“Temos um milhão de alcoólicos crónicos em Portugal. Por isso, novas medidas são obviamente bem-vindas”. É assim que João Ramos, presidente da Associação de Cidadãos Auto Mobilizados (ACA-M) analisa as novas medidas propostas para a diminuição do consumo de álcool.

A diminuição da taxa de alcoolemia de 0,5 gramas por litro para 0,2 gramas por litro para os mais jovens nos primeiros dois anos de carta de condução prende-se com a tentativa de diminuir a sinistralidade entre os jovens. Estudos apresentados no Forúm do Álcool e Saúde mostram que, nos mais jovens (18-24 anos), uma taxa de álcool no sangue de 0,2 gramas por litro pode equivaler a 0,5 gramas nos adultos.

A recomendação para a diminuição da taxa de alcoolémia nos jovens partiu da União Europeia no início dos anos 90, decisão que Portugal “devia ter acatado em 2000, 2001”. João Ramos defende, portanto, que o país “está 10 anos atrasado” relativamente a esta medida.

Quanto ao aumento da idade para o consumo e venda de bebidas alcoólicas, a pretensão é passar dos atuais 16 anos para os 18. Natacha Torres Silva, secretária permanente do Forúm Álcool e Sáude, acha que a decisão pode dar frutos. “Os resultados vão depender não só da proposta em si, mas sobretudo das medidas de fiscalização e de reforço ao nível da prática da lei”, explica.

A secretária permanente do Fórum Álcool e Sáude salienta que o mesmo se propõe a “ir ao encontro das metas do plano nacional de resolução dos problemas relacionados com o álcool”. “A área prioritária desse plano é reduzir o consumo entre os mais jovens”, diz Natacha.

Proibição de venda em gasolineiras pode afetar produtores de vinho

A proposta prevê também a proibição de venda de bebidas alcoólicas em gasolineiras, participantes ativas no fenómeno do bottelón, que pressupõe o consumo de bedidas na rua. A sinistralidade na estrada é das principais causas de morte nos jovens e isso acontece muitas vezes na presença de álcool. “Na sinistralidade rodoviária, a baixa de alcoolemia reporta-se a essas idades, quer pela inexperiência na condução, quer pelo elevado número de mortes nessas idades”, explica a secretária do Fórum.

Da parte dos produtores de vinho, no que diz respeito à lógica da proibição de venda, José Arruda, secretário geral da Associação de Municípios Portugueses do Vinho, defende que a associação tem “defendido uma prática no sentido da moderação do consumo de vinho”. No entanto, não descarta a possibilidade de estas medidas terem “algum aspeto negativo na venda do vinho”.

A promoção do álcool

Vítor Meirinhos, chefe e professor no instituto da PSP, estabelece um paralelismo entre o consumo de álcool e o tabaco. “Por que razão querem que se torne proibido os pais fumarem à frente dos filhos e não beberem à frente dos filhos?”, realça. Também João Ramos, da ACA-M, fala de uma indeferença relativamente ao álcool que não existe com o tabaco. “Em relação ao consumo de tabaco existem leis: os cigarros são vendidos com um alerta e é proibida a publicidade ao tabaco. Em relação ao álcool, há uma cedência tremenda que faz com que não haja legislação nem medidas preventivas”, diz.

João revela que “há um hábito universalizado entre os jovens do consumo em grandes doses de alcool e isso é promovido” na publicidade. “É inimaginável que a Marlboro, por exemplo, patrocine festivais e concertos rock ou associações de estudantes. Mas achamos perfeitamente normal que as cervejeiras patrocinem tudo isso”, aponta o presidente da ACA-M.

“Isto não pode ser. Esta lógica de cedência não pode continuar”, reforça. João Ramos salienta que, “a partir dos 12, 13 anos, os jovens são induzidos ao consumo de álcool por uma estratégia de mercado que pretende a fidelização do cliente” e que, por isso, “o ciclo vicioso tem que parar muito antes dos jovens pegarem no carro”.