A frase não é absoluta, mas não nos enganemos: Nuno é ateu. O seu caminho é o da dúvida. Criado numa família de matriz católica, as primeiras interrogações vieram, aos 12 anos, quando começou a ler a Bíblia: “Quando comecei a ler a Bíblia deparei-me com coisas muito graves como a misoginia, a homofobia, os valores distorcidos em relação ao porquê de se fazer a guerra, a convivência com a injustiça, nomeadamente no Novo Testamento, a convivência com a desigualdade social e a desmotivação para que se crie um Mundo melhor na Terra e se espere pacientemente para encontrar um mundo perfeito no céu”.

Lançadas as perguntas, seguiu à procura das respostas. Aos 18 anos assaltou-lhe a vontade de se definir. Seria agnóstico? Seria ateu? A dúvida foi-lhe despoletada enquanto lia “A Aparição”, de Vergílio Ferreira, ao mesmo tempo que estudava a Teoria da Evolução. “Muitos criacionistas gostam de dizer Teoria da Evolução como se fosse algo estapafúrdio, como se fosse só uma teoria que uns homens se lembraram. É uma teoria. Tudo em ciência é uma teoria. Mas uma teoria mais do que comprovada. É como a gravidade. Também é uma teoria, mas se eu agora te mandar uma pedra à cabeça, vai cair-te na cabeça e vai-te doer”.

As crenças de um ateu

Nuno define o seu caminho como “um processo natural”. Rejeita o absolutismo. Para ele, não houve um momento específico de definição. Houve a evolução do seu pensamento. Para ele não existem certezas. Existem dúvidas. “Não é um dogma para mim. Se me provarem amanhã que Deus existe, eu acredito. Dogma seria se Deus descesse à Terra e eu o negasse. Isso é ser religioso”.

Nas discussões entre teístas e não teístas, há uma pergunta que, quase sempre, surge: “Um ateu acredita em algo?”. Nuno é um homem de crenças, mas nenhuma delas de origem religiosa ou espiritual: “Eu acredito em coisas, obviamente. Eu acredito, por exemplo, que o método científico é o melhor método para aferir a verdade. Acredito, porque não tenho a certeza absoluta de que isso seja verdade. Isso é crença. Apesar das evidências empíricas que me levam a crer que estou certo, amanhã podemos inventar um método melhor”.

A relatividade, a discussão e a contestabilidade são alguns dos pilares basilares que levam Nuno a definir-se como um “ateu com pensamento científico”. É aqui que se distancia da fé. “Se eu provar a um teísta que Deus não existe, ele vai, provavelmente, continuar a acreditar. A fé é uma crença inexplicável. A fé, para os crentes, é sagrada. É uma coisa imutável que não se pode pôr em causa, independentemente das provas empíricas que existirem. As crenças que eu tenho são providas de algum materialismo”.

Religião, um problema?

Nuno rejeita a fé, mas respeita aqueles que a decidem abraçar. “Não tenho problema nenhum com as pessoas que acreditam. Acredito que é possível acreditar sem influenciar, com isso, negativamente, os que os rodeiam”. É na religião organizada que Nuno deteta graves problemas que sente ser seu dever combater. Por isso, assume-se anti-religião: “A religião organizada, neste momento, está, em termos de valores, desfasada no tempo. A nossa sociedade já deu mais passos numa atitude mais liberal do que as religiões. Os jovens afastam-se mais, porque os seus valores do dia-a-dia não se enquadram nos valores e dogmas da religião organizada”.

A questão da fé devia estar presente nas escolas desde que lecionada numa perspetiva histórica, social e cultural. É esta a convicção de Nuno. Mas o jovem não acredita que essa ideia seja concretizável: “Na maioria das religiões, principalmente as monoteístas, o conhecimento surge como pecaminoso e, nesse sentido, é prejudicial ensinar outras perspetivas. Quando tens uma perspetiva mais abrangente do Mundo, tu questionas e isso vai contra os ensinamentos da maioria dessas religiões”.

O que move o mundo?

O mundo de Nuno não tem certezas e vive alimentado pela dúvida. Mas o que move, para o jovem, este mundo de todos? “As Leis Naturais”. Para ele, a vida é uma passagem: “Nós temos a noção de que somos uma migalha no meio desta galáxia. Seria muito arrogante, da nossa parte, achar que existe um ser superior que fez esta coisa toda só para nós”. Por todas as mutações, transformações e dúvidas, o caminho não é certo. O caminho de Nuno começou e provavelmente terminará da mesma forma: com um grande ponto de interrogação: “O mundo muda. Nós mudamos. Aprendemos mais coisas, ficamos mais sábios, mais cultos e há coisas que deixam de fazer sentido. Há uma progressão. Por que não temos dogmas e por que havia de criar esse dogma imutável de Deus?”.