Com 24 quilómetros quadrados, o Porto é a segunda maior cidade do país. Em 2012, a imponência dos monumentos do século XVIII e a ousadia das construções recentes, os espaços verdes, o rio, o Vinho do Porto e as francesinhas, o clima mediterrânico, a vida noturna e a vida diurna, e o carinho e a descontração das pessoas valeram-lhe o estatuto de Melhor Destino Europeu.

E se tudo isto já são boas recordações, os mais de 40 mil turistas que, só em janeiro, passaram pela Invicta ainda gostam de levar qualquer coisa para casa.

“Sobretudo ímanes, canecas, postais e panos de cozinha“, diz Maria Deivan, 43 anos, atrás do balcão da loja na avenida dos Aliados. Conta que nasceu no Equador, mas veio do Bangladesh com o marido à procura de uma vida melhor. “Antigamente, era melhor aqui. O Equador não era nada. Agora o Equador até parece estar melhor”, ri-se com o exagero, mas garante estar a falar a sério.

À sua volta, as palavras Porto e Portugal aparecem centenas, senão milhares de vezes, em canetas, pequenas torres dos Clérigos, porta-chaves e os demais objetos que nos pode, eventualmente, apetecer oferecer a alguém. Com um catálogo como este, os clientes são na maioria turistas. Espanhóis, franceses, ingleses e brasileiros. “[Os brasileiros] têm muito dinheiro. Com 70, 80 anos já nem pedem muito desconto”, afirma a comerciante.

O Porto tão próximo da Ásia

Maria pertence a uma geração de asiáticos que se apaixonou por Portugal e pela possibilidade de um trabalho estável. A maioria vem do Bangladesh. Por vezes, ainda às voltas com os vistos de residência, encontram nas lojas dedicadas ao consumo turístico um porto de abrigo e uma rede de contatos sem barreiras linguísticas.

Mamun é um desses exemplos. Tem 29 anos e está no Porto há 13 meses. Inicialmente, veio para visitar, mas houve argumentos que falaram mais alto, como “a cultura, as pessoas muito boas e a comida”, refere num português quase perfeito que articula com a arte de muitas horas de conversa com clientes. Agora trabalha, há sete meses, em frente à Estação de São Bento. “Procurei por um dono do mesmo país. Fiz contactos entre Bangladesh e Portugal, foi mais fácil”, explica.

“Se o governo nos der oportunidade, podemos desenvolver o país”, defende Rasel Hossein, 32 anos. Numa loja de esquina na rua Mouzinho da Silveira, todos os dias vende postais e ímanes e, quando o FCP joga, algumas t-shirts com os nomes dos campeões. Ainda está à espera do visto de residência e não percebe o motivo da demora. “As receitas portuguesas em cidades como Porto, Lisboa e Braga dependem muito deste tipo de negócios”, afirma. “Têm de pensar nas nossas condições”, acresenta.

Shaidul Haque anda na casa dos 40, chegou a Portugal há quatro, é o patrão de Rasel. Diz que não foi muito fácil vir para Portugal, pois precisou de trazer já algum dinheiro do Bangladesh, além de que esbarrou contra a burocracia quando tentou abrir uma loja sua, processo que demorou cerca de dois anos. “Os turistas vão comprar sempre mais do que os portugueses”, afirma e, por isso, decidiu apostar neste tipo de negócio.

“Made in Portugal”, uma aposta desafiante

Quem continua a descer Mouzinho da Silveira depara-se com algumas lojas em que rostos asiáticos sorriem entre os produtos importados – quase sempre da China – que oferecem aos turistas a preços acessíveis. Mas também há quem se preocupe em dar a conhecer o que se faz por cá.

Em frente à Estação de São Bento fica a Tabacaria Carmo. Nas prateleiras assistimos a uma exposição de artesanato de várias regiões do país: peças de louça pintadas à mão, azulejos, bases para tachos feitas em arraiolos. Para Maria Helena Barros, 64 anos, há uma regra de ouro: só vende o que é feito em Portugal. “Se sou enganada, acabo logo com o contrato [com o fornecedor]!”, declara. Apesar da ameaça das outras lojas, compensa. “Quando aparecem turistas com o gosto mais refinado, eles fogem disso”, assegura a proprietária.

Necessidade de reconversão

Da mesma opinião partilha Fernando Coimbra, 73 anos. Ainda não consegue vender produtos exclusivamente nacionais, mas não desiste da batalha. A “I love Magic” foi sempre um pronto-a-vestir mas, há três anos, a conjuntura económica ditou a necessidade de mudança. E, mantendo as raízes da industria têxtil, a aposta foi o turismo. Agora vende t-shirts e camisolas com imagens estampadas alusivas ao Porto.

Na Ribeira, onde se aposta na tradição nacional, a necessidade da reconversão não ficou imune. Margarida e Eduardo Encarnação eram donos de uma ourivesaria à qual juntaram, há um ano, a vertente turística. “O problema foram os assaltos e a economia”, afirma Margarida. “Quisemos acompanhar a evolução e ajudar os artesãos a colocar os seus produtos dentro das grandes cidades”, acrescenta o marido. E assim foi. Agora vendem sobretudo produtos têxteis.

Muitos galos de Barcelos e nenhuma Casa da Música

Em todas as lojas, asiáticas ou portuguesas, existem dezenas de galos de Barcelos à venda. Pequenos, grandes, em forma de estátua, porta-chaves ou nas pontas dos lápis, não há quem não repare neles. Mas nem todos sabem de onde é que o galo veio.

Mamun, o comerciante que se apaixonou pelo Porto, conta a lenda a todos os que lhe perguntam pela origem do animal. “Eles não se importam que o galo seja de Barcelos e compram na mesma”, afirma.

Já imagens da Casa da Música não se encontram quase em parte nenhuma. Na Ribeira, na loja de Anabela Silva, 41 anos, já houve, em tempos, postais da Casa da Música, mas ninguém lhes dedicava atenção. “São os que menos saem. Talvez as pessoas procurem coisas mais antigas”, conclui.

Em geral, os comerciantes reparam que há mais turistas no Porto, mas vêm com os bolsos mais vazios. “Levavam artigos de 10 ou 15 euros e agora é só 1 ou 2 euros”, refere Fernando Simões, 67, da Casa das Cestinhas na Ribeira. “Trabalhamos mais, mas vendemos menos”, acrescenta.

Apesar do cenário económico mundial não ser o melhor, os comerciantes portugueses, como Maria Helena, parecem confiantes: “Temos de ter esperança”, declara. Os asiáticos também acreditam que vender para turistas em Portugal será sempre mais fácil. “No futuro não sei, mas, para já, vou ficar aqui”, afirma Mamum.