Desde sempre conhecida como uma cidade de trabalho e comércio, o Porto alberga fábricas centenárias que resistem, ainda, à modernização da época e à crise. Seja a transformar prata, papel ou a produzir passamanarias (pequenas fitas de tecido), a Invicta tem ao dispor oficinas que contam com mais de cem anos de experiência. O JPN visitou algumas.

Manuel Alcino & Filho conta 110 anos prateados

A Manuel Alcino & Filho é uma fábrica de transformação de prata, em funcionamento desde 1902. Foi, desde sempre, um negócio de família e está, agora, na quinta geração, sob a direção de Manuel Alcino. Inicialmente instalada na rua Barão de S. Cosme, a fábrica ocupa agora o n.º 76 da rua Santos Pousada, no Porto, onde está há mais de 40 anos. Recentemente, a empresa abriu uma loja própria no hotel Intercontinental, na praça da Liberdade, destinada ao “turismo de luxo”, afirma o diretor.

A particularidade da fábrica prende-se com o trabalho totalmente artesanal. Diz Manuel Alcino que o objetivo é fazer peças “manualmente, com qualidade”, uma vez que, desta forma, a peça não tem só o valor “no metal precioso” mas também “no trabalho aplicado e no design”. O diretor explica, também, o processo base da transformação da prata, que conta com seis operações básicas: fundição, corte, soldadura, montagem dos diversos componentes da peça, cinzelagem e, finalmente, o processo de acabamentos através do polimento.

A Manuel Alcino & Filhos faz “revenda para todo o mercado nacional”, afirma o diretor, mas tem igualmente algum reconhecimento internacional, nomeadamente, a “nível europeu”. Manuel Alcino considera que têm “uma dimensão relativamente pequena” para se afirmarem, globalmente, “como uma marca ou um nome que apareça ligado à prata”. Ainda assim, “em nichos muito restritos de pessoas bem formadas”, têm “alguns clientes espalhados pelo mundo”.

Há 110 anos a trabalhar a prata de uma forma rara, a empresa pretende desenvolver uma linha própria de “artigos mais dedicados ao turismo” que tenham “mais a ver com a nossa identidade portuguesa”, admite o diretor. Além disso, confirma também que a empresa começa a dar os primeiros passos no “mercado digital”, numa tentativa de se “aproximar do cliente final”.

Única fabricante de serpentinas em Portugal funciona há 125 anos

A Fábrica de Papéis Pintados da Foz nasceu em 1887, na atual avenida do Brasil, na Foz do Porto. É uma fábrica transformadora de papel e, hoje, localiza-se na rua de Pedro Hispano. O atual responsável pela área comercial, André Correia, conta que o avô, Serafim Correia, “tinha comprado a empresa com dois sócios nos anos 50 ou 60 ao fundador”. No entanto, algum tempo depois, a sociedade desfez-se e só um dos sócios ficou com a fábrica. Quando este faleceu, a respetiva herdeira propôs a Serafim a compra da empresa. “Ia fechar, estava completamente condenada”, afirma o responsável.

A fábrica apresenta um trabalho particular, uma vez que produz alguns produtos únicos em Portugal. São eles as serpentinas, os confetti e diversos tipos de papel, tais como o parafinado, o crepado, o gomado e o alcatroado.

Diz André Correia que o papel parafinado, “um papel impermeável”, é o produto mais vendido pela fábrica, em particular pelas suas múltiplas aplicações. Já as serpentinas e confetti representam uma “área de negócio com alguma importância”. A sua produção, explica o responsável, é mantida “por uma questão de tradição” e, sendo um produto sazonal, permite “em muitas alturas mortas, alocar alguns funcionários para aquela função”. Nesta área, a principal competição provem da China, da Alemanha, de Espanha e de Itália.

Ainda com algumas máquinas antigas em funcionamento, como as de impressão de papel de parede e as de dar relevo, a Fábrica de Papéis Pintados da Foz conta já com 125 anos de experiência.

136 anos na confeção de fitas, elásticos e cordões

No n.º 601 da rua de D. João IV encontra-se, desde 1876, a Fábrica de Tecidos Invicta, totalmente dedicada a passamanarias. Foi fundada pelo avô do atual gerente, António Santos, e posteriormente gerida pelo pai e pelo tio deste. Há cerca de quatro anos, António Santos (que, desde os 19 anos, se dedicava parcialmente ao negócio) assumiu o comando da fábrica.

A fábrica produz e vende, para todo o país, fitas, elásticos e cordões, para fins de confeção e retrosaria, mas também “para outras situações”, diz António Santos. O gerente explica que “se usa fitas em embalagens” e em “muitas outras coisas” como, por exemplo, nas “empresas de brindes”, onde “há sempre a fitinha ou o lacinho”.

António Santos afirma que trabalham com várias matérias-primas, como algodão, poliéster e borracha. A confeção das diversas passamanarias passa por algumas máquinas, como as esquinadeiras, que suportam bobines de fios. Nas urdideiras, dispõem-se os fios de uma teia para fazer o tecido. Encontram-se, ainda, várias máquinas como os teares, as máquinas circulares, e até uma antiga calandra artesanal, que serve para dar brilho ao tecido.

A Fábrica de Tecidos Invicta, embora mantenha uma estrutura pequena, trabalha há 136 anos, com vista a manter-se em funcionamento. Diz o gerente que adotaram uma política que se estabelece nas relações com “uma grande variedade de clientes” com montantes relativamente pequenos, de forma a garantir a estabilidade. Quanto ao futuro a longo prazo, esse é incerto, mas António Santos acredita que, um dia, talvez a filha mais velha assuma o negócio.