Dia 31 de janeiro. A data pretendia ser simbólica. Em 1891, os revolucionários desejavam instituir os valores republicanos e democráticos em Portugal. Falharam. Volvidos 123 anos, o LIVRE, o novo partido português, quer ser um agente ativo no reforço dos ideais democráticos. Mas será que o desfecho pode vir a ser o mesmo de 1891? “Viemos ao Porto a 31 de janeiro lembrar pessoas que arriscaram a vida e a liberdade pelo país. E que falharam. Mas um falhanço honroso, vergonhoso teria sido não tentar”. É esta a postura do LIVRE na voz de Rui Tavares, um dos principais impulsionadores da ideia.

Para o eurodeputado (eleito nas listas do Bloco de Esquerda que, por divergências com o partido, se tornou independente), este congresso fundador significa o início da intervenção do LIVRE na vida pública: “Agora começa a sério com apresentação de propostas para o país, falar claro, dizer algumas verdades, verdades duras. Algumas começámos a dizê-las à Esquerda, as verdades duras começam a por ser ditas em casa. A Esquerda tem de acordar”.

A renovação da postura política de Esquerda é um dos objetivos do LIVRE. “Nós não sairemos do buraco político e económico em que estamos a fazer as mesmas coisas que a Esquerda faz há uma série de anos. Nós sairemos mudando de hábitos, quebrando alguns tabus em relação à governação e, para isso, o LIVRE está preparado para começar a dizer que o voto e a participação útil é no LIVRE”, conta Rui Tavares ao JPN. Apesar das críticas à postura dos partidos de Esquerda nos últimos anos, Rui Tavares lembra que o LIVRE faz parte da família da Esquerda. “Não tentem excluir-nos. Lutaremos com unhas e dentes para não sofrer novos processos de exclusão e lidaremos com respeito, com abertura e cordialidade com os outros partidos de Esquerda”, avisa o deputado.

Um partido com críticos “oficiais”

Das ideias discutidas nos dois dias de congresso destacam-se a introdução da figura do crítico do partido e uma plataforma de troca de impressões, o “Bazar de Ideias”.”Provavelmente, somos o primeiro partido do mundo que tenha críticos que possam criticar os seus textos e que essas críticas são integradas, não têm de ser obedecidas, mas são integradas, são lidas e são respeitadas”. diz Rui Tavares ao JPN. No congresso fundador, as formas de participação política e de integração de membros do partido e da sociedade civil foram alvo de amplo destaque. Foi apresentado o “Bazar de Ideias“, uma plataforma online, de livre acesso, que permite a partilha e o debate de ideias, questões ou preocupações.

O que aconteceu no congresso fundador

Os 750 membros e apoiantes do LIVRE tiveram, no passado fim-de-semana, a primeira oportunidade para se reunirem. Os que se deslocaram à Biblioteca Almeida Garrett, no Porto, elegeram os três principais órgãos do partido: o Grupo de Contacto, que é “o órgão executivo do LIVRE, estando responsável pela gestão quotidiana do partido e pela coordenação dos núcleos, os círculos temáticos e os grupos de trabalho”; o Conselho de Jurisdição, que é “o órgão do LIVRE responsável pela interpretação e aplicação internas da lei, dos estatutos e regulamentos e pela fiscalização e controlo internos da gestão financeira do partido” e a assembleia, “o órgão máximo do partido”.

Além dos corpos eleitos foram aprovadas as moções estratégicas individuais, propostas pelos membros do LIVRE e apresentadas a votação, desde que com um mínimo de cinco subscritores, e ficou também definida a moção estratégica para as eleições europeias que, caso o Tribunal Constitucional oficialize a constituição do partido, servirão de base para a candidatura do LIVRE às eleições do próximo mês de maio.

“Só em dois meses já criámos impacto”

No rescaldo do trajeto até agora percorrido, Rui Tavares afirma: “O meu papel ad hoc (para isto) acabou. Quando o partido ainda não era partido precisava que lhe dessem voz. Eu servi para isso. Agora, a partir do congresso fundador, sou um membro como os outros”. Para o eurodeputado, agora eleito para o grupo de contacto do LIVRE, o balanço é positivo: “Muitas das coisas que dissemos entraram no debate público. Tentámos de tudo: manifestos, congressos, petições, comícios… Teve algum efeito, mas não abalou as placas tectónicas da política. Um partido é uma ferramenta que já permite abalar essas placas tectónicas. Só em dois meses já criámos impacto”.

A declaração de princípios, os estatutos, o programa político e as mais de 8.900 assinaturas recolhidas para a inscrição do LIVRE como partido, serão entregues, esta terça-feira, junto do Tribunal Constitucional.