O ano passado, 2013, foi o teu último como júnior e aquele em que apostaste na profissionalização. A transição foi mais difícil do que esperavas?

Admito que foi complicado, não foi um ano fácil. Eu estava à espera que assim fosse, mas não sabia ao certo o quão difícil iria ser. São tipos de torneios diferentes, adversários muito diferentes e nem sempre são as mesmas coisas que decidem os jogos como era nos juniores: aqui é mais a experiência. A diferença de idades é muito grande e torna as coisas mais difíceis.

Pegaste pela primeira vez numa raquete aos sete anos, começaste a dedicar-te só ao ténis aos dez e aos 14 começaste a empenhar-te a sério para teres bons resultados. Sentes que terias beneficiado se tivesses começado na modalidade mais cedo?

O meu percurso, até agora, tem tido os timings certos. As decisões, que neste caso foram do meu treinador, o Pedro Felner, em relação à carga horária, têm sido as indicadas. Com dez, 11 anos treinava todos os dias, praticamente, mas apenas só da parte do dia. A partir dos 13, 14, é que comecei o treino bidiário, praticamente, sempre.

Qual a rotina de um jogador profissional? Desde que acorda até que se deita?

Quando estou nas Caldas a treinar, treino das 9h às 11h30 no campo. Depois das 11h30 até às 13h, físico, no ginásio. Depois tenho uma hora, hora e meia, duas horas para almoçar e treino novamente das 15h até 17h, à tarde. Depois fico o resto do dia disponível para relaxar e estar com os meus amigos. Quando vou para fora, depende muito dos torneios. Antigamente, nos juniores, nós éramos praticamente sempre os mesmos que íamos aos torneios. Agora o número parece que triplicou ou quadruplicou e a maior parte dos jogadores que vejo nos torneios nem os conheço. Por isso, quando estou fora, a maior parte dos amigos com que me dou são os que vêm comigo para os torneios ou os portugueses que eu conheço.

Quem é Frederico Silva?

Alcunha: Kiko

Data nascimento: 18 março 1995

Naturalidade: Caldas da Rainha

Treinador: Pedro Felner

Ídolos de infância: André Agassi e Roger Federer

Melhor ranking ATP: 575.º (3 março 2014)

Melhor ranking ITF (sub18): 6.º (2 janeiro 2012)

Que balanço fazes do ano de 2013?

Não foi um ano propriamente fácil, comecei bastante mal com aqueles dois meses que tive parado com a operação que fiz ao joelho. A partir daí, o ano não correu da melhor forma, mas, no geral, acho que depois consegui dar bem a volta. O meu objetivo, no início, era acabar no top 750, por isso, posso dizer que foi bom.

Ficaste desapontado com a tua prestação a singulares nos teus últimos Grand Slams de categoria júnior?

Confesso que estava à espera de ter tido melhores resultados em singulares, mas também não é coisa que me tenha deitado muito abaixo ou me tenha preocupado muito. Os torneios de seniores são completamente diferentes dos juniores e, visto que não estava a jogar muitos torneios juniores, já não estava habituado àquele ambiente. Não consegui jogar o meu melhor ténis e, a este nível, depois nota-se muito.

O que achaste do impacto mediático que teve o facto de teres sido o primeiro português a conquistar um título de Grand Slam na história?

Tento não pensar muito nisso, mas pronto, está inerente. Ter sido o primeiro português, de certa forma, faz as pessoas pensar que possa vir a ser melhor do que os outros, mas foi a pares e não tem assim tanto significado para mim como se tivesse sido em singulares, embora não tenha sido nada fácil. Tento não pensar muito nessas coisas das pressões e só que no posso fazer para melhorar todos os dias. Quando ganhei o meu segundo Grand Slam (em Roland Garros, 2013), senti que houve um grande impacto na imprensa. Foram alguns jornalistas ao aeroporto quando cheguei, tive bastantes convites para entrevistas, não só para jornais, mas também para a televisão. Nisso, de facto, senti uma grande diferença.

Lado a lado com os ídolos

Em outras entrevistas, dizes que o teu sonho é seres top 10 mundial. Já treinaste com alguns dos melhores do mundo, como Roger Federer, Stanislas Wawrinka e chegaste a fazer pré-temporada com Rafael Nadal. Depois dessas experiências, hoje sentes que é possível chegar um dia a esse nível?

Acho que sim. Se tivermos noção das dificuldades que temos, das que vamos ter e do percurso que vamos fazer, acho que se torna mais fácil enfrentar cada dia de treino, cada jogo, cada derrota, cada vitória. Ter tido a oportunidade de treinar com o Nadal aqueles dias todos em Maiorca foram bons para isso: para ter noção do quão difícil vai ser chegar até ao nível deles. Com o Federer como com o Wawrinka, tive oportunidade de estar um bocadinho, antes de jogos tão importantes, também deu para perceber as rotinas deles antes dos jogos, uma coisa que, para nós, que ainda somos novos, é bastante importante.

Apesar destas vitórias, consideras que seres vice-campeão da Europa de sub18 foi a maior conquista da tua carreira, até hoje. Porquê? Sentes que precisas de te afirmar ainda em singulares?

Não é uma questão de afirmação, também tenho tido bons resultados em singulares, mas porque a minha prioridade sempre foi os singulares e o treino que faço todos os dias é dedicado para melhorar nos singulares e não nos pares. Todas as minhas vitórias em singulares têm mais significado do que as minhas vitórias em pares.

Como explicas que tenhas tido mais resultados em pares do que em singulares?

A competição de pares é uma em que acaba por ser mais fácil ter bons resultados, porque é sempre uma incógnita. Depende muito de nós, mas depende também muito dos adversários. Nos singulares, as pessoas normalmente estão mais focadas, estão ali a 100% para ganhar. Os pares acabam por ser um complemento para toda a gente. Quando somos eliminados em singulares, os pares, por vezes, já não nos dizem nada. Então quem tiver mais força de vontade de ganhar, acaba por ganhar. Por isso é que eu tenho tido bons resultados: tenho visto os pares como uma forma de continuar a treinar e evoluir, porque são mais horas que continuo dentro do campo e tento sempre aproveitar essas horas, mesmo nos jogos de pares.

Que balanço fazes do ano de 2013 para o ténis português?

Acho que foi um ano espetacular, parece-me que dos melhores que houve para o ténis português há já algum tempo. Subimos de divisão na Taça Davis, tivemos o João Sousa a ganhar um torneio ATP 250 e a entrar no Top 50, a Maria João [Koehler] tem feito bons resultados, o Gastão [Elias] também tem feito grandes resultados em torneios challengers, eu também tive alguns bons resultados e há outros juniores que começaram agora a jogar torneios ITF e a ter bons resultados.

“Estava a ver o jogo [do João Sousa] e parecia que estava mais nervoso do que quando sou eu a jogar”

A vitória de João Sousa em Kuala Lumpur

Conheces pessoalmente o João Sousa? Que opinião formada tens sobre ele?

Conheço o João, dou-me bem com o João. É uma pessoa espetacular. Acho que os resultados que ele tem tido são completamente merecidos. Tem tido um esforço que muita gente não tem noção: esteve em Espanha muitos anos sozinho e não tem tido certamente uma vida muito fácil, longe da família e dos amigos de Portugal. Acho que agora que ele está no top 50 tem ainda capacidade de ter um melhor ranking.

Onde estavas aquando da vitória dele em Kuala Lumpur?

Estava em Espanha, num torneio em Barcelona, e estava a acompanhar o torneio dele pela Internet, mas a final consegui ver em direto, encontrei um live streaming. Estava a ver o jogo e parecia que estava mais nervoso do que quando sou eu a jogar. E claro, quando ele ganhou fiquei muito contente. Lembro-me bem, estava eu e o Pedro Felner e ficámos os dois bastante contentes.

Que importância teve a vitória do João para a visibilidade do ténis em Portugal?

Sem dúvida, esta vitória do João já teve e vai continuar a ter muito impacto no ténis. Só o facto de ele ter aparecido inúmeras vezes na televisão, em telejornais, em entrevistas e em inúmeras coisas, sem dúvida que isso foi bastante bom para o ténis.

João Sousa é o primeiro português a entrar no top 50 do ténis mundial. Sentes-te com capacidade para, no futuro, igualares o feito dele e até superá-lo?

Tenho a noção que não é nada fácil, que é um caminho longo e bastante duro por percorrer, mas é para isso que treino todos os dias. Os meus objetivos são também os mesmos dele: entrar no top 100, depois no top 50 e ir sempre evoluindo. Não digo que vou conseguir, mas digo que vou fazer o máximo para garantir o mesmo.