Corria o verão de 2013 quando Priscilla Fontoura, recém regressada de um intercâmbio em Tel-Aviv, foi convidada pelo pai a assistir à inauguração de uma instalação na velha casa de Aristides de Sousa Mendes. Como sucede com os que se dedicam ao vídeo, Priscilla fez-se acompanhar pelo seu material de filmagem quase que por reflexo.

Foi então em Cabanas de Viriato, local da arruinada casa de Aristides de Sousa Mendes, que a realizadora encontrou o arquiteto norte-americano Eric Moed, “bisneto de alguém a quem Aristides passou um visto”. “Decidiu que não havia algo tão direto e interno, para ele, como apontar para a existência de uma causa” – sendo essa causa o estado de abandono e precariedade da casa do celebrado diplomata português.

Mas Eric não era o único descendente de pessoas assistidas por Aristides presente na instalação. As entrevistas sucederam-se e o pano de fundo da instalação, composta por imagens dos sobreviventes da perseguição, ajudou a dar forma a um documentário que Priscilla elaborou – “I Am Alive Thanks to Aristides de Sousa Mendes” (ver trailer em baixo) para “consciencializar as pessoas do abandono, não só da casa, mas também da memória das ações” do cônsul de Bordéus. Em duas semanas, o documentário estava pronto, mas faltava o segundo salto, tão difícil no contexto do cinema em Portugal: a distribuição.

Passar a palavra

Foi em brainstorm com André Vieira, a outra metade da Lula Gigante Produções, que surgiu a ideia de obter financiamento para a distribuição através de crowdfunding. Mas a verdade é que se tratou de um caso atípico, visto que o financiamento foi procurado para um produto já acabado. Ainda assim, a campanha no Indiegogo chegou a bom porto.

Desta experiência, Priscilla retira valor, sobretudo da dinâmica que se gerou enquanto os fundos eram angariados: “Enquanto as pessoas contribuíam, algumas enviavam e-mail a procurar saber mais sobre o tema, mas quando a campanha acabou houve cada vez mais contactos de pessoas a dar ideias sobre como difundir o projeto”, num “diálogo em tempo-real que nunca teria acontecido sem o crowdfunding“, revela, ao JPN.

Uma dessas pessoas foi um descendente canadiano de alguém assistido por Aristides de Sousa Mendes, que fez questão de se reúnir com Priscilla e o pai a propósito do documentário. Desta vez, a sugestão foi não apenas para procurar mais distribuição para o documentário já elaborado, mas para pensar num novo documentário, mais ambicioso, a ser realizado. A ideia já tomou raíz nos planos da realizadora.

Outra pessoa que também mencionou essa possibilidade foi Olivia Mattis, diretora da Sousa Mendes Foundation (e descendente de 12 familiares salvos pelo cônsul). O grupo de fundações com o nome de Aristides de Sousa Mendes (uma em Portugal, uma em Nova Iorque e Canadá, e outra em Bordéus) foi instrumental na ajuda à distribuição. Assim que ficaram prontas as cópias em DVD, a Sousa Mendes Foundation foi a primeira a assistir com exibições em Nova Iorque nos seus próprios espaços. Neste momento, há perspetivas de o documentário entrar em circulação em algumas escolas nos Estados Unidos.