A Associação Portuguesa de Surdos criticou a formação dos docentes de Língua Gestual Portuguesa (LGP). A mesma organização afirmou que, segundo a lei, a educação bilingue não está a ser aplicada da melhor forma.

São mais de 30 mil as pessoas que fazem parte da comunidade falante de Língua Gestual Portuguesa (LGP). Intérpretes, há cerca de 150. A propósito do Dia Nacional da Educação de Surdos, que se assinala esta terça-feira, Jorge Rodrigues, presidente da Associação Portuguesa de Surdos (APS), afirmou que a lei portuguesa não está a conciliar a concentração de alunos surdos com a necessidade de garantir a competência em língua gestual por parte dos professores.

De acordo com Jorge Rodrigues, os intérpretes de LGP deviam passar por um processo de avaliação periódica em que houvesse profissionais à altura capazes de apontar as falhas e os pontos positivos. Em declarações à Lusa, o presidente referiu que o objetivo, por agora, é “garantir a qualidade da formação de docentes e intérpretes de LGP, criar a profissionalização para o ensino dos docentes de LGP e o respetivo grupo de docência que lhes permita a prossecução da carreira”.

Segundo a APS, em Portugal não há escolas exclusivas para alunos surdos, pelo que os estudantes são integrados em instituições, em turmas compostas parcial ou exclusivamente por jovens surdos. Não há escolas no país que disponham aos estudantes cursos de interpretação de língua gestual. Desde 1999 que os intérpretes são obrigados a ter uma formação superior. A maioria é licenciada pelas Escolas Superiores de Setúbal, Coimbra e Porto.

Dia Nacional da Educação de Surdos

O Dia Nacional da Educação de Surdos é assinalado esta terça-feira com um concurso de curtas -metragens subordinado ao tema “Surdos e ouvintes na mesma escola, como é?”. Jorge Rodrigues relembra que “é fundamental que [os professores] sejam competentes em LGP para que os alunos aprendam, de facto, os conteúdos curriculares”.

“O problema está em escoar” os intérpretes de LGP

Ana Rita Correia, licenciada em Língua Gestual, esclarece que “mesmo as EREBAS – Escolas de Referência de Educação Bilingue de Alunos Surdos – não possuem essa disciplina para os alunos Ouvintes”. Em declarações ao JPN, Ana Rita chamou à atenção para o facto de a LGP estar “aquém do desejável”, em Portugal, “pelo simples facto que reside na desigualdade de direitos entre a comunicade Surda e Ouvinte”.

Jorge Rodrigues esclareceu, ainda, que a percentagem de filhos de pais surdos que são capazes de comunicar em LGP é bastante reduzida, sendo que, quando optam por este tipo de cursos, nunca tiveram contacto com surdos. Um dos problemas que mais preocupa Jorge Rodrigues é o facto de os intérpretes pouco aprenderem ao fim de três anos de licenciatura. Ao mesmo tempo, o presidente da APS frisa que poucos são os interessados em frequentar a comunidade surda a fim de adquirir novas competências.

Ana Rita Correia defende que “a licenciatura em Tradução e Interpretação em Língua Gestual Portuguesa forma bons profissionais”, mas que “o problema está em escoar todos esses intérpretes, uma vez que as EREBAS estão lotadas de intérpretes”.

A tradução e interpretação do telejornal é um bom exemplo

Apesar de estar previsto na lei, os professores de língua gestual nas escolas básicas e secundárias nem sempre estão a cargo do ensino da LGP à comunidade escolar. A integração dos alunos surdos torna-se um obstáculo maior por haver dificuldade em comunicar com os restantes colegas.

Ana Rita Correia explica que, enquanto estagiária numa escola EREBAS, “percebeu que os alunos Surdos não se encontram, de facto, integrados com os alunos Ouvintes. Se os alunos Ouvintes tivessem no seu plano curricular a disciplina de LGP, haveria talvez uma vontade de tentarem comunicar e, aí sim, unir as duas comunidades – Surda e Ouvinte”. Apesar de “aquém do desejável”, Ana Rita Correia considera que a situação da Língua Gestual Portuguesa “está a melhorar com a implementação da tradução e interpretação do telejornal, por exemplo”.