A Esclerose Múltipla (EM) é uma das doenças mais comuns do sistema nervoso central (cérebro e medula espinal), para a qual não existe cura, e que afecta cerca de 2 milhões e meio de pessoas no mundo. Resulta de danos na mielina (desmielinização), uma substância gorda que envolve e protege os nervos, permitindo-lhes transmitir impulsos rapidamente. Quando a mielina é danificada, os nervos deixam de conduzir impulsos elétricos para e do cérebro, dando origem aos vários sintomas da EM e a áreas endurecidas ou cicatrizes (onde a mielina foi afetada). Esclerose múltipla significa, literalmente, cicatrizes múltiplas.

Sem ter ainda causas conhecidas, apesar da suspeita de se tratar de uma doença auto-imune, esta doença inflamatória afeta jovens adultos, entre os 20 e os 40 anos, e surge essencialmente entre os 29 e os 33, enquanto o início dos sintomas pode ir dos 10 aos 59 anos. As mulheres parecem ser mais suscetíveis de contrair EM que os homens, sendo que é 50% mais frequente no sexo feminino.

5 mil casos diagnosticados em Portugal

Em Portugal, há cerca de 5 mil casos diagnosticados. Diogo Tavares tem 23 anos e faz parte deste número, mas encara a Esclerose Múltipla mais como um desafio do que como uma doença, que o leva a gastar a energia que tem em “coisas positivas”. “Não posso ter o mesmo modo de vida que tinha antes, mas faço basicamente aquilo que todos deviam fazer: viver com regras e disciplina em termos de horários – para dormir, descansar, trabalhar…”, conta.

Tinha 19 anos quando lhe diagnosticaram a doença. Uma ida de bicicleta de Matosinhos ao Porto, que culminou numa fadiga extrema e uma dormência que se alastrava do pé ao joelho, levou-o ao hospital, onde fez uma punção lombar e alguns exames que levaram ao diagnóstico de Esclerose Múltipla. No primeiro ano com a doença, Diogo quase esqueceu que tinha EM. “Eu achava que era indestrutível, que quem mandava na minha vida era eu, não era o meu problema. No ano seguinte, bati com a cabeça na parede.” Foi obrigado a alterar o seu modo de vida, porque “a doença atacava”, apesar de até agora ainda não ter desenvolvido nenhum grau de deficiência. “Nestes últimos dois anos, o que sinto mesmo é muita fadiga”, explica.

Esclerose Múltipla evolui de forma muito distinta de pessoa para pessoa

Devido ao desconhecimento que há em relação a esta doença, é impossível prever a forma exata de como vai ser a evolução da Esclerose Múltipla em cada pessoa. Enquanto cerca de 45% das pessoas não são muito afetadas e conseguem manter uma vida normal e produtiva, 40% é afetada progressivamente. Cerca de 15% destas pessoas vai sofrer uma incapacidade grave, que pode afetar permanentemente a mobilidade, por exemplo.

No entanto, um parágrafo não chega para enumerar os sintomas possíveis. Visão turva, problemas de equilíbrio e coordenação, espasmos e tremores, rigidez nos músculos ou, ainda, impotência, dificuldade de articulação no discurso e problemas da bexiga e dos intestinos são apenas alguns dos possíveis indícios, que dependem das áreas do sistema nervoso que foram afetadas. Diogo decidiu não pensar nisto. “Eu penso é em viver ao máximo o meu dia-a-dia, sem pensar muito no que pode vir a acontecer amanhã. Ter uma atitude positiva é meio caminho andado e este processo ensinou-me que tenho de viver um dia de cada vez”, diz.

O que realmente preocupa Diogo, a estudar Design de Comunicação na Escola Superior de Artes e Design do Porto, é, por vezes, não conseguir cumprir horários nos trabalhos da faculdade, “por causa do cansaço”. “E custa-me, às vezes, perceber que as pessoas não entendem, por ignorância (em relação á doença). Às vezes as pessoas são maldosas sem querer”, conta. “Como não tenho nenhum tipo de sintoma mais notável, é fácil pensar que estou a mentir ou a aproveitar-me da situação”, conta. O estatuto de doente crónico ajuda bastante neste processo, mesmo que às vezes seja “difícil conciliar muitas tarefas diárias”.

Ainda há muito desconhecimento sobre a Esclerose Múltipla

No nosso país, em 2010, o estudo “Empregabilidade e EM” diz que cerca de 55,6% dos doentes com Esclerose Múltipla se encontravam inativos – a maioria por reforma. Destes, 39% foram obrigados a fazê-lo. 41,5% foram despedidos ou reformaram-se antecipadamente, enquanto apenas 33% desistiu por falta de capacidade para trabalhar.

Apesar de alguns momentos mais complicados, Diogo tem sido sempre bem sucedido. “Posso nem sempre tirar as notas mais brilhantes, mas tenho cumprido sempre os meus objetivos”, conta. Nem por isso deixa de ouvir “comentários infelizes”. “Já houve até alguns casos de me colocarem a hipótese de me reformar, ou pedir uma pensão por invalidez, mas isso não é para mim”, afirma. No entanto, muito disto se deve à “família espetacular, que é fundamental”, “aos melhores amigos que podia ter” e à “namorada impecável”. “Estas pessoas nunca me falham”, confessa.

A Esclerose Múltipla origina, muitas vezes, depressão e alguma retração no que toca ao relacionamento com outras pessoas, mas isto parece não acontecer com Diogo e a namorada. “Enquanto amigos, eu contei-lhe o que tinha. Ela foi logo ler mais sobre isso, para perceber o que era a minha doença e não tem problema nenhum. Às vezes eu é que complico as coisas, acho que as pessoas não me compreendem, mas não é bem assim”, explica. Em relação ao futuro, ainda não pensam nisso. “Não há sentenças finais, numa doença como esta”, afirma.

Sociedade Portuguesa de Esclerose Múltipla é um apoio fundamental

Nem Diogo nem nenhum dos outros portadores da doença lidam com esta situação sozinhos, a menos que assim o pretendam. A Sociedade Portuguesa de Esclerose Múltipla (SPEM) tem sido “uma grande ajuda” no apoio a estes doentes. Para Diogo, o mais importante foi o apoio psicológico, que considera fundamental, e a “partilha de experiências e realidades”, através da terapia de grupo. “Foi bom conhecer outros casos e outros sintomas, assim como outras visões perante a doença. Acho que não há nada mais sábio que ouvir outras pessoas com a mesma linguagem. Ali, jogamos todos o mesmo jogo”, conta.

O dia mundial da Esclerose Múltipla nasceu há quatro anos pela mão da Federação Internacional de Esclerose Múltipla (MSIF – International Federation of Multiple Sclerosis) e é celebrado a 30 de maio, em 51 países de todo o mundo. Pretende “chamar a atenção para a importância da defesa dos direitos, acesso ao tratamento, proteção social e melhores condições de empregabilidade de mais de dois milhões de pessoas com EM de todo o mundo”.

Este ano, a MSIF criou o site World MS Day, com postais de todo o mundo (e entre os quais se encontram muitos portugueses), “com o objetivo de utilizar as histórias de vida de pessoas com EM e de outras que são também afetadas por ela (como os familiares e prestadores de cuidados), para aumentar a sensibilização sobre o que é a doença e de que modo ela afeta as pessoas”.

Já a SPEM, além das atividades em vários pontos do país, comemorou o dia com o lançamento do DVD “Mobility Matters”, um vídeo com exercícios especialmente pensados para doentes com Esclerose Múltipla, já que entre 64% e 85% dos portadores da doença apresentam mobilidade reduzida.