A seca extrema tem afetado Portugal nos últimos meses. Segundo dados do Instituto de Metereologia de Portugal (IM), os episódios mais longos de seca na cidade do Porto foram assinalados de março de 1943 a fevereiro de 1946. Já no país, o fevereiro mais seco foi registado em 1931. Há já 80 anos que não existia um mês de tão pouca chuva em solos lusos.

Relativamente aos dados de 2012, e de acordo com o Instituto de Meteorologia, a quantidade média de precipitação até 31 de março deste ano foi de 20,8 milímetros (um terço do valor habitual). No entanto, enquanto que no norte e centro foi registado um agravamento da situação, no sul a situação melhorou com as chuvas do final do mês. Apesar desta melhoria, é no Alentejo que a seca extrema é mais sentida e que mais afeta o setor agrícola e pecuário.

O provérbio popular diz que “a invernia de março e a seca de abril põem o lavrador a pedir”. No entanto, um dos problemas consequentes da seca é que não afeta apenas os agricultores, mas também os consumidores de produtos hortícolas. Também os produtores de gado se deparam com obstáculos, sendo o principal a falta de pastagens para alimentar o gado. Os produtores lucram menos, uma vez que têm que comprar rações, que se tornam meios mais dispendiosos de sustentabilidade.

Como explica Laura Soares, do departamento de Geografia da Faculdade de Letras da Universidade do Porto (FLUP), “estarmos a viver um período de seca muito prolongado vai ter implicações a vários níveis”. Neste momento, as “implicações em termos agrícolas” são as mais visíveis, “e é, efetivamente, onde há problemas mais graves e onde culturas já estão perdidas”, afirma. Certo é que “o consumidor vai ser afetado, consequentemente, porque o preço dos produtos vai aumentar”, diz.

Outras implicações estão diretamente relacionadas com os recursos hídricos. “As barragens estão secas e temos que pensar que a maior parte dos cursos de água tem a sua nascente em Espanha. E quando os espanhóis sentirem este problema relacionado com a seca, vão fechar as portas e nós ainda vamos sofrer mais”, diz. “Pensando nós de uma maneira sistémica, se temos falta de água, isso vai refletir-se na agricultura”, refere.

Alterações climáticas vs. ciclos da natureza

Mais uma das consequências que preocupa a especialista em Geomorfologia são os incêndios florestais no verão. Com o atual défice elevado de água e um verão como têm sido os anteriores, com temperaturas altas, este “será um ano grave e negro”, considera. Laura Soares acredita, no entanto, que a seca não se justifica com as alterações climáticas. “Há uma certa tendência para falarmos logo em alterações climáticas mas estas sempre existiram, não se deve justificar os períodos de seca com isso”, remata.

Já Júlio Sá, o conselheiro nacional do Partido Ecologista, “Os Verdes“, pensa que as alterações climáticas estão no centro da questão. “A seca já é uma consequência geral. Os nossos agricultores até têm cultura de prevenção à seca, sobretudo no verão, mas isso acontecer no inverno é algo de inédito. E estamos a assitir a uma alteração climática, mais do que climatérica. O homem tem uma intervenção que altera o meio”, defende.

Continuando a frisar a importância da intervenção humana como causa principal do período de seca, Júlio Sá garante que “a preocupação é sempre grande e não pode ser vista a nível de um episódio, como um ato isolado”. “Tem que haver toda uma política de prevenção dos impactos provocados pela seca”, diz. O conselheiro alerta ainda que “os episódios climatéricos são encarados casualmente”. “Depois não temos um plano que vingue”, aponta.

“Os Verdes” têm defendido, ao longo dos anos, o uso eficiente da água com várias recomendações e propostas no Parlamento e no programa eleitoral do partido. Segundo Júlio Sá, “existe um plano para preservar e salvaguardar a água, que foi aprovado em 2005 e até hoje não aplicado na prática, o que leva a uma falta de medidas adequadas para a poupança e eficiência”. “Neste momento, há uma estimativa oficial que aponta para uma perda de 50% de água no transporte e armazenamento de água no nosso país”, explica. Acrescenta também que “uma das propostas recentes na Assembleia da República foi sobre a gestão eficiente da água na manutenção dos campos de golfe, por exemplo”.

Júlio Sá adverte ainda que os portugueses “votam num partido, não no São Pedro”, alertando para as resistências dos políticos face a medidas tomadas sobre o ambiente no Parlamento. Já Laura Soares acredita que todos os cidadãos devem preocupar-se com a falta de água e, assim, tomar medidas para a poupar e remediar as consequências da seca.