A Amnistia Internacional (AI) realça, no seu relatório anual, a discriminação que as comunidades ciganas e as pessoas de ascendência africana continuam a sofrer em território português. Além da marginalização, os casos de violência policial e doméstica, a degradação das condições prisionais e a situação dos refugiados preocupam a Amnistia. A diferença entre pobres e ricos no acesso aos tribunais surge pela primeira vez nos relatórios da ONG, e a aprovação da adoção por casais do mesmo sexo constitui o ponto positivo do relatório.

Em declarações ao JPN, o Coordenador de Ativismo e Formação da AIPortugal, Daniel Oliveira, fez um balanço da conjuntura atual e falou dos problemas que se mantiveram, dos que surgiram e dos que foram solucionados. Daniel destacou a “grande responsabilidade” dos governos “cumprirem e fazerem cumprir os direitos humanos.” Por outro lado, é da opinião que tem de haver uma “alteração de consciências” que acompanhe o progresso governativo, ainda que o processo de conscencialização não tenha andado à mesma “velocidade” que as mudanças legislativas.

Discriminação racial
A etnia cigana e as pessoas de origem africana continuam a ser alvo de discriminação em vários municípios. O relatório da AI relembra o episódio em que a Câmara de Estremoz proibiu as pessoas da comunidade cigana residentes no bairro das Quintinhas de usarem as piscinas municipais, devido a queixas de moradores sobre atos de vandalismo.

Força policial
Ocorreram denúncias do uso “desnecessário ou excessivo” da força por agentes da polícia. A Amnistia recorda o caso do polícia que foi filmado a “espancar” um homem à frente dos filhos e do pai – a quem “deu dois socos” – depois de um jogo de futebol entre o Benfica e o Vitória de Guimarães.

“As imagens mostram um polícia a atirar para o chão um adepto aparentemente pacífico e a bater-lhe várias vezes com o cassetete enquanto os filhos eram impedidos de se aproximar”, lê-se no relatório. A PSP abriu um inquérito disciplinar ao polícia, que ficou suspenso 90 meses.

Juntando o pior dos dois mundos – discriminação racial e comportamentos policiais abusivos -, a Amnistia dá conta de denúncias pelo uso da força contra pessoas de origem africana. O relatório conta que “em fevereiro, cinco jovens de ascendência africana denunciaram ter sido agredidos e sujeitos a comentários racistas por polícias da esquadra de Alfragide, depois de terem reclamado relativamente ao uso excessivo da força durante uma detenção efetuada no Bairro do Alto da Cova da Moura.” Os jovens acabaram por receber tratamento médico devido aos ferimentos causados pelas agressões e foram acusados de resistência a um polícia. As investigações ainda decorriam no final de 2015.

Violência contra as mulheres
Segundo dados da União de Mulheres Alternativa e Resposta (UMAR), 27 mulheres foram mortas e 33 foram vítimas de tentativas de homicídio, até 20 de novembro de 2015, por pessoas que mantinham relações íntimas com as vítimas. Segundo o relatório de 2014/2015, 40 mulheres tinham sido mortas nas mesmas circunstâncias, até 30 de novembro de 2014. Os números de 2015 refletem uma  diminuição de aproximadamente 33% face ao ano anterior.

O relatório dá ainda conta de um estudo da Universidade Nova de Lisboa, que assinalava 1.830 meninas residentes em Portugal que tinham sido ou corriam risco de ser submetidas a mutilação genital. Uma nova legislação, que entrou em vigor em setembro, classifica essa prática como um crime específico no Código Penal.

Ainda que haja leis que deem resposta a casos de violência doméstica, é preciso que os serviços funcionem na prática. É Daniel Oliveira que o diz.

Refugiados
É uma das questões que mais inquieta a Amnistia Internacional por acarratar várias responsabilidades a nível internacional.

Portugal comprometeu-se a receber, até ao fim de 2015, mais de quatro mil e quinhentos requerentes de asilo, ao abrigo do programa de recolocação da União Europeia. No entanto, apenas 24 pessoas tinham sido recolocadas, e dos 44 refugiados inicialmente seleccionados para reinstalação em Portugal, apenas 39 tinham chegado ao país.

Daniel Oliveira fez um resumo das causas da crise e explicou a urgência em ajudar a resolver a situação dos refugiados. Apontou o dedo às instituições internacionais que se têm mostrado “deficientes”, nomeadamente às agências da ONU, à UE e aos governos da Europa que “não têm dado uma resposta adequada” ao problema.

Desigualdade na justiça
A crise e as custas judiciais – os encargos com processos em tribunal – trouxeram desigualdades no que diz respeito ao acesso à justiça. O alerta foi dado pela ONU, que se manifestou sobre o facto do “aumento de encargos legais e das custas dos tribunais” estar a impedir o acesso à justiça por parte de quem tem uma situação financeira desfavorável.

Direitos LGBTI

Portugal dá um passo à frente nos direitos das lésbicas, gays, bissexuais, transexuais e intersexuais (LGBTI).
O relatório dá conta da lei que aprovou, dia 19 de fevereiro de 2016, a adoção de crianças por casais do mesmo sexo. O Presidente da República, Cavaco Silva, foi obrigado a promulgar o diploma uma vez que houve uma segunda aprovação parlamentar, depois desta ter sido inicialmente vetada.