São ainda 7h da manhã e já não falta animação em plena Serra de Fafe. O termómetro marca zero graus e por entre gigantes aerogeradores, tendas. Muitas tendas. Umas mais artesanais que outras, mas todas servem o seu propósito. Há de tudo: roulottes de cachorros quentes, discotecas ambulantes, sofás, carros de todo o tipo, motos e, claro, álcool. E a primeira passagem dos carros é só às 14h15.

“É um acampamento selvagem, mas num bom sentido”, diz Sónia Lopes, aficionada dos ralis desde pequena. Acampou no dia anterior junto ao salto da Pedra Sentada com a família (marido e filho, também aficionados) para ver o espetáculo. Dormir é que foi mais complicado: “É muito barulho”, diz a criança – mas para ver o rali vale a pena. “É uma noite”, garante a mãe.

WRC no Norte

O último ano em que Fafe viu as provas oficiais do Campeonato do Mundo de Ralis (WRC) foi 2001. Depois, principalmente por razões de segurança, Portugal deixou de ter rali no WRC, voltando em 2007, mas no Algarve. Em Fafe, as normas de segurança são integralmente cumpridas pela organização e público, que sabe que precisa de as cumprir se quer o WRC de volta. No norte vive-se “mais intensamente a paixão” dos ralis, diz Sónia Lopes. “Foi com muita tristeza que vimos o rali abandonar o norte”, mesmo que ainda exista este Fafe Rally Sprint, um evento de exibição. Fafe “é liberdade, é natureza, e é o convívio, por isso é que o rali do norte é diferente dos outros”. Juan Souto considera também que se o rali vier para o norte captará mais público vizinho, “sobretudo da zona da Galiza e Astúrias”.

O Fafe Rally Sprint é uma excelente oportunidade de negócio para Amadeu Gonçalves, vendedor de merchandising oficial das equipas. “Às vezes dá para a despesa, outras vezes não dá. Hoje a despesa é o lugar.” Quem quer fazer comércio tem de alugar o seu espaço, mesmo no meio do monte. Chegaram na sexta, um pouco depois das 8h da manhã.

António Macedo é um dos muitos responsáveis pelas roulottes de venda de comida. Marcou o seu lugar na “sexta feira às 4 da manhã”, mas nem o facto de ali estar há muitas horas lhe retira algum pessimismo. No ano passado já tinha feito “mais mil euros” do que na mesma altura deste ano. “Toda a gente traz farnel, toda a gente traz assadores, toda a gente vem de garrafão às costas”, lamenta.

É uma festa portuguesa, com certeza. Mas longe de ser só isso. Muitos são os que atravessam o rio Minho para o lado de cá e fazem deste dia uma autêntica cimeira galaico-portuguesa. O sotaque minhoto mistura-se com o galego e os impropérios saem naturalmente das bocas cheias de comida. Não há desentendimentos, aqui todos falam o idioma dos ralis, e o que mais querem ouvir é mesmo o barulho dos motores dos bólides. Ainda faltam umas horas.

Juan José Souto vem para ver o representante espanhol Dani Sordo, que pilota um Hyundai. “Gosto de automobilismo há muitos anos e os ralis eram uma das poucas modalidades que me faltava ver”, diz. O ambiente é “genial, fora do normal”, nada a ver com o “campeonato de Espanha”, por exemplo.

Ao contrário do que acontece com Juan, grande parte das pessoas não parece estar muito informada sobre quem são os pilotos ou sobre a atualidade do campeonato mundial de ralis. Mas campeão do mundo é campeão do mundo, e o nome Ogier é o que mais se ouve na serra, pronunciado num português afrancesado.

Primeira passagem, 14h15

À medida que a hora de partida se aproxima, a zona do Confurco está hiperpovoada. O Confurco é uma zona mista, de asfalto e terra, em que os carros deslizam e dão espetáculo. É recomendável ficar mais acima, mas mesmo assim dá para estar bem perto do troço. O helicóptero da transmissão televisiva começa a rondar. Falta pouco tempo para a festa começar. O público aquece, os motores também.

Finalmente, depois de muitas horas de espera, vêem-se os carros a descer a serra, ainda ao longe. O público observa a velocidade dos carros, a perícia dos pilotos, e os barulhos dos motores ouvem-se de bem perto. Alguns pilotos até acenam e buzinam, mesmo a altas velocidades. Alguns sons inconfundíveis são os do Skoda do campeão nacional Ricardo Moura, ou os mais famosos Citroëns, Fords e, claro,o Volkswagen do campeão mundial Sébastien Ogier. A novidade deste ano foi mesmo o Hyundai de Dani Sordo.

Resultados

1 – Ogier/Ingrassia, Volkswagen Polo R WRC, 03.40.0

2 – Tänak/Molder, Ford Fiesta RS WRC, 03.40.5

3 – Sordo/Martí, Hyundai i20 WRC, 03.42.2

4 – Østberg/Andersson, Citroën DS3 WRC, 03.45.0

5 – Ketomaa/Lindström, Ford Fiesta R5, 03.49.3

Segunda passagem, 15h15

Na segunda passagem, já no Confurco propriamente dito, há muito mais público. No asfalto estão escritos os nomes de antigos heróis dos ralis como Henri Toivonen, Richard Burns ou o espetacular Colin McRae. O escocês deixou fãs em todo o mundo, e ainda hoje são visíveis bandeiras escocesas em todas as provas do mundial. Fafe não foi exceção.

Aqui, as reações do público são mais audíveis. Há gaitas, sirenes, buzinas, palmas e até fogo de artifício. Tudo serve para fazer barulho e homenagear os mestres dos ralis. Enquanto a ação dos carros acontece, outros aproveitam a ocasião para subir e descer a serra num motocross arriscado.

O último piloto passa e há uma grande movimentação de público, em todas as direções, para ver o espetáculo de outro sítio.

Terceira passagem, 16h40

De regresso ao local de partida, o salto da Pedra Sentada, mal há espaço para circular. A concentração de pessoas é muito maior do que pela manhã, como esperado. Longe do salto mas perto das emoções, os flashes dos muitos fotógrafos amadores presentes fazem-se ouvir. As reações do público são distintas de acordo com os saltos, se maiores ou mais pequenos.

Ogier é o último a saltar e segundos depois dá-se um êxodo em massa para os parques de estacionamento improvisados. Há sorrisos, mas muito cansaço. E em muitos casos uma longa viagem de volta a casa. A cama espera pacientemente.