O conceito de privacidade começou a desenvolver-se em 1890 e é uma interpretação do princípio da dignidade humana. Para Alexandre Sousa Pinheiro, professor na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (FDUL), que, esta quarta-feira, participou na conferência “Dados pessoais e privacidade – a redefinição da privacy“, na Faculdade de Direito da Universidade do Porto (FDUP), tudo começou com uma máquina Kodak, que ameaçava a privacidade, principalmente pela captação de imagens, já que quem era fotografado não sabia o que acontecia depois daquelas serem captadas.

Em 1905, num tribunal da Georgia, nos Estados Unidos da América (EUA), foi aplicado um processo por uma figura pública desportiva, cujas fotografias tinham sido utilizadas para uma propaganda de uma seguradora. Este foi primeiro caso jurídico de privacy, já que se considerou uma situação de ofensa à privacidade do indivíduo.

No final dos anos 60, segundo Alexandre Sousa Pinheiro, a privacidade ganha novos contornos e torna-se utilizável a nível da informação e do comportamento. Atos que correspondem à relação da pessoa com o seu corpo, como o aborto, os métodos contracetivos ou as relações homossexuais, passam agora a integrar o leque dos direitos de privacidade, contrariamente ao que foi dito em 1890, quando a privacidade pretendia, sobretudo, salvaguardar quem pertencia a uma aristocracia social que era incomodada pela imprensa.

A privacidade na Internet

Ex-membro da Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD), Alexandre Sousa Pinheiro acrescenta que “trabalhamos no risco tecnológico”, com a “Web 2.0”, onde o perigo e o desrespeito pelos direitos sociais fazem-se entre privados e não perante uma entidade. Os casos nas redes sociais não são notificados junto da CNPD, por se tratar de entidades consideradas pouco plausíveis. A atuação em plataformas como o Facebook passa, nas palavras do orador, pelo “tratamento dos dados” e por uma posição proativa na Internet.

Proteção de dados, um direito assegurado?

O ceticismo dos EUA perante a proteção de dados foi o ponto de partida para a discussão, na FDUP, deste conceito. Segundo Alexandre Sousa Pinheiro, os EUA não detêm, ainda hoje, uma entidade federal para proteger os dados dos cidadãos. O senado norte-americano chegou a recusar a criação de uma entidade de proteção de dados no país.

O professor universitário encontra na Alemanha da II Guerra Mundial o caso paradigmático de um país que procedeu à “invasão” de dados com o propósito de perseguir e expulsar pessoas do território. A questão do Estado Social foi referida como um exemplo representativo da atualidade, em que a informação pessoal é a todo o momento alvo de interferência, seja por entidades públicas ou privadas.

Associado ao conceito de proteção de dados, os direitos sociais e o princípio da dignidade humana assumiram-se como pontos fortes na maioria das Constituições dos países democráticos. Alexandre Sousa Pinheiro reforçou que o termo da “dignidade humana” adveio da filosofia kantiana como uma resposta à afronta do pensamento positivista, propagado durante a guerra.

A autodeterminação informacional foi apontada como uma forma de controlar a informação veiculada. O “princípio da finalidade” será o instrumento e o elo de conexão que permitirá esclarecer, junto do titular dos dados, quem atua e para que efeitos é utilizada a sua informação pessoal.