Há casos de portugueses que aproveitaram oportunidades ao adotar profissões pouco comuns e hoje são, de alguma forma, reconhecidos naquilo que sabem fazer melhor. Entretanto mudaram de país e não pensam em voltar tão depressa. Com caminhos e rotas diferentes, os três portugueses falam sobre esta experiência profissional e pessoal.

Assim, o que começa por ser comum a Dálio Calado, mixologista em Nova Iorque, Ricardo Vieira, pianista em Paris, e a Paulo Sebastião, consultor informático e padeiro nas horas vagas em Estocolmo, é só mesmo o facto de terem emigrado. Depois, cada um descreve percursos completamente diferentes.

No caso do pianista, foi para Paris “à procura de uma cidade que correspondesse mais às expetativas de um artista”, que já era em Portugal. A ideia de seguir a música era clara, assim como para Paulo Sebastião era seu objetivo trabalhar na área em que se tinha formado. “Vim para a Suécia porque gostava de experimentar viver no estrangeiro e para trabalhar em engenharia informática”, explica o “padeiro das horas vagas”.

A emigração de Dálio Calado, ao contrário das outras, acaba por ser “um acaso”. A visita a Nova Iorque não contemplava a hipótese de ficar. “Na altura, a área da música interessava-me e ia gravar e tocar ao vivo como músico convidado e com alguns elementos de uma banda portuguesa, mas com o pensamento de que voltaria”, explica o mixologista.

As oportunidades onde menos se esperam

No entanto, assim que chegaram ao destino, todos aproveitaram para fazer o que sabiam melhor e nem sempre o que tinham planeado. Ricardo Vieira não conhecia ninguém em Paris, mas também garante que lá não há hipótese de “arranjinhos”. Decidiu estudar durante dois anos na escola superior de música e, depois, criou o projeto Musicorba. Com o pianista japonês, Tomohiro Hatta faz a “partilha do piano” a quatro mãos e aposta num género de espetáculo raro.

Ainda assim, raro deve ser, para muitas pessoas, ouvir falar em mixologia. Dálio explicou que foi atrás da música “para a terra de todas as oportunidades”, mas o facto de ter de arranjar um part-time num conhecido restaurante nova-iorquino revelou outro talento escondido. Deste modo, descobriu que sabia fazer misturas com bebidas e que daí resultavam cocktails que agradavam aos clientes do restaurante. O talento era a mixologia e daí a criar a própria empresa, Classical Cocktails, e a ter o seu bar na “Big Apple” foi um passo.

Já para Paulo, o gosto pelo pão vem da infância e foi a necessidade que despertou o talento. “Sempre fui menino da mamã, portanto, nunca precisei de fazer comida, mas quando me mudei para cá tive de começar a cozinhar e sentia saudades do nosso pão, mais branco”. Deste modo, apesar de não abdicar da sua profissão como consultor informático, a ocupação de padeiro passou a ser um “passatempo sério”.

O reconhecimento parece chegar normalmente

Assim, no ano passado, Paulo fez uma formação em Paris e, mesmo que não ganhe dinheiro com esta ocupação, preenche os fins-de-semana numa padaria a trabalhar com um dos melhores padeiros da europa e assina o “Zine de Pão“, blogue reconhecido no mundo da blogosfera culinária.

No entanto, para Ricardo, todos os portugueses no estrangeiro são embaixadores do seu país. Todavia, o trabalho que tem desenvolvido já lhe deu o título de embaixador da música erudita portuguesa, a oportunidade de tocar no Olympia num concerto de Kátia Guerreiro e o destaque na imprensa. Já Dálio também tem tido a oportunidade de explicar melhor o que é a mixologia ao grande público. Para além de ter participado num programa televisivo norte-americano, já surgiu na imprensa brasileira, uma vez que todos os meses tem trabalho em São Paulo.

Agora, mesmo que tenham outros planos para o futuro, o ter arriscado na hora certa e aproveitado as suas qualidades já valeu a pena. Voltar a Portugal não é certo para nenhum deles mas, afinal, fala-se de cidadãos do mundo que aproveitaram os seus talentos mais desconhecidos e encontraram o seu “lugar ao sol”.

Fotos:DR
Cartoon Musicorba: Ricardo Campus