Desinibição. Dir-se-ia que é um começo e uma razão para beber um copo, ou talvez mais, e para vencer a timidez. Com uma maior quantidade já se anda em “S” e a chave demora a entrar na porta.

São situações de uma noite de diversão, durante a qual o consumo de álcool em quantidades exageradas provoca a morte de células no nosso cérebro. Tal como o termo morte indica, é irreversível. Este efeito de morte de células é comparável aos efeitos também provocados pelas metanfetaminas.

Mas o que acontece exatamente no nosso cérebro e no nosso corpo quando bebemos álcool? O que nos faz estar descontraídos, o que nos altera as funções motoras ou o que dificulta o nosso tempo de reação e torna aconselhável não conduzir?

Comecemos por explicar que a forma como o álcool nos afeta vai depender de várias características, como a idade, o tipo de bebida e o funcionamento do fígado. O fígado é um dos órgãos mais importantes e, por isso, também dos mais afetados, por este consumo, uma vez que é graças a ele que são minimizados os efeitos no cérebro. Se o fígado funcionar corretamente vai sintetizar o álcool (etanol) em acetaldeído, transformando este último em acetato, através de duas enzimas que são o álcool desidrogenase e o acetaldeído desidrogenase. O álcool é também excretado através da urina e expelido também pelos pulmões, de onde sai através do cheiro.

Dez por cento do álcool chega ao cérebro para provocar danos

É possível dizer que 90 por cento do que ingerimos é metabolizado e só 10 por cento do álcool chega ao cérebro, no caso dos adultos. Na verdade, esta quantidade vai destabilizar o GABA, um neurotransmissor responsável por inibir grande parte dos neurotransmissores no cérebro e que se encontra presente em metade das sinapses, isto é, espaços de comunicação entre os neurónios. “O que o GABA faz é inibir os outros neurónios, fazendo com que haja uma menor libertação de outros neurotransmissores”, explica Teresa Summavielle, investigadora do IBMC.

Alterando este neurotransmissor, modifica-se a forma como todos os circuitos funcionam. “Quando inibimos algo que é inibitório, o que acontece quando o álcool chega ao cérebro é uma estimulação em alguns pontos deste órgão”, sublinha. Desta forma ficamos mais alegres e desinibidos.

“Há uma desregulação completa na forma como os neurotransmissores são libertados. Quanto maior a quantidade de álcool mais dramático será o quadro”, refere. O GABA regula neurotransmissores como a serotonina ou a dopamina, ambos responsáveis por sensações de prazer e ligados à felicidade.

A sucessão de acontecimentos quando bebemos vai depender da quantidade e da localização dos recetores que vão estar inibidos pela presença do álcool. O álcool afeta principalmente áreas do cérebro ligadas à formação de memória, tomada de decisões e de controlo de impulsos.

Da tolerância à sensibilidade

“Numa última fase, o que pode levar à morte é a inibição de uma área do cérebro que controla a função respiratória e cardíaca e portanto há uma paragem cardiorrespiratória”, alerta, no entanto, Teresa Summavielle.

O álcool provoca também consequências a longo prazo no corpo, dependendo da quantidade que é consumida. A cirrose hepática, doença que afeta o fígado, é uma das causas de morte de quem sofre de dependência do álcool.

É um processo que se desenvolve porque se cria uma tolerância, uma característica de uma dependência. “Quando começa a beber em quantidades consideradas significativas a pessoa vai precisar de uma quantidade de álcool cada vez maior para atingir o mesmo estado de embriaguez. Pode beber muito mais álcool que os outros e não mostrar logo efeitos exteriores”, sublinha. “Esta tolerância é acompanhada por uma perda de função hepática e a certa altura começa a reverter, porque não se consegue metabolizar o álcool e o fígado está cada vez mais incapaz. Assim, em vez de ser tolerante, um indivíduo fica mais sensível ao álcool e com uma quantidade muito pequena um alcoólico pode morrer”, acrescenta a investigadora.