Nesta quarta-feira foi apresentada a aplicação CPR11, no Hospital São João, no Porto. Incluída na campanha “Joga Seguro”, esta inovação tecnológica tem como principal objetivo alertar, prevenir e sensibilizar para a morte súbita no mundo do desporto. O antigo internacional português Luís Figo é o principal rosto da iniciativa.

A CPR11, já lançada em Espanha, é um projeto desenvolvido pela Fundação Mapfre em parceria com a FIFA e dois dos seus centros médicos de excelência, a Clínica do Dragão e a Ripoll y De Prado. Em Portugal, a embaixadora da campanha é a Fundação Luís Figo, que colabora juntamente com a Fundação Mapfre Portugal para a sua divulgação.

Durante a apresentação, Luís Figo afirmou que a “precaução da morte súbita é uma obrigação que toca a todos”. Perante isto, considera que não se devem “poupar esforços” quando se trata da saúde e vida dos desportistas e que esta aplicação pode salvar uma vida que, de outra maneira, se poderia perder. Segundo o candidato à presidência da FIFA, esta é uma aplicação que “está ao alcance de todos”, sendo promovida entre Portugal e Espanha.

Onze passos que podem salvar uma vida

A aplicação CPR11 tem um objetivo muito simples: salvar vidas. O download pode ser feito para o telemóvel, de forma gratuita, e tem como função ensinar a atuar durante uma situação de paragem cardiorrespiratória, isto é, ensinar os procedimentos que o indivíduo que socorre deve tomar.

A CPR11 explica, então, em 11 passos, como se deve proceder em caso de paragem cardíaca, recorrendo a vídeos, imagens e textos explicativos. A aplicação mostra, sucintamente, como reconhecer alguém que esteja em colapso, avaliar a situação e as técnicas que se devem adotar, terminando na imobilização e translação do indivíduo para as autoridades de saúde competentes em plena segurança.

Transmitindo estes passos a quem socorre, a aplicação pode acabar por ensinar a salvar uma vida em risco eminente.

Segurança e meios

Vítor Paneira afirma que Vítor Baía “tem uma frase em que diz que se está mais seguro no Estádio do Dragão do que na própria casa, porque os estádios estão preparados para socorrer não só adeptos mas também os profissionais que estão em jogo”.

Vítor Paneira, antigo internacional português e atual treinador do Varzim Sport Club, é um dos embaixadores da campanha “Joga Seguro”. Aceitou fazer parte desta iniciativa com o objetivo de fazer chegar esta técnica de prevenção ao máximo de pessoas possível.

O antigo jogador do Sport Lisboa e Benfica (SLB) afirma que a morte súbita é “algo sobre o qual todos nós temos sempre grandes dúvidas”, daí a relevância de fazer os possíveis para divulgar esta aplicação, principalmente para os profissionais do desporto, “onde a morte súbita tem acontecido com grande frequência”.

A morte súbita está presente, principalmente, no mundo do futebol, ao qual Paneira pertence há muitos anos. “É por isso que apoio esta causa com todo o meu coração”, afirma, ao JPN.

O técnico do Varzim refere que a principal vantagem desta aplicação é a prevenção. Segundo Vítor Paneira, graças à aplicação, “temos conhecimento do que se deve fazer em certas alturas e daquilo que serão os primeiros passos a tomar quando se sucede uma paragem cardiorrespiratória em pleno relvado”.

Tal acaba por transformar a CPR11 numa “aplicação que pode beneficiar todos os que a têm instalada, principalmente para socorrer uma pessoa nesta situação”.

No âmbito da morte súbita no desporto, Paneira considera que, hoje em dia, “as equipas já estão mais preparadas para estes casos”, visto que estão mais “apetrechadas, com aparelhos como o desfibrilador”. Os dados apresentados na cerimónia pelos especialistas presentes demonstram que a morte súbita é a principal causa médica de morte entre os atletas. Nos últimos dez anos, por mês, morreu, de forma súbita, um atleta federado, e é no futebol que ocorrem mais casos.

E quando a morte súbita leva a melhor?

No panorama português são alguns os casos de morte súbita no mundo do futebol. Fernando Neves, conhecido por Pavão, foi um jogador do Futebol Clube do Porto (FCP) e, provavelmente, o primeiro caso de morte súbita a que os portugueses prestaram atenção. Pavão faleceu a 16 de dezembro de 1973, ao minuto 13 da 13.ª jornada da Liga portuguesa, no Estádio das Antas, num jogo entre FCP e Vitória de Setúbal.

O futebolista caiu em campo inanimado e acabou por sucumbir a uma paragem cardíaca já no hospital. O FCP não tinha desfibrilador, na altura, não sendo possível socorrê-lo no momento, o que até hoje provoca a dúvida nas pessoas sobre se poderia ter sido salvo, ou não, caso tal tivesse acontecido atualmente, devido ao avanço tecnológico.

O caso de Pavão foi, talvez, a primeira vez que em que a medicina desportiva e os cuidados com os jogadores de futebol e desportistas no geral foram colocados em perspetiva. Contudo, Pavão estava longe de ser o mais mediático dos casos de morte súbita em Portugal. Em 2004, a morte em campo de Miklos Féher, transmitida em direto em milhares de televisões portuguesas, transformou-se na maior representação do perigo eminente em que os atletas vivem. Foi com esta tragédia que os casos de morte súbita ganharam outra dimensão junto do cidadão comum.

A 25 de janeiro de 2004, no estádio D. Afonso Henriques, em Guimarães, ao minuto 92 do jogo entre a equipa da casa e o SLB, Féher caiu prostrado no relvado. O jogo parou de imediato e os colegas e as duas equipas médicas socorreram o húngaro rapidamente. O jogador ainda chegou a dar sinal de vida antes de ser transportado para o hospital. Contudo, não resistiu e acabou por falecer ao final da noite.

Mais de 84 casos

Entre o ano de 2008 e 2012, foram registados mais de 84 casos de morte súbita no mundo do futebol. Esta acaba por ser a modalidade desportiva mais afetada.

Devido ao facto de o jogo estar a ser transmitido em direto, milhares de pessoas puderam ver o momento em que Féher começava a perder a vida, o que as chocou. Vítor Paneira viveu de perto o acontecimento. “Assusta-nos muito a situação de morte súbita, principalmente a mim que vivi de perto o que aconteceu com o Féher”, começa por dizer, lembrando que esteve presente no estádio de Guimarães como comentador da Sport TV.

“Naquele momento consegui perceber a gravidade da situação em que o jogador se encontrava, o que muito me sensibilizou e, de alguma forma, também me traumatizou”.

O país parou e as rivalidades entre clubes cessaram para homenagear o jogador benfiquista. Os médicos do Benfica garantiram que nada faltou ao futebolista, mas a especulação foi muita. O que acontecera com Pavão já era algo distante e não se entendia o que era a morte súbita e como um jogador acompanhado com exames regulares poderia sofrer tal situação. A causa da morte de Féher foi entretanto confirmada como uma paragem cardiorrespiratória.

Já se passaram mais de 11 anos, contudo, em Portugal, Féher continua a ser o caso mais comentado. Infelizmente, estava longe de ser o último. No mesmo ano, apenas quatro meses após a morte do húngaro, a tragédia voltou a bater à porta do clube português, desta vez nas camadas juniores. Bruno Baião, internacional português da equipa benfiquista, faleceu após quatro dias em coma, provocados por duas paragens cardiorrespiratórias. Baião tinha apenas 18 anos.

Mais recentemente, em novembro de 2013, faleceu Alex Marques, jogador do Tourizense. O jovem futebolista sofreu, como os restantes, uma paragem cardiorrespiratória durante uma partida de futebol. Foi prontamente assistido, mas o jogador formado no FCP acabou por não resistir e sucumbir.

Internacionalmente, dois dos casos mais mediáticos foram os de Marc-Vivian Foe e António Puerta. O primeiro morreu em 2003 num jogo da sua Seleção, os Camarões, contra a Colômbia, vítima de uma paragem cardíaca. António Puerta foi, de igual modo, vítima de uma paragem cardiorrespiratória em campo, numa partida do seu clube, o Espanhol, contra o Getafe.

Mais de 90 casos de morte súbita abalaram o mundo do desporto nos últimos anos. É um problema grave que é necessário combater com todos os meios. A aplicação CPR11 pode ser mais um passo nessa luta.