Rap, um estilo musical de ritmo e poesia. MC significa “master of cerimonies”. DJ, disc-jockey. Breakdance, popping e locking, as danças improvisadas que surgiram com a influência do Hip-Hop.

Este é o vocabulário que nasceu em bairros africanos e latino-americanos de Nova Iorque, na década de 70. Uma cultura, uma arte, que canta com revolta e se revolta contra a pobreza, a violência, o racismo e o tráfico de droga.

Com uma batida – beat, em inglês norte-americano – de background aliada a palavras que formam frases curtas, mas incisivas e a inspiração para expor sentimentos e opiniões, cria-se uma poesia a que se chama rap. Mas é uma poesia diferente. Agressiva, mas com uma certa sensualidade. Direta, mas com nuances de sofrimento profundo. O rap diz, em muitas palavras, uma única coisa: a necessidade de amor.

É certo que o panorama do rap masculino está quase sobrelotado. Boss AC, Mind da Gap e Valete são já referências nacionais. E mulheres? Há?

Alguns exemplos do rap português feminino

Dama Bete é um dos nomes portugueses mais conhecidos do rap feminino, considerada por muitos “a primeira dama do rap”. MC Capicua estreou-se a solo há um mês. Violet, vocalista das A.M.O.R., caminha em direção ao reconhecimento. São apenas alguns exemplos do que se faz no hip-hop em Portugal.

“Já começa a haver um hip-hop lusófono”, apesar de “as gerações mais velhas não conseguirem ver o rap como música”, refere Dama Bete, a MC que não se identifica com o título de primeira dama e prefere dizer que “foi sorte ter sido a primeira dentro do género a assinar com uma editora” multinacional em 2008.

Sorte ou não, para uma cantora conseguir conquistar um espaço num cenário de street music masculinizado, são precisas algumas qualidades. “É fundamental trabalhar muito, gostar de palavras e ter coragem, porque o rap expõe-nos muito”, diz Capicua, a MC portuense. Violet acrescenta-lhes uma dose de paixão. “Sem amar nunca se vai ter a persistência para chegar onde se quer”, afirma a rapper.

São raras as vezes em que se cruzam com o preconceito. “Eu até acho mais fácil vingar no rap feminino do que no masculino”, diz Dama Bete. “Se aparecer uma rapariga que rime muito, é mais fácil destacar-se, porque já há muitos rapazes que fazem isso”, acrescenta. Quando isso acontece, não lhe dão muita importância. “Claro que temos de lutar três ou quatro vezes mais para ter o reconhecimento, porque há uma ideia de que o rap feito por mulheres é mau, mas quando se conquista esse reconhecimento, temos a vantagem de sermos mulheres”, reforça MC Capicua.

A rua é a melhor escola

Nas últimas décadas, em Portugal, o rap, a par da cultura hip-hop, foi suscitando o interesse e a curiosidade de um público cada vez maior, ao ponto de abrirem escolas em quase todas as cidades. Mas de hip-hop, não de rap. Este aprende-se na rua.

“As pessoas, quando têm vontade de fazer rap, não precisam de uma escola. Começam a escrever milhares de linhas e essa é a melhor escola”, explica Violet, que criou as A.M.O.R. com uma prima, a Honey, e ainda se lembra perfeitamente de, “num dia sem nada para fazer, improvisar um rap em cima de um beat do Sam the Kid”.

Capicua concorda. “Se a pessoa não viver [a cultura hip-hop], não for a festas, não ouvir música, não ler blogues e revistas e não conhecer pessoas desse meio, nunca vai poder aprender”, admite.

Nas ruas, a rimar, misturam-se vivências de homens e mulheres e o género deixa de influenciar a música que se faz. Em 2005, Dama Bete chegou a criar a “Hip-hop Ladies”, uma comunidade online para as rappers se conhecerem e trocarem ideias, numa altura em que não se usavam as redes sociais para divulgar todo o tipo de eventos. “Mas o propósito não era separar o hip-hop feminino do hip-hop em si”, garante a MC. “E como julgaram isso, então decidi encerrar o site”.

Dama Bete, Violet e Capicua são alguns dos rostos de uma geração em crescimento, que gostam de rimar com profissionalismo para criticarem a sociedade e manifestarem as suas opiniões. Fazem-no, independentemente de terem nascido homens ou mulheres.