Numa sociedade em que se afirmam novos papéis sociais e a monoparentalidade é cada vez mais comum, são cada vez mais os pais a acumular responsabilidades que, no passado, se associavam à mulher. Um fenómeno descrito como “maioritariamente feminino”, agora associa-se, também, ao sexo oposto.

“Os homens vêm a reivindicar um lugar importante, quer ao nível dos afetos, quer na educação e nas tarefas de prestação de cuidados”, afirma Isabel Dias, professora do departamento de Sociologia da Faculdade de Letras da Universidade do Porto (FLUP). “Na atualidade, a monoparentalidade está muito relacionada com com a separação e com as taxas elevadas de divórcio que o nosso país conhece, à semelhança de outros países neste enquadramento de modernidade demográfica”, afirma a socióloga.

Uma questão cultural

Ao JPN, Isabel Dias afirmou a existência de um maior valor dado à família tradicional nos países do sul da Europa, onde a monoparentalidade está mais associada ao feminino e a situações de pobreza. Por oposição, “nos países da Europa do Norte, a modernização dos papéis familiares fez-se sentir mais cedo” e a existência de infraestruturas de apoio cimentou-se para apoiar famílias monoparentais.

Isabel Dias acrescenta que, “em termos estatísticos, as crianças continuam a ser entregues, maioritariamente, às mães, porque prevalece muito o argumento biológico“. Mas a sociedade está em mudança e, “em Portugal, há magistrados e juízes de direito mais sensíveis para o papel do pai, atribuindo-lhe igual direito à guarda da criança”, afirma a socióloga. Para além disso, “cada vez mais o pai tem vindo a reivindicar a guarda exclusiva ou partilhada de criança”.

José Carlos Oliveira, divorciado, considera que, independentemente do progenitor que fique encarregue de tomar conta do filho, “devemos preocupar-nos com as condições que cada um pode dar”, sendo elas “materiais e emocionais”, ambas “importantes para o desenvolvimento da criança”.

“O que destrói uma criança é ver os pais a destruírem-se um ao outro”

As condições que conduziram estes três pais à monoparentalidade foram, em todo o caso, distintas. César Santos detém a custódia do filho de apenas três anos, mas garante que tanto o pai como a mãe “têm os mesmos direitos” e que o filho continua a conviver frequentemente com a mãe. Para Virgílio Machado e José Carlos Oliveira, a situação foi ligeiramente distinta, na medida em que os filhos já eram maiores de idade e foram eles a escolher com quem ficar.

Virgílio e José não acreditam que tenha havido um “aumentar das responsabilidades” perante os filhos, já que os jovens eram crescidos e já tinham “o caráter definido”. Virgílio explica que continua a manter uma vida perfeitamente normal em nada agravada pelo facto de ter o filho ao seu encargo. “Continuo com a minha vida profissional como tinha antigamente e não sinto nenhuma responsabilidade acrescida, porque ele continua com a mãe e com o pai”, conta.

Estrato social

De acordo com Isabel Dias, o fenómeno está, no entanto, determinado por outros fatores. A socióloga afirma que “esta alteração [de paradigma] é diferente consoante as condições sociais: homens mais qualificados vão partilhando mais os papéis no cuidado com os filhos”.

Para César, a situação revelou-se ligeiramente diferente. Apesar de contar com o apoio da mãe e da ex-mulher, tem consciência de que é a “primeira influência” para o filho e que este se tornará no que ele “o moldar”. No entanto, César tem a certeza de que está a exercer o seu papel da melhor forma possível.

Mas apesar da monoparentalidade ser cada vez mais comum, César e José Carlos notam que ainda há preconceito. No seu caso, César conta que é frequentemente congratulado por tomar conta do filho, enquanto existem mães solteiras que passam muito mais dificuldades mas que “ninguém diz nada porque é expectável” para a mulher. Em contraste, Virgílio acredita que “o panorama se alterou radicalmente” e que cada vez há mais homens “vocacionados para educar os filhos”.

Em todos os casos, houve um entendimento “adulto” e “saudável” por parte dos progenitores, o que, na opinião destes pais, contribuiu para que as crianças não tenham sofrido com a separação dos pais. César conta, inclusive, que o filho aprendeu a adequar o comportamento perante os pais: “O que destrói uma criança é ver os pais a destruírem-se um ao outro”, conclui.