Eugénio dos Santos – A união desde o início

O professor Eugénio dos Santos é uma das pessoas mais importantes da história de CC na Universidade do Porto. Foi um dos principais impulsionadores para a sua criação, um dos membros fundadores, e foi o primeiro a ocupar o cargo de diretor do curso. É com algum saudosismo que o próprio recorda todo esse processo. “Começou-se por haver um protocolo entre a Escola Superior de Jornalismo e a Universidade do Porto”, explica, mas com o crescimento rápido que o curso estava a ter, tornou-se rapidamente claro que a Escola Superior de Jornalismo iria em breve deixar de ter condições logísticas sustentáveis. A solução? “Fazer com que a Universidade do Porto integrasse um núcleo parte dessa escola.” E foi precisamente o que aconteceu. “Deu aliás origem ao nome inicial do curso: Jornalismo e Ciências da Comunicação”, nota o próprio.

Na altura, decidiu-se formar o curso unindo as forças de quatro faculdades diferentes: a de Letras, “pela palavra e literatura”, a de Engenharia, “pela forte componente tecnológica”, a de Belas Artes, “pelo design e outras áreas do visual”, e a de Economia, por ser “uma das componentes mais importantes da comunicação contemporânea”. “As quatro faculdades cooperaram no sentido, justamente, de lançar o curso”, recorda o professor. Logicamente, o curso começou então por ser dirigido por elas mesmas. O método adotado era do estilo “colegial”, com um representante de cada faculdade presente na tomada de decisões. “Eu recuso-me sempre a dizer que eu era diretor”, afirma Eugénio dos Santos, “eu era um deles, o primeiro entre os iguais”. O processo no seu todo, de forma geral, correu bem. “Nunca houve entre nós, os membros das várias faculdades, feições ou tentativas de ter mais representatividade”, testemunha. “Arrancou por consenso e, digamos, por cooperação estreita entre essas quatro faculdades”.

Obviamente, nem tudo foi um “mar de rosas” e existiram algumas dificuldades na formação do curso, que vieram principalmente do órgão ligado à Universidade chamado de Senado Universitário. “Haviam muitas hesitações, muitas dúvidas”, recorda o Professor. As perguntas eram quase sempre de cariz financeiro, e o Senado questionava-se bastante sobre a origem do dinheiro e o seu destino. A sorte, segundo o primeiro diretor, foram os apoios incondicionais que o curso foi encontrando nessa fase crítica. “O curso teve sempre alguns aliados de peso. Alguns deles foram os antigos reitores”, recorda.

Com este apoio forte, os primeiros anos correram bastante bem. “Nós não tivemos dificuldades nenhumas que os alunos se integrassem a princípio, fazer com que se integrassem dentro da estrutura da Universidade do Porto”, recorda. “Os alunos foram bem recebidos, começaram a dar provas de bom senso, de competência e credibilidade e portanto não houve dificuldades acrescidas de funcionamento nos primeiros tempos”.

Foi assim também que se começou a criar o tal espírito de união, o espírito familiar, quase informal até, que é bastante invulgar mas que se encontra bem presente nas mentes de quem lá passa. “Sempre que há um membro mais novo, ou mais jovem e talvez um pouco mais débil, a tendência é exatamente as pessoas cerrarem as fileiras para serem capazes de responderem em conjunto aos desafios que vêm de fora”, nota. Para Eugénio dos Santos, isso deve-se à própria génese do curso e das dificuldades sentidas por causa do Senado Universitário. “Isso fez com que o vínculo entre os integrantes do curso se tornasse mais forte na medida em que era necessário responder a essa espécie de afinco que vinha pelos próprios membros desse Senado Universitário e foi então o que se fez desde o início”.

E de facto, não há dúvidas de que esse sentimento ainda hoje persiste e é transmitido, ano após ano, na Praça Coronel Pacheco. “Muito me apraz saber que isto se mantém”, comenta.

Hélder Bastos – A vontade de continuar e melhorar

Muita coisa aconteceu desde a altura do edifício antigo até aos dias de hoje. O professor Bastos, atual diretor do curso, assistiu a tudo. “Quem está cá desde o primeiro dia pode ter esse termo de comparação. Posso afirmar categoricamente que estamos melhor”. Quinze anos que “passaram num instante”. O professor ainda se recorda da altura em que o curso se encontrava num espaço “relativamente exíguo”, com limitações, onde “não havia biblioteca própria” e cujos estúdios eram “muito incipientes”.

“Foi uma evolução rápida, não diria meteórica, mas nós conseguimos em muito poucos anos implantarmo-nos no mercado, conseguimos afirmar um curso com qualidade, que é reconhecido genericamente pelos nossos empregadores”, salienta. Nesse aspeto, o atual diretor refere que o curso tem “muito feedback das empresas” com quem nomeadamente tem “protocolos de estágio nos três ramos da licenciatura”. É esta colaboração que permite “ir acertando alguns aspetos da formação” e que leva portanto os membros da direção a estarem “sempre atentos” ao que podem melhorar.

De facto, o próprio curso evoluiu bastante durante a sua existência, mas é um processo que não está acabado nem nunca estará. “Temos uma posição sólida no meio das Ciências da Comunicação e na formação nesta área em Portugal”, nota. “Batemo-nos todos os dias para continuarmos a melhorar porque o trabalho ainda não está feito, de longe”. Esse trabalho, Hélder Bastos não pretende fazê-lo só. “Podemos aperfeiçoar técnicas de ensino, podemos tentar outras formas de envolver os alunos nas próprias maneiras de ensinar e de aprender, podemos vir a fazer alterações pontuais na estrutura curricular de forma a ir ao encontro das aspirações e novas procuras dos alunos”, afirma. Tem consciência de que existe essa necessidade de reinvenção constante, dado o meio com que o curso trabalha. “Depende muito das transformações no campo das Ciências da Comunicação, procura do curso, o curso está sempre aberto a reformular-se e aperfeiçoar-se, no sentido de acompanhar os tempos alucinantes que estamos a viver”, revela.

Olhando para trás, o balanço destes últimos quinze anos é positivo. “Evoluímos de uma forma que diria bastante sustentável até chegarmos ao estatuto que temos hoje”, destaca. Agora, o curso tem “um espaço bastante condigno ao nível de equipamentos, como os estúdios de televisão, de rádio, a redação do JPN, os laboratórios, centros de investigação aqui sediados como o CETAC”. Apesar disso, o próprio sabe que há sempre margem para melhorar e tem em consideração as necessidades dos alunos. Instalar uma sala para eles, “um espaço abrigado que seja seu”, que possa servir “como uma espécie de sala de convívio” é uma das suas frentes de ação. Outra prioridade é a “instalação de um bar”, a funcionar como anexo a essa mesma sala de convívio, que tem sido uma reivindicação dos alunos há muito tempo. “Nós, direção de curso e de mestrado, em conjunto com o Media Innovation Labs (MIL) estamos a tentar criar aqui um espaço que seja mais agradável, confortável, para quem aqui está todos os dias”, enfatiza o diretor.

E em relação ao espírito de união e de pertença que se faz sentir no meio da Praça Coronel Pacheco, será esse sentimento um que é partilhado pela estrutura organizacional? “Sim, sinto uma relação de grande proximidade, de alguma familiaridade. É um aspeto que já é referido há muitos anos nesta ‘casa’ ”, confessa. “Talvez em parte porque estamos aqui equidistantes das faculdades a quem pertencemos”. “Aqui, até entre os alunos e os funcionários há um clima que por vezes não vemos em grandes faculdades, muito mais pesadas”, explica. “Nós temos características muito específicas, mesmo no contexto da Universidade do Porto”, continua. “Este é um curso com características muito próprias, diria únicas”, referindo-se ao facto do curso ser constituído pelas quatro faculdades. Segundo ele, isso faz com que haja “uma grande confluência de sensibilidades e de funções muito diferentes”, que o diretor não pensa ser algo negativo: “acho que é daí também que vem muito da riqueza do curso”.

Helena Lima – A ambição e a vontade de evoluir

Um curso de afetos. É assim que a professora Helena Lima descreve o curso de Ciências da Comunicação, aquele que ajudou a fundar há uma década e meia atrás. “Ou nos entregamos a sério, ou não nos entregamos”. E a verdade é que Helena Lima se entregou. O projeto era novo e uma “ideia completamente diferente e ambiciosa” que, na opinião da professora, não teria sido possível também sem a mão de Augusto Sousa e Eugénio dos Santos.

Todos os envolvidos mostravam “entusiasmo e dedicação” na criação do primeiro curso de jornalismo público do Porto. “Era novo em termos da universidade, era novo em termos de saberes, era novo em termos de competência”, explica.

O grande desafio foi, na opinião de Helena Lima, começar. As salas não estavam prontas, os materiais eram insuficiente. “A biblioteca era uma coisa irrisória. Era um armário que estava atrás da Ana Paula, a secretaria estava aberta e os alunos podiam estudar e ler na biblioteca que não tinha praticamente livros”, relembra. Ainda assim, as dificuldades ajudaram a que os alunos se unissem e conseguissem ultrapassar bem as situações de conflito. E a rede de afetos e ligações entre todos foi-se gerando. “Nós fizemos de tudo. Limpamos cadeiras, limpamos mesas, instalamos computadores, fizemos tudo e mais alguma coisa. É um tipo de vínculo que não é possível numa faculdade grande”, descreve. Mais do que recordar o seu papel nos primeiros anos do curso, a professora não consegue esquecer que houve um conjunto de pessoas fundamentais, uma delas a Ana Paula. “A Ana Paula é uma pessoa de afetos. E foi uma pessoa central na coesão do grupo, do funcionamento, porque às vezes quando as coisas não estavam bem era ela que tentava corrigir as coisas de uma maneira não evidente, era ela que tranquilizava os alunos e é ela que tem tido os maiores atos de solidariedade com as pessoas. Isso fez com que a licenciatura tivesse sempre uma forma de estar diferente. A Ana Paula era o epicentro de afetos bons, de compreensão. Eu não acho que haja um aluno que se esqueça do papel da Ana Paula”. Mas para a professora todos foram importantes para a construção inicial.

Helena Lima ajudou a que tudo fosse possível e é, por isso, recordada por muitos dos alunos como das pessoas mais disponíveis e acessíveis. Voltando atrás no tempo, também a professora recorda os alunos do primeiro ano do curso como “um grupo excecional”, principalmente pela maneira como “aguentaram todas as dificuldades”. “Eles eram muito contestatários, mas isso não quer dizer que a gente não gostasse deles. Mas eles eram muito contestatários e tinham razões para isso. Mas também era o nosso papel contrariá-los”, recorda. E é com carinho que fala das recordações que tem da época, desde as festas de Natal, de são João, do Europeu daquele primeiro ano. Do trabalho constante e “verdadeiramente notável” daqueles primeiros estudantes.

Ainda assim, apesar das dificuldades, o início do curso possibilitou aos alunos oportunidades que hoje em dia já não existem. “Durante os quatro primeiros anos levamos ao curso pessoas da área profissional como nunca se levou. Tiveram a possibilidade de contactar com gente que mais ninguém teve. O que também lhes deu uma prespetiva diferente. A ligação do curso com a parte profissional era uma coisa muito importante. Agora isso já não é possível”, conta a professora.

Embora algumas coisas tenham ficado pelo caminho, a professora refere que o curso tem um reconhecimento que foi trabalhado por todos. “Eu acho que as coisas têm de evoluir e o curso consolidou-se em termos científicos e em termos de qualidade do seu corpo docente. Em termos de prestígio não só no mercado de trabalho, mas também da evolução dos estudos”, conclui.

A dedicação e o empenho da professora foram algo constante no percurso do curso. Ainda que tenha estado apenas os quatro primeiros anos ligada à direção, nunca deixou de ter uma voz ativa que defendesse a posição do curso. “Sou saudosa em relação aos primeiros tempos. O que nasceu foi um projeto e o que temos agora é um projeto diferente. Mas são 15 anos, mas as coisas têm de evoluir, não podem ficar estáticas. Se não evoluírem morrem.”

Ana Paula – O afeto e as relações humanas

A primeira cara do curso, o elo de ligação dos alunos com os professores. A Ana Paula Pereira chegou a Jornalismo e Ciências de Comunicação logo no início de tudo. Na altura que recebeu a proposta para fazer do projeto, hesitou. “Foi uma aprendizagem, foi uma experiência muito gratificante, ainda bem que aceitei esse desafio, porque na altura estava hesitante se o aceitava ou não e ainda bem que o aceitei. Houve sempre muita união”, explica Ana Paula.

No começo, uma vez que era a única funcionária fazia de tudo um pouco. “Eu fazia já toda a parte administrativa como continuo a fazer atualmente, fazia a ligação com a Faculdade de Letras, tirava fotocópias quando era preciso tirar, fazia a requisição dos livros aos estudantes, dava as chaves das salas aos professores e recolhia no final, basicamente era tudo que era preciso”, relembra. Também era Ana Paula que fazia as matrículas dos alunos, os recebia e os acompanhava durante o percurso. Todos se foram aproximando. “Quando fazemos alguma coisa com vontade, com sentimento e com agrado o feedback só pode ser bom”, refere.

E a relação com os alunos foi-se estabelecendo. Não tendo mais nenhum espaço para estar, para além da sala onde a secretaria existia, todos frequentavam o mesmo espaço e o contacto era constante. A ligação afetiva foi crescendo. “Eles viram-me sempre como uma referência por fazer ligação a coisas que eles tinham necessidade na Faculdade de Letras, o apoio que precisavam para qualquer dúvida que tinham falavam comigo, abordavam-me, pediam-me conselhos… Era assim uma coisa especial”, conta.

Por essas razões e mais algumas, Ana Paula recorda com muita emoção os primeiros anos e todo o percurso seguinte. Há mais de 20 anos que trabalha na área do Ensino, mas CC foi uma experiência muito importante no seu percurso. Atualmente trabalha com três cursos da Faculdade de Letras. “Profissionalmente faço igual para todos, mas emocionalmente é CC sempre. O meu coração está sempre com eles e com as pessoas que lá estão, os interesses… Foi o meu curso de acolhimento”, confessa.

Há 15 anos, como tantos outros, abraçou o projeto que considera ter marcado a sua vida. A relação com os estudantes é algo que ficou eternizado, embora com os professores o mesmo aconteceu. “Foi um trabalho de equipa que resultou muito bem. Nós ajudávamo-nos mutuamente, tentávamos combater as falhas onde elas pudessm existir e foi mesmo muito gratificante”, descreve.

Com um brilho nos olhos, passa em revista muito do que passou: os “miminhos” que recebia dos alunos, desde um simples bilhete deixado na secretária aos postais nas épocas festivas , à relação forte com os professores, alguns dos quais já conhecia da Escola Superior de Jornalismo, de onde veio. A união era clara naquele primeiro ano, mas tão pouco espaço era um verdadeiro teste à sua paciência. “Às vezes tinha algumas picardias e às vezes tinha de ser mesmo por imposição ‘a mal-disposta’ como eles me chamavam. Naquele espaço físico, que não era muito grande, a funcionar tudo, eu às vezes tinha dificuldades em ouvir o telefone a tocar que estava praticamente à minha beira. Portanto de vez em quando tinha de ser um bocadinho mais agressiva, para tentar pôr um bocadinho ordem na casa, que também era preciso”, explica.

Passados 15 anos, o curso evoluiu, as condições são agora bem melhores do que em 2000. As pessoas, essas, ficaram sempre. “Quando fazemos alguma coisa com vontade, com sentimento e com agrado o feedback só pode ser bom”, diz Ana Paula.

José Cruz Coelho – O apoio e a dedicação

Um colega, um amigo e até mesmo um pai. José Cruz Coelho, Sr. Coelho como é carinhosamente tratado por todos, chegou em 2003 a Ciências da Comunicação. Coronel Pacheco não era novidade, uma vez que já era vigilante no antigo edifício da Faculdade de Direito. As instalações de JCC dividiam-se entre entre dois edifícios, mas havia poucas salas para os alunos e professores. Uma sala era simultaneamente secretaria, biblioteca, reprografia e sala de convívio. Atualmente, como diz o Sr. Coelho, existe “um cantinho para cada um”. Na altura, ainda conheceu e conviveu com os primeiros alunos do curso. “Isto antes abria várias vezes à noite. Havia alguns alunos que nem a casa iam, diziam que vinham para aí estudar, mas vinham era dormir”, brinca o vigilante. Ainda foram algumas as vezes que perdeu o transporte para Lousada, só para fazer a vontade aos alunos. “Oh Sr. Coelho, só mais cinco minutos! E iam cinco, dez, quinze, quanto calhava. Depois pronto, perdido por dez perdido por mil”, relembra. A verdade é que, ao longo dos anos, fez sempre tudo que pode para ajudar. “Tento ser o melhor possível. Eu gosto sempre de ajudar no que posso, não faço mais do que o meu dever”, diz Sr. Coelho.

E assim foi. Durante os mais de 10 anos, muitos foram os que passaram e o recordam com carinho. Alguns deixaram recordações mais fortes, mas a verdade é que gosta de ver caras novas. “Gostei sempre do convívio. E com esta juventude vai-se aprendendo e fica-se a gostar”, confessa. Também com os professores, a relação foi sempre cordial e os laços formaram-se entre todos. Quem quer que tenha passado pelo curso lembra-se do Sr. Coelho, que costuma brincar com o facto do seu nome ter as iniciais do curso nos primeiros anos, Jornalismo e Ciências da Comunicação: José Cruz Coelho.

O tempo foi passando e alguns momentos ficaram marcados na memória. Um deles foi pela altura da Queima das Fitas, quando os alunos colocaram o Sr. Coelho num concurso para ganhar um bilhete para ir ver o Quim Barreiros. “Um ano deram-me uma credencial e tudo! Eu não ia depois, dava os bilhetes, era só para ver a estima que eles tinham por mim”, graceja.

De sorriso feito sempre por de trás do seu bigode, o Sr. Coelho confessa que nada seria possível sem os alunos e que a sorte é mesmo fazer o que gosta. “Eu sou um mãos abertas e um coração também”, conclui.