A Associação Nacional de Investigadores em Ciência e Tecnologia (ANICT) tem uma proposta para a criação de um “Estatuto do Trabalhador de Investigação Científica”, com a “Reestruturação da Carreira de Investigação”.

De modo a agradar aos investigadores e a tornar possível a contratação pelas instituições, o documento já elaborado, “resultado de uma proposta inicial da direção da ANICT”, “será sujeito a discussão em duas fases”.

1. Dados

“Para averiguar quais as necessidades do sistema científico nacional, em termos de recursos humanos, a ANICT lançou um questionário aos seus associados, de 8 de agosto a 7 de setembro de 2014. 97% dos inquiridos considera justo que os atuais bolseiros não estudantes devem usufruir de um contrato de trabalho; 93% dos inquiridos considera importante a contratação de investigadores que pretendam tornar-se independentes; 86% considera importante a contratação de investigadores doutorados não independentes e/ou não doutorados, para execução de tarefas experimentais”.

A primeira, passou pelo pedido de pareceres de instituições como a Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT), o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP) ou a Federação Nacional dos Professores (FENPROF), assim como às reitorias das universidades portuguesas. A segunda, iniciada esta quarta-feira, contempla apresentações e discussões públicas do documento. Depois deste processo, este será alterado e aprovado por voto eletrónico pelos associados da ANICT e só depois divulgado às entidades competentes.

Na proposta inicial, sugere-se que sejam “considerados como trabalhadores científicos todos os indivíduos que desenvolvam atividades de investigação não conducentes a qualquer grau académico”. “Atualmente, a lei portuguesa divide os investigadores científicos (não docentes) em duas categorias”: os contratados e os ainda “indevidamente” considerados bolseiros, que representam a grande maioria.

Estatuto de bolseiro de investigação deverá ser “cingido a estudantes do ensino superior”

“Na opinião dos membros da ANICT (62%), continua a existir lugar ao estatuto de bolseiro de investigação, mas este deverá ser exclusivamente cingido a estudantes do ensino superior”. Os restantes investigadores, desempenhando efetivamente trabalho científico, “devem ser considerados trabalhadores e não estudantes”, lê-se no documento.

Para além disto, “devido às particularidades da carreira de investigação, esta deve ter menos paralelismos à carreira docente” e ao invés de bolsas, “de forma a permitir uma estabilidade sustentável, a nova lei deverá enquadrar uma tipologia de contratação a termo certo (até cinco anos)”. A renovação também deve ser assegurada, “caso os objetivos propostos tenham sido cumpridos”.

2. Bolsas vs. Contratos

“A transformação das bolsas de investigação em contratos de trabalho a termo faz todo o sentido. No entanto, tal só será aceitável se forem mantidos os valores do rendimento mensal, pois uma diminuição de 20% é excessiva. Ainda mais porque os valores das bolsas não são atualizados há mais de uma década”. Um estudante de doutoramento, em Coimbra, em comentário ao inquérito realizado pela ANICT.

A realidade das bolsas é encarada, assim, como “uma situação de grande injustiça social” e instabilidade para uma classe que representa “a verdadeira força motriz dos grandes avanços verificados na ciência em Portugal, nos últimos anos”, afirma a ANICT.

Segundo um comunicado da associação um inquérito (ver caixa 2.), ao qual responderam 344 investigadores, revela que “96% dos investigadores científicos que usufruem de bolsas, preferem perder entre 10 a 21% do seu rendimento líquido anual, de forma a verem dignificado o seu trabalho, materializado na constituição de um vínculo jurídico-laboral com as instituições onde desenvolvem as suas actividades de investigação”.

Também a pensar nas instituições, e “de forma a incentivar a contratação de investigadores” por parte destas, a longo prazo, propõem que o salário seja “dividido em três componentes”: base e, quando apropriado, com complementos mensal letivo e anual de gestão de projetos.

Da proposta, que pode ser lida online, fazem ainda parte sugestões sobre os processos de contratação, avaliação e renovação contratual. Sugestões essas discutidas esta quarta-feira na Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto, que acolheu a primeira discussão pública do documento. Estas discussões (programa) prolongam-se até 4 de novembro.