À entrada da “Lonely Journey Loop”, é dado um novelo de lã aos participantes, a representação da linha da vida. Um performer que se encontra enrolado em fios, de olhos fechados, abre-os de repente e olha um participante nos olhos, enquanto imagens são projetadas atrás dele. Os participantes enrolam os fios à sua volta.

Ivo Brito, o performer da primeira estação explica que as projeções e os novelos ilustram a vida a passar à frente dos olhos e as suas adversidades. “Funciona, também, como um indivíduo contra a cidade, contra um sítio onde pode haver bastante solidão, onde não se conhece muitas pessoas”, diz, e acrescenta que a experiência foi tanto interessante como assustadora. “Mas a solidão é assustadora”, conclui.

É assim que começa esta performance experimental, dedicada a questões como a solidão e o percurso sobre a existência – desde a individualidade, marcada pela solidão, até ao trabalho em grupo, numa ideia de formação de comunidade – desenvolvida na unidade curricular “Multimédia em Performing Arts”, por grupo de alunos do Mestrado em Multimédia da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP).

Dividiu-se em três estações, com um fio condutor que aborda o indivíduo, o caos e a integração. O público está presente e não é passivo. Luís Mendes, um dos membros da produção da performance, refere precisamente que quem assiste também participa, “caso contrário não existe performance”.

“É quase uma passagem da solidão para caos”

Na segunda estação, o novelo dá lugar a uma venda nos olhos. Uma porta abre-se e os participantes são encaminhados no escuro até uma cadeira. Ouvem-se sussurros e passos e vêem-se luzes fortes, numa representação do caos, onde cada indivíduo ainda não sabe, mas está junto de outros.

Sem qualquer noção do espaço em si, todos acabam por participar, segurar lanternas, sussurrar e caminhar pela sala. O performer Miguel Marques explica o sentimento de introspeção presente nesta segunda fase, onde os participantes se apercebem que estão a agir em conjunto. “É quase uma passagem de solidão para caos”, refere.

Esta performance tem a necessidade de uma relação “mais tangível com a realidade”, explica Heitor Alvelos, docente da disciplina. O universo digital acaba por dar lugar ao que não pode ser substituído: o toque, o risco, a exposição. Rui Penha, também docente, reforça a ideia e refere que há cada vez maior presença de instalações artísticas sem qualquer tipo de componente tangível e a “prova de que isso se esgota em si próprio é que, cada vez que sai uma nova interface, as anteriores são automaticamente lixo, deixam de ser usadas”.

Uma estação com instrumentos de água

Na terceira e última estação junta dois tipos de performances, uma história narrada pelos participantes e sons que os inspiram a criação da mesma. Sentados no chão, os visitantes têm, à sua frente, um recipiente com água, no qual têm de tocar sempre que pretendem falar. Com esse toque, é criado um som.

Os instrumentos, criados por Rui Marques, funcionam todos a água: “No fundo, são umas panelas, uns conta-gotas, um pequenos recipiente de água”, diz. “Sempre que se toca com a mão na água, vai disparando um harmónico de uma nota e vão sendo criados ritmos aleatórios com as gotas”, acrescenta.

A performer Mafalda Barata é responsável pela criação de ilustrações, onde personifica as intervenções de cada participante. “Esta instalação é a inteligência coletiva em que, quando se está em grupo, consegue-se, pouco a pouco, sentir que se está em comunidade e se acaba por construir uma história”, explica. “Há aqui um trabalho conquistado que ajuda, inclusivamente, a desmentir aquele quase que pressuposto automático, nos dias que correm, de que quando falamos de performing arts temos que falar de interfaces digitais”, esclarece Heitor Alvelos.

A performance, que teve lugar na Academia Contemporânea do Espetáculo do Porto (ACE), será novamente exibida no Festival de Media Digitais Future Places 2013, em outubro, também no Porto.