Piermario Morosini, jogador de futebol italiano de 25 anos, faleceu em campo no passado sábado. Aos 31 minutos do jogo entre Pescara e Livorno, a contar para a Série B italiana, Morosini caiu inanimado em campo e, apesar da pronta assistência, acabou por falecer já no hospital. O mundo ficou novamente em choque com a morte súbita de mais um atleta de alta competição, o segundo caso de 2012, depois do indiano Venkatesh.

Em Portugal, o caso mais antigo remonta a Pavão, histórico nome do FC Porto, que caiu inanimado em jogo contra o Vit. Setúbal. Mais recentemente, muitos recordarão a morte “em direto” de Miklos Fehér e o caso de Rui Baião, que morreu após um coma de quatra dias causado por uma paragem cardíaca meia hora depois um treino. Já em 2006, Hugo Cunha, futebolista do União de Leiria, morreu subitamente enquanto jogava com os amigos.

Internacionalmente, foram já vários os casos que chocaram o mundo futebolístico. Marc-Vivién Foé (2003) e Antonio Puerta (2007) morreram em campo em representação da seleção dos Camarões e do Sevilha, respetivamente. A 17 de março deste ano, o coração de Fabrice Muamba parou no encontro contra o Tottenham. A história do atleta do Fulham acabou por ser mais feliz, tendo o mesmo recebido alta hospitalar esta semana.

Este tipo de casos no futebol parece estar a aumentar, embora não exista nenhum dado estatístico sobre o assunto. O JPN falou com Raúl Pacheco, diretor do departamento de Medicina Desportiva do Instituto Português do Desporto e Juventude (IPDJ) para tentar perceber as causas da morte súbita e como preveni-la.

Prevenção e rastreio são palavras-chave para evitar a morte súbita

De acordo com o especialista, em termos globais “não tem havido um aumento significativo no número de mortes súbitas no futebol”. O médico chama a atenção para os baixos números anuais a nível europeu (uma a cinco mortes por cada milhão de desportistas), mas admite que a mediatização dos casos de morte súbita acaba por preocupar a população em geral.

Raúl Pacheco divide a origem dos casos de morte súbita em dois grandes grupos: indivíduos com idades até 35 anos e aqueles com mais de 35 anos. Até aos 35, as causas de morte devem-se sobretudo a “anomalias cardíacas estruturais ou elétricas, como a miocardiopatia hipertrófica”, que explica serem alterações que podem não ser detetadas nos primeiros anos de vida e que, com a acentuação da carga de treino, acabam por aparecer. Já nos atletas com mais de 35 anos (tanto no desporto sénior como veterano), a morte súbita é associada, principalmente, ao “enfarte do miocárdio” e a “doenças das artérias coronárias”.

Paralelamente a estes dois grupos, Raúl Pacheco alerta para o crescimento de um novo, caracterizado pelo consumo de “substâncias ergogénicas e drogas sociais”. O especialista refere que as substâncias ergogénicas não estão inseridas no grupo das substâncias ilícitas mas que, “juntamente com as grandes cargas de treino e com o stress, podem desencadear a morte súbita”.

Para Raúl Pacheco, são essenciais “o rastreio e a prevenção”. O médico explica que existe um boletim médico-desportivo obrigatório para os atletas federados, que inclui historial familiar e pessoal e um eletrocardiograma obrigatório. “Muitos problemas podem ser detetados aí”, defende. Este exame pode ser realizado por qualquer organismo ou médico e, apesar de admitir que nem sempre existe todo o cuidado necessário, o especialista diz haver sempre a possibilidade de recorrer à SPDM em caso de alguma dúvida médica.

Raúl Pacheco refere ainda que a prevenção deve ser geral e não se cingir apenas à alta competição, apelando à “auto-responsabilização na saúde” das pessoas que praticam desporto ocasionalmente.

Microchip desenvolvido por equipa portuguesa pode salvar muitas vidas

Através de uma parceria entre o Instituto Superior Técnico (IST) e o Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores, Investigação e Desenvolvimento de Lisboa (INESC-ID), uma equipa de três investigadoras portuguesas desenvolveu um microchip capaz de prevenir muitos dos casos de morte súbita no desporto. Este microchip, em desenvolvimento há mais de sete anos, tem uma dimensão de 1,5 centímetros por 2,5 centímetros e contém sequências de ADN com informação associada às patologias cardio-vasculares com elevado cariz genético – como a miocardiopatia hipertrófica, miocardiopatia arritmogénica e síndrome de Brugada, por exemplo.

“No caso da miocardiopatia hipertrófica, por exemplo, colocamos no chip 900 mutações de genoma que podem causar problemas, descritas e validadas pela comunidade científica internacional. Fazemos uma análise de sangue à pessoa e retira-se o ADN. Essa informação genética é tratada e colocada no chip e, quando corresponde a uma das sequências que já lá estavam, é emitido um sinal reconhecido por um equipamento específico, que funciona por laser”, explica Ana Teresa Freitas, uma das investigadores do projeto.

No caso de a pessoa possuir a miocardiopatia hipertrófica, são reconhecidos “entre um a três sinais”. De seguida, passam “para o clínico um relatório com essas alterações no genoma”. Ana Teresa Freitas realça que o processo “só precisa de ser feito uma vez na vida”, porque o genoma não tem tendência para se alterar. “Um atleta que faça este teste e que não dê nenhum sinal dá-nos a segurança para dizer que não existe grande risco de morte súbita. E se o atleta demonstrar algum destes sinais, é uma informação muito importante para o clínico”, afirma.

A comercialização do microchip está a cargo da empresa SHPG – HeartGenetics. O microchip deverá ser disponibilizado ao público já no segundo semestre de 2012, estando o preço ainda em estudo, condicionado pelo volume de encomendas.