O que é ser Designer de Interiores?

Para mim o Design de Interiores é sobretudo uma disciplina de fronteira. Estamos na nossa disciplina mas conseguimos tocar em outras, como a Arquitetura e a Arte, mas o nosso espaço mesmo é o espaço de habitar. Nós fazemos vários tipos de espaços, desde exposição até hotéis, espaços exteriores e eventos. Mas acho que as pessoas não têm bem noção do que é o Design de Interiores. Se for uma pessoa mais velha, eu digo que trabalho o espaço e elas dizem ‘ah és decoradora’. Mas não tem nada a ver! A decoração faz parte do Design de Interiores, mas é muito diferente! Nós mexemos em paredes, abrimos espaços, transformamos habitações em museus… Ou seja, nós temos de trabalhar também as artérias que a Arquitetura nos dá. Mas as pessoas não entendem isso, acham que nós chegamos, metemos umas cortinas e está. Eu admito que algumas empresas funcionam assim e é frustrante, porque treinamos durante anos para conseguirmos modificar um espaço e chegamos às empresas e não exercitamos o que aprendemos.

Acha que esse desconhecimento resulta em falta de procura?

Eu acho que a procura do Design de Interiores está a aumentar, e o cenário é contraditório por isso. A situação é: ou estamos em crise ou o Design é o futuro. Apesar de haver mais procura, as pessoas continuam sem entender o que é o Design de Interiores. Isto é, usam o Design de Interiores apenas para decoração, dizem as cores que gostam, a casa que têm, os gostos pessoais e ignoram a reabilitação do espaço. Além disso, as pessoas que normalmente procuram o nosso trabalho são pessoas com dinheiro. Acho que internacionalmente já é diferente, sobretudo na Escandinávia. Sinto que eles, desde muito cedo, entenderam o que era o Design e trabalharam-no, mesmo em termos históricos, e aqui não.

Como é que surgiu a paixão pelo Design de Interiores?

Os meus pais sempre introduziram a arte e ao desenho na minha infância. O meu pai gostava muito de náutica, de fazer barcos em miniatura, e eu sempre tive contacto com a arte e o trabalho manual. Sempre tive esse background artístico. Mas quando cheguei à fase de escolher um curso para a faculdade entrei em conflito, porque não sabia se queria ir para Arquitetura, por ser uma área um pouco fria. Mas entretanto, surgiu a ESAD onde no primeiro ano tínhamos a possibilidade de trabalhar em várias áreas. Por exemplo, um dos trabalhos que tivemos foi criar mobiliário para um antiga escola. Deram-nos um quarto com uma janela e uma porta e tínhamos de criar tudo o resto. Acho que foi nesse momento que percebi que queria mesmo fazer isto.

Os seus trabalhos são à medida do cliente ou pode ser o quão criativa quiser?

No contexto da faculdade, apesar de termos um cliente, o nosso gosto pessoal acabou por dominar, porque não era real. No design de interiores é fundamental o papel do cliente, mas também temos de equilibrar com o que realmente fazemos. Mas olhando para o meu portfólio no geral, eu gosto de ligar a arte e as experiências ao espaço, gosto da mistura de áreas, de criar uma identidade total para o espaço.

Ano do Design Português

No contexto do Ano do Design Português, o JPN apresenta, neste mês, todas as semanas, uma entrevista a um jovem designer português:

Qual é o seu processo de trabalho, o processo criativo?

Primeiro temos um espaço para trabalhar. O cliente define mais ou menos o estilo que pretende e nós temos de articular com a Arquitetura do espaço, temos de estar aptos e criar um ou outro pormenor que faça a diferença. Penso que é por isso que as pessoas nos contratam, porque eles [clientes] poderiam pegar num tapete, comprar algumas coisas no IKEA e mudar o espaço, mas acho que procuram estética e certos pormenores que nós já temos interiorizados. Temos então o espaço, o plano funcional que o cliente nos dá ou que articulamos com ele, gesticular um conceito e o ambiente que se pretende e fazer experiências em maquetes. Através do trabalho na maquete, do plano funcional e dos desenhos técnicos, nos temos de fazer o 3D e por fim, a parte da construção.

Há muita procura em Portugal de designers de interiores?

Em Portugal está difícil, mas surpreendentemente os africanos estão a dominar. Tenho várias colegas a trabalhar em projetos para africanos. Lá fora parece que estão todos à nossa procura. Apesar que querer arranjar trabalho aqui em Portugal, o meu objectivo é ir para fora no prazo de três anos, não por uma questão só de crise, mas também para viajar e conhecer outros sítios. Talvez para Londres, que neste momento está a oferecer oportunidades de emprego.

Quais são os planos para o futuro?

Apesar de ter muitos sonhos, a realidade acaba por deitar abaixo muitos deles. Neste momento vou defender a tese, em setembro, e entregar a final em outubro. E em novembro tenho de ir à Holanda ver o projeto [que ganhou o prémio da Euramax] feito.

Acha que é possível ganhar a vida como Designer de Interiores, seja em Portugal ou no estrangeiro?

Eu acho que lá fora há mais possibilidades, mas sim, penso que é possível. No meu caso, como também gosto de outras áreas, se me dessem a possibilidade de trabalhar em outra coisa eu também aproveitava. O problema é que falta darem-nos oportunidades. Por exemplo, eu mandei um e-mail para uma revista a perguntar se poderia ser colaboradora e não me responderam, mas quando falei para publicitar a questão de eu ter ganho na Euromax, já estavam interessados. Ou seja, eles dão oportunidades consoante o beneficio deles. Não pensam que há designers novos com capacidades mais avançadas, com especialização em outros programas que eles não tinham. As pessoas que já trabalham na área há mais tempo subestimam-nos e isso é muito irritante.