueiro”, explica, acrescentando que também analisou “se o papel poderia ou não ser da época em que viveu o autor, a própria forma como os documentos estavam arrumados e datados e pelo próprio fio”. “O poeta tinha uma letra inimitável”, sublinha Antero Braga, acreditando, por isso, que o espólio pertence a Guerra Junqueiro.

Apesar de ter uma certeza quase absoluta, depois de colocar os manuscritos num banco, Antero Braga contactou especialistas de Guerra Junqueiro da Universidade de Coimbra e da Universidade Católica do Porto, bem como da Biblioteca Nacional.

Escritor e poeta, Abílio Guerra Junqueiro nasceu em Freixo de Espada à Cinta, em 1850, e morreu em Lisboa, em 1923. Obras como “A Velhice do Padre Eterno”, “Os Simples” e “Pátria” transformaram-no num dos mais aclamados autores portugueses.

A dúvida sobre se Guerra Junqueiro é realmente o autor dos manuscritos agora encontrados vai demorar cerca de duas semanas a ser esclarecida.

“Sou um homem com sorte”

A descoberta destes manuscritos não surpreendeu Antero Braga, pois “o próprio Guerra Junqueiro escreveu que tinha muita coisa por publicar”. No entanto, ter recebido os manuscritos foi uma verdadeira surpresa. “Porquê a mim? Sou um homem com sorte”, admite Antero Braga. “Ou, então, porque confiam em mim”, conta.

Caso Guerra Junqueiro seja o autor destes manuscritos, Antero Braga garante que estes terão um valor elevado, a ser determinado pelos especialistas responsáveis pela análise. O valor dos manuscritos pode variar, dependendo do conteúdo dos mesmos: se são manuscritos inéditos, se deram origem a livros ou se são apenas cartas.

Para o livreiro, se se provarem que os documentos são de Guerra Junqueiro, “devem ser dadas novas ao Mundo, porque o autor português foi traduzido, já em 1890, em francês”. “Não era um escritor vulgar. Penso que, mesmo a sociedade em geral, cultural e mundial, obviamente terá todo o interesse”. Mas Antero Braga salienta que os manuscritos devem ficar em Portugal. “É o sítio onde as coisas dos portugueses devem ficar”, remata.