Raquel, Pedro e Manu são exemplo de jovens que tiveram que abandonar o ensino superior para se dedicar ao trabalho, simplesmente porque não tinham meio de conseguir continuar a estudar. Oriundos das mais diversas áreas, todos se veem a braços com um problema comum: a certeza de que um curso superior já não é uma garantia de emprego.

Raquel Vila-Verde abandonou o 2.º ano de Biologia na Universidade de Lisboa porque deixou de poder contar com o apoio financeiro por parte de familiares. “Fiquei apenas com a bolsa de apoio social, que dá para pagar as propinas e pouco mais. Tenho bolsa de estudo até ao final do ano, mas como não consigo arranjar trabalho, quando terminar o dinheiro da bolsa vou ter que sair do país”, explica a jovem.

Níveis de abandono escolar semelhantes aos do último ano letivo

Segundo um estudo levado a cabo pelo CRUP – Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas – os níveis de abandono escolar até ao dia 31 de dezembro do ano passado, são semelhantes aos registados no ano letivo anterior. O documento foi apresentado na passada terça-feira, dia 12 de março, em plenário do congresso de reitores.

“No atual contexto laboral é praticamente impossível alguém ser trabalhador-estudante. As cargas horárias aumentam e a flexibilidade de horários, normalmente em prejuízo para o trabalhador, são cada vez mais prejudiciais. Chega a uma altura em que temos de optar: descurar o trabalho e ‘bater o pé ao empregador’, optanto por concluir um curso e reclamando um horário de trabalho convencional, ou então trabalhar, trabalhar, trabalhar”, explica Pedro Dinis Ferreira, que abandonou, ao fim de um ano, o mestrado de Ciências da Comunicação na Universidade do Porto.

Raquel está numa situação diferente, ainda assim. “Eu gostava de ter desistido do meu curso para trabalhar, mas a verdade é que ainda não consegui arranjar trabalho”, conta. Por isso, a solução passa por emigrar. Voltar aos estudos não faz parte dos seus planos e, se o fizer, será no estrangeiro. Enquanto Raquel não emigra, Manu Gaston já teve que o fazer por força das circunstâncias. Atualmente reside em França e trabalha num hotel.

Para o estudante de encenação e interpretação-teatro, na Escola Superior Artística do Porto, deixar de estudar não foi uma decisão ponderada, mas sim “forçada”, devido à falta de condições financeiras. “Não tive direito a bolsa, embora achasse que tinha direito”, acrescenta. Apesar de o momento não ser o melhor, Manu não descarta a possibilidade de voltar aos estudos e terminar o curso.

Também Pedro pretende terminar o mestrado em Comunicação. Não acredita no discurso de que há excesso de trabalho qualificado. “Cada um é livre de enveredar pela carreira que quer, profissional e académica, e entendo não haver limites na ambição pessoal, académica e profissional de cada um. Se temos valor, há que o valorizar e não ‘nivelar por baixo'”, refere.

Num “jogo” de prioridades, é normal que o emprego passe, imediatamente, para primeiro plano

Com os preços das necessidades mais básicas a ficarem cada vez mais insustentáveis, estudar deixou de ser uma prioridade para estes três jovens, no momento. Manu acredita, devido à atual crise económica e financeira, que um curso superior já não é mais uma prioridade para muitos jovens, até porque não oferece perspetivas reais de emprego. Para o estudante de artes, funciona mais no aspeto da realização pessoal.

Pedro é mais otimista. Apesar de achar que, devido às atuais circunstâncias, o emprego passa para “primeiro plano”, acredita que “há sempre busca por trabalho qualificado” e que, dessa forma, os estudos não devem ser descurados. “No entanto, não se devem desperdiçar oportunidades de trabalho quando aparecem. Neste momento são raras”, adverte.