Ainda faltavam alguns minutos para as 16h desta sexta-feira, mas no cimo da Avenida dos Aliados, junto à Câmara Municipal do Porto, já havia pessoas prontas para a homenagear as vítimas do atentado ao jornal satírio Charlie Hebdo, na passada quarta-feira.

No edifício, uma faixa negra a condizer com as dezenas de folhas onde se lia “Je Suis Charlie”, empunhadas por rostos carregados e em silêncio.

À hora certa, o único barulho era o da cidade, dos carros e das sirenes. Mas ali, naquele bocado de praça, e num silêncio profundo e com a vontade única de lutar pela liberdade de expressão, centenas de pessoas ouviram o Hino da Alegria, de Beethoven, tocado pelos músicos da orquestra de sopro da Escola Superior de Música e Artes do Espetáculo (ESMAE).

Seguiram-se aplausos e ergueram-se cartazes, ou simples lápis ou uma caneta; e a faixa negra da fachada da Câmara do Porto, deu lugar a um cartaz ainda maior com a imagem do cartoonista George Wolinski, com a mensagem “Somos Charlie Porto”.

“É uma coisa que me apavora”

“Estou cá, em primeiro lugar, por ser de uma geração que gostou de Wolinski, mas essencialmente porque isto foi um atentado à liberdade de expresssão”, contou Manuela Bacelar, acompanhada por amigas. Já viveu dois períodos na vida privada dessa liberdade, em Portugal e na Checolosváquia. “É uma coisa que me apavora. É muito preocupante. O que se vai passar daqui para a frente?”, reflete.

A amiga, Teresa Feijó, também na casa dos 60, ouve-a com atenção e afirma que “mais do que um ataque contra o Charlie Hebdo, é um aviso como quem diz “agora mandamos nós”, e se nos deixarmos intimidar por isso, estamos a dar-lhe a vitória”.

Ciente de que o encontro nos Aliados vai mostrar a luta contra a liberdade de expressão, Teresa reforça o pensamento com a ideia de que “não pode haver medo, senão, é dar a vitória aos fulanos que atacaram um dos princípios fundamentais do sistema democrático”. Entretanto uma voz anónima agradece a Charlie.

O mundo é Charlie

Mas no encontro houve muitas idades. Idades e idiomas: português, inglês, espanhol e até italiano. Mas o que mais se ouvia pelos grupos presentes nos Aliados, era o francês. Dezenas dos manifestantes eram jovens franceses, em Portugal de Erasmus. Cantaram o hino de França em alta voz e chamaram a atenção dos manifestantes que aplaudiram a ideia. “Decidimos reunir-nos para dizer que podemos combater este tipo de atentado”, disse a jovem Coline. “A principal arma é a união das pessoas e os franceses estão todos juntos”, acrescentou Marion Monique.

É difícil estar longe de França numa situação como esta? “É difícil não estar no país, num momento tão importante como este, que amedrontou Paris. Mas estamos cá para dar força e é uma maneira de partilhar a dor de quem lá está”, respondeu Coline, sempre de cartaz nas mãos.

Jorge Perez, espanhol a estudar em Portugal, considera o ataque “uma coisa muito grave”. “Estou cá por ter conhecido muita gente francesa que precisa de apoio”, contou. Hesita em responder quando confrontado com a pergunta “o que cabe aos jovens fazer?”. Mas responde: “é difícil, mas o melhor que podemos fazer é continuar a nossa liberdade de expressão e não deixar que os factos nos impeçam de dizerm o que queremos dizer”.

“Não precisamos de fazer muito barulho. Basta juntarmo-nos”, afirmou Francesca Villa, jovem italina, que pede uma distinção clara entre terrorismo e religião. O encontro acabou com um cordão humano.